Imagem: André Felipe de Lima
por ANDRÉ FELIPE DE LIMA
A
série “Time dos sonhos”, um projeto oriundo da enciclopédia “Ídolos –
Dicionário dos craques”, apresenta, nesta terceira edição, o maior Botafogo de
todos os tempos. Montar um esquadrão alvinegro, percorrendo mais de 100 anos de
uma gloriosa história recheada de craques inesquecíveis, é, no mínimo, um risco
de “lesa-pátria”. Mas nossa odisseia pela história dos principais heróis
botafoguenses nos permite a arrogante (porém pertinente) escalação. Vamos lá,
então. No gol, é ele: Manga (1959 a 1968). O grande Manguita. Não há como
discordar que o arqueiro foi o maior que o Botafogo já teve. Em nove anos de
clube, conquistou quatro vezes o Campeonato Carioca, em 1961, 1962, 1967 e
1968. Foi também campeão da Taça Brasil, em 1968, e do Torneio Rio-São Paulo, em
1962, 1964 e 1966. Manga integrou aquele que é, até hoje, o melhor time montado
pelo Botafogo. “Em 1959, o João Saldanha foi ao Recife, onde eu jogava pelo
Sport, e me levou para o Botafogo, quando eu tinha 21 anos. Lá joguei dez anos,
participando de conquistas históricas. Serei Botafogo até morrer”, disse ao
repórter Rogério Daflon, em 2008. O mesmo Saldanha, que completaria 100 anos no
próximo dia 3 de julho, acusara Manga de ter feito corpo mole em um jogo contra
o Bangu, na final do Campeonato Carioca, de 1967. Indignado com o que
acreditava ser verdade, o João “Sem medo” correu atrás do goleiro, com arma em
punho, e disparou o balaço. Manga escapou por pouco. “Fiquei muito chateado,
porque sempre atuei em campo com a maior seriedade, e o Botafogo venceu aquela
decisão por 2 a 1. Quando vi o Saldanha armado no Mourisco, atirando em mim,
resolvi correr. Daquela forma, não havia como enfrentá-lo. Um mês depois,
fizemos as pazes e ficou tudo bem”.
As
mãos, com os dedos todos tortos, dimensionam o empenho de Manga no arco
alvinegro e nos de outros grandes clubes brasileiros, como Sport, Inter,
Coritiba e Grêmio. Modesto, costuma dizer que apenas procurou “fazer o melhor”
pelo Botafogo e que cabe aos jornalistas dizerem se foi ele ou não o melhor
goleiro da história do Botafogo. Concluímos que sim, Manga.
Mas
seríamos injustos com a história do Fogão se omitíssemos outros grandes
arqueiros que passaram por General Severiano, ou mesmo por Marechal Hermes, no
momento mais triste do Botafogo. O niteroiense Victor Corrêa Gonçalves, o
Victor (1929 a 1934 e 1934 a 1935), foi, talvez, o primeiro grande goleiro a
verdadeiramente brilhar pelo Glorioso. Um genuíno paredão do time que
conquistou os Campeonatos Cariocas de 1932 (competição em que permaneceu 15
rodadas sem sofrer gols), 1933 e 1934. Ficou até 1935 no clube, mas não chegou
a defendê-lo na campanha do “tetra”, naquele mesmo ano. Uma contusão em
fevereiro, durante uma peleja contra o River Plate, determinou o fim prematuro
da carreira do goleiro. Apelidado de “Gatinho”, Victor, diziam, entrava em
campo sob a regência etílica de uma boa dose de cachaça para, justificava aos
cronistas, encorajá-lo em campo. Parece que dava certo. Mas Victor não teve
vida fácil no arco do Fogão. Teve de conviver com dois fortíssimos adversários
na posição: Germano Boettcher Sobrinho (1928 a 1935), que esteve na Copa do
Mundo de 1934, e Roberto Gomes Pedrosa (1930 e 1934), que jogou pouco pelo
Botafogo, mas o suficiente para que fosse lembrado para o gol da seleção
brasileira, junto com Germano, na Copa de 34. Aliás, o elenco do Brasil naquele
mundial, marcado pela rixa entre cariocas e paulistas, contou com oito
jogadores alvinegros.
Logo
após Victor deixar os gramados e Germano e Pedrosa buscarem outros rumos para
suas carreiras, o Botafogo acolheu um rapaz baixinho e muito magro para vestir
a camisa número um. Chamava-se Aymoré Moreira (1936 a 1946), irmão do renomado
treinador Zezé Moreira. Apesar da baixa estatura, voava na bola como poucos.
