'Joel Santana morreu'

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Nos dias anteriores ao reinício do campeonato brasileiro não escrevi uma linha sobre o reatamento da competição. Pressentia que o jogo de ontem seria uma chachada de duas equipas de chacha, tendo a nossa que se esforçar muito para poder fazer com que os cathartiformes marcassem pelo menos um golito e reanimarem do coma social em que se encontram. Eu e o Mauro Axlace parece que concordamos sobre isso.

Um jogo de futebol?! Campeonato brasileiro? (rs)

Tudo como dantes. O Botafogo andou a passear-se um mês como toda a gente viu, não treinou convenientemente, não melhorou absolutamente em nada o seu horrível padrão de jogo, não treinou o acerto de passes, não treinou a pontaria. Não fez nada, como muito bem afirma o Rodrigo Federman. Os dirigentes não contrataram ninguém para reforçar a defesa que não temos. Estiveram um mês à frente dos televisores refasteladamente a ver bom futebol e nem sequer aprenderam nada com isso.

Não há paciência para ter saudades de ver o clube a jogar e surgir aquela absoluta miséria técnica, intelectual e emocional, tão grande como a do adversário. Estes jogadores botafoguenses e flamenguistas ‘sem teto’ do futebol carioca, contratados por dirigentes ‘sem teto’ e conduzidos tecnicamente por gente ‘sem teto’, não merecem que se analise a partida. No Botafogo, tudo calmo, nenhuma tensão, garra zero. Viram o Uruguai jogar, mas também nada aprenderam sobre a pressão e a garra celeste a jogar futebol. Um verdadeiro desrespeito à torcida botafoguense após um mês de suposta preparação para um (re)arranque no campeonato brasileiro.

Aliás, as únicas coisas boas na noite de ontem, do lado do Botafogo, foram a extraordinária muralha constituída por Antônio Carlos e Fábio Ferreira, as transições e os passes fantásticos de Leandro Guerreiro e Lúcio Flávio, os cruzamentos visionários de Alessandro para a área, a fabulosa e certeira dupla de ataque Herrera e Caio, a magnífica escalação e as superiores substituições de Joel Santana. O resto é que não prestou para nada.

Nietzche anunciou, numa simbologia captada por poucos, que “Deus morreu”. Eu diria que ‘Joel Santana morreu’.

O treinador nunca muda o time, não apresenta nenhuma nova jogada, não faz nenhuma evolução tática, não tem acertado nenhuma ‘leitura’ de jogo (ou ontem não deveria ter sido Lúcio Flávio a dar lugar a Jobson, em vez de retirar Caio?... E depois é que percebeu o erro, tardiamente como vem sendo costume). Joel Santana morreu.

Há tempos, após a conquista do carioca, afirmou estar cansado e andou por aí a receber prémios e a vangloriar-se, em vez de pôr mãos à obra e organizar a equipa que ainda não tinha para disputar o campeonato brasileiro. Joel Santana morreu.

O treinador tem dito que merece tudo, não precisa provar mais nada e aspira a uma galeria de honra, em que seja necessário apenas fazer coisa nenhuma, e todos em adoração ao treinador que vence os turnos do campeonato carioca. Cansado e desejando um emprego bem remunerado e que dê pouco trabalho, Joel Santana oferece-se ridiculamente para treinador da seleção brasileira: "As pessoas falam em currículo e perfil. Não estou me oferecendo, mas meu currículo está aí para quem quiser ver e me deixa em boas condições". Joel Santana morreu.

Além de ser mais uma enorme desconsideração ao Botafogo estar a oferecer-se para outro cargo fora do clube que o tratou tão bem, Joel Santana envelheceu, está cansado, quer um cargo que não tenha que ir todos os dias ao estádio, um cargo que não o incomode muito. Quer o cargo de Dunga, talvez para fazer muito pior do que Dunga. Mas são quatro anos quase tranquilos antes da reforma, sem ser necessário ir aos estádios e fazer essa tarefa fastidiosa de fingir que está treinando uma equipa de futebol. Joel Santana morreu.

Ademais, a evolução do futebol, e até mesmo os últimos acontecimentos da Gávea, mostram à saciedade que o treinador ‘papai’ já não funciona. Não há ‘papai’ no Manchester nem no Arsenal, não há ‘papai’ no Barcelona nem no Real Madrid, não há ‘papai’ no Sporting, no Porto ou no Benfica. Mas o Joel Santana do ‘paternalismo’, por oposição ao ‘profissionalismo’, adotou mais um ‘filho’ – Jobson – para proteger, como diz já fazer com Caio e Somália. Protegê-los?... “Filhos”? Joel Santana morreu.

Talvez o treinador ainda possa mascarar alguma coisa com Maicosuel e com a eventual chegada de forma a Jobson, e, quiçá, algum reforço para a defesa, mas não será capaz de redinamizar o time, porque nada de positivo fez em um mês, desrespeitando a torcida botafoguense – e daqui a uns tempos, quando tiver uma semana inteira para ‘treinar’ estará ‘comemorando’ o acontecimento… Na verdade, Joel Santana nunca esteve muito tempo à frente de um clube e não tem trabalho de profundidade. Ele nunca gostou muito de mergulhar, prefere nadar na espuma da onda. Joel Santana morreu.

Não sou ingrato, agradeço o título carioca, mas não aprecio este relaxamento típico de Joel Santana após uns meses à frente de um clube de futebol. Os sul-africanos perceberam que Joel Santana morreu e fizeram-lhe o enterro às portas da Copa.

Joel Santana morreu. Paz à sua carreira.

FICHA TÉCNICA
» Botafogo 0x1 Flamengo
» Gol: Paulo Sérgio 68'
» Competição: Campeonato Brasileiro
» Data: 14/07/2010
» Local: Estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro
» Arbitragem: Gutemberg de Paula Fonseca (RJ); Ediney Guerreiro Mascarenhas (RJ) e Rodrigo Pereira Joia (RJ)
» Renda/Público: R$416.885,00 / 15.373 pagantes
Cartões Amarelos: Fábio Ferreira e Antônio Carlos (Botafogo); Kleberson e Paulo Sérgio (Flamengo)
» Botafogo: Jefferson, Antônio Carlos, Fábio Ferreira e Fahel; Alessandro, Leandro Guerreiro, Sandro Silva (Edno), Lucio Flavio (Renato Cajá) e Marcelo Cordeiro; Herrera e Caio (Jobson). Técnico: Joel Santana.
» Flamengo: Marcelo Lomba, Leonardo Moura, Welinton, Ronaldo Angelim e Juan; Rômulo, Willians, Kleberson e Petkovic (Fabricio); Vinicius Pacheco (Camacho) e Diego Maurício (Paulo Sérgio). Técnico: Rogério Lourenço.

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Foto: Alexandre Durão / Globoesporte.com