segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Entrevista com ‘El Lobo’ Fischer

Rodolfo José Fischer ‘El Lobo’, foto de Zeka Araújo

por TEIXEIRA HEIZER
Revista Placar, 1972

“Sou pago para jogar bola, para fazer gols. Eu vivo disso.”

O começo foi duro: “afilhado de Tim”, “enganador argentino”, gols perdidos, vaias, revolta, choro. Aí, Tim, o “padrinho”, foi embora. Parecia o fim de “El Lobo”, Nada disso. Ele começou a fazer gols, a receber aplausos, é ídolo.

Rudolph Fischer, cidadão argentino, honrado chefe de família, excelente ponta-de-lança, começa a falar de seus dias no Botafogo.

– Não, não sei. Acho que houve boicote. Acho que foi inadaptação. Às vezes, acredito que houve má vontade comigo. Mas quando recebo um passe como aquele do Jairzinho, no jogo com o Santos, mudo minha maneira de pensar.

De saída, Fischer faz questão de esclarecer que “não se sente um gringo no futebol carioca”. Recorda que é filho de brasileiro e que conhece bem nossos costumes, em nada tendo mudado seu modo de viver.

– Vim para o futebol brasileiro a fim de ser feliz. Por isso me revoltei algumas vezes. Mas foi impaciência. Talvez falta de adaptação. Agora, acho que tudo sai bem. Acontece que, em todas as comunidades, os grupos estão formados. Existe uma resistência natural quando alguém quer penetrar neles. Mas não sei se devo considerar isso um golpe de má fé.

Insegura ao definir sua situação no Botafogo, Fischer agora se diz um pouco culpado.

– Cada um é diferente do outro em sua maneira de ser. Eu mesmo me sinto desigual dentro do grupo, falo até outra língua. Esta circunstância pode ter me prejudicado. Aqui houve mesmo disse-me-disse. Fatos mesmo, acho que não existiram. Pelo menos os que pareciam ser meus inimigos sempre negaram esta condição. É que temos temperamentos diferentes e, no meu caso, eu é que devia me adaptar ao meio.

Fischer não consegue esconder uma preocupação. Antes, porque seu futebol não aparecia. Nervoso, tropeçava na bola, perdia gols feitos. Chegou até a ser gozado pela torcida.

– Agora, estou preocupado porque, de repente, a torcida me recebe como ídolo. Contra o Santos, ao fazer o gol da vitória, quase fiquei louco com a torcida em coro gritando muito meu nome.

Fischer garante não se sentir vaidoso com os aplausos da torcida. Ele conheceu dias de glória na Argentina, desde que começou a jogar pelo Missiones, clube do interior.

– Sou de uma cidade pequenina, um ponto no mapa, chamado Obera, no departamento de Missiones. Meu pai, Benjamim Fischer, era o presidente do clube. Foi ele que me encaminhou no futebol.

Aos vinte anos, em 1964, Fischer era contratado pelo San Lorenzo. O rapaz comprido de bom chute, capaz de terríveis rushes pela esquerda, ganhava uns 100 dólares por mês e estreou contra o Argentino Júnior.

– Entrei num ataque de cobras: Caroti, Rodríguez, Doval, Vieira e eu. Comecei na ponta porque não havia lugar para mim no meio.

Fischer demorou a marcar seu primeiro gol, contra o Huracán. Mas quando isso aconteceu ele já tinha a confiança da torcida e dos técnicos. Um deles marcou sua vida, ensinou-lhe muitos segredos do futebol:

– Foi o Tim. O maior estrategista que já vi.

Quando Tim deixou o Botafogo, Fischer passou a temer pelo seu sucesso. Para muitos, “estava encerrado seu reinado”. No mínimo, diziam que o técnico era seu padrinho.

– Acho que desmenti esta história. Nunca me senti tão bem como agora.

A troca de técnicos não teve influência no seu futebol. Não quer ser injusto com Leônidas, mas acha que a má fase do Botafogo sob a direção de Tim foi circunstancial.

– O sistema empregado pode influir sobre a produção de determinado jogador, mas só se suas características forem violentadas. No nosso caso, não houve mudança de sistema. Acontece que o técnico estava aproveitando as virtudes de cada um, ajustando-as a uma maneira simples de jogar.

Hoje, Fischer se sente quase adaptado ao grupo que, aparentemente, o repelia no princípio. Treinou muito para responder dentro de campo aos seus detratores, cuidou-se fisicamente.

– Só faço treinar, jogar e dar assistência à minha mulher, Anamaria, e ao meu filho, Frederico Alexandre, de onze meses.

O Fischer que fala à Placar é bem diferente do jogador nervoso e aflito de há um mês. Olha para Jairzinho como um parceiro no jogo e não como um inimigo.

– Eu me considero um jogador de futebol. Não m meto em negócios, não conheço o Perón, sou apolítico e a única massa que me seduz, no momento, é a torcida do Botafogo.

Em lua-de-mel com ela, Fischer está aí, perigoso, valente, talentoso, jogando beijos para todos os lados.

– Quando jogo beijos é porque fiz gols. E se fiz gols é porque estou bem. Com o público e comigo mesmo.

6 comentários:

Pedrin disse...

Era um prazer ver esse sujeito jogando com nossa camisa... Inesquecível!

Ruy Moura disse...

Infelizmente não o vi jogar, Pedrin, porque nessa época não morava no Rio de Janeiro. O 'gringo' que eu gostava e vi jogar foi o Ferretti. Mas todo o mundo adorava ver o Fischer jogar.

Abraços Gloriosos.

Anónimo disse...

El Lobo Fischer - vibrava muito com ele - honrou o manto sagrado sempre - merecia uma homenagem com certeza

Ruy Moura disse...

Verdade, amigo. Outro pouco lembrado: Ferretti. Eu gostava dele. 'Arma secreta' da 2º parte, deu-nos muitas vitórias. Abraços Gloriosos.

Mário Paulo disse...

Otimo jogador, ambidestro, vc não sabia qual lado ia explorar, otimo cabeceador, não se entregava em campo. Vi otimas partidas dele, em fim um jogador que não tem parametro no futebol atual.
Descanse em paz El lobo.

Ruy Moura disse...

É verdade, Mário Paulo. El Lobo tinha uma fibra rara como jogador, e se comparado aos futebolistas de hoje em dia diria que tinha uma fibra r-a-r-í-s-s-i-m-a, associada a uma grande qualidade de jogo.

Abraços Gloriosos.

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