Outras feras no gol do Botafogo foram Ary Nogueira César (1942 a 1950), egresso
do Coritiba, onde foi ídolo, Osvaldo Baliza (1944 a 1953), que fechou o gol
alvinegro no antológico título carioca de 1948, Cao (1965 a 1974), o que ocupou
a vaga de Manga, em 1968, Paulo Sérgio (1980 a 1984), terceiro goleiro da
seleção na Copa de 82, Wagner (1983 a 2002) e Jefferson (2003 a 2005 e 2009 até
hoje), que, para muitos, é o segundo melhor goleiro da história do Fogão,
simplesmente pelo arrojo, classe e longo histórico que construiu no clube.
Na
lateral-direita, o nome é Carlos Alberto Torres (1971). Bastou apenas um ano no
Botafogo para se consagrar, mesmo sem conquistar sequer um título com a camisa
alvinegra. Chegou a General Severiano com a fama de capitão do escrete
tricampeão mundial, em 1970, no México. Era o “Capita”, afinal.
Morto
em outubro de 2016, Carlos Alberto deixou dúvidas entre tricolores, santistas e
alvinegros. Para qual time o ídolo torcia, silenciosamente, desde a meninice?
Não há o que questionar. O Capita foi o melhor lateral-direito da história dos
três clubes. E também não pairam dúvidas sobre a paixão que nutria pelo
Botafogo, seu verdadeiro clube do coração. Fato devidamente confirmado pelos
mais íntimos amigos do craque. Até o último momento, foi um apaixonado
botafoguense. Sempre lamentou a derrota (1 a 0), para o Fluminense, na polêmica
final do Campeonato Carioca de 1971. O zagueiro Sebastião Leônidas (1966 a
1971), que também figura nesse timaço e sobre quem falaremos mais adiante,
recordou a angústia do Capita naquele domingo, no Maracanã: “Ele saiu
contundido após um choque com Marco Antônio e viu, do banco, o ponta-esquerda
Lula correr pelo setor que deveria ser o dele e marcar, no último minuto, o gol
da nossa desgraça.”
Até
Carlos Alberto eternizar-se como o maior lateral-direito botafoguense, houve
outro grande jogador na posição: Zezé Procópio (1938 a 1942), que, antes de se
destacar no futebol carioca, foi campeão em Minas Gerais, pelo Villa Nova e
pelo Atlético. No ano em que chegou ao Botafogo, foi titular da seleção
brasileira terceira colocada na Copa do Mundo de 1938, mas deixou uma marca
desagradável naquela competição: Zezé Procópio foi o primeiro jogador
brasileiro a ser expulso em um Mundial, após dar um pontapé em Nejedly, no
empate em 1 a 1 com a antiga Tchecoslováquia.
Outro
lateral que brilhou na direita foi Cacá (1958 a 1964), morto recentemente. Além
de bom de bola, o ídolo foi líder dentro e fora dos campos. Uma impetuosidade –
igualmente a Carlos Alberto Torres - devidamente reconhecida pelas torcidas do
Fluminense e do Botafogo. Na década de 1970, despontou outro grande nome na
direita: Perivaldo (1977 a 1982), o “Peri da Pituba”, como os saudosos e
queridos locutores Jorge Cury e Waldir Amaral. Perivaldo chegou ao Botafogo com
a pecha de ídolo do Bahia. Não decepcionou, e caiu nas graças da torcida e do
técnico Telê Santana, da seleção brasileira, que convocou o lateral para alguns
jogos do escrete canarinho. O fato é que Perivaldo, após abandonar os gramados,
sumiu do noticiário. Quase três décadas depois, a reportagem do programa
“Fantástico”, da TV Globo, localizou Perivaldo em Lisboa. Outrora ídolo, o
craque tornou-se morador de rua na capital portuguesa. Logo após Perivaldo
deixar o Fogão, em 1982, surgiu no clube outra revelação na lateral-direita:
Josimar (1982 a 1989), um marcador que avançava com impetuosidade pelo lado do
campo. O estilo ousado fez de Josimar uma das figuras mais emblemáticas da
seleção brasileira na Copa do Mundo de 1986, no México. Josimar, além de gol
espetacular, foi um dos poucos jogadores daquele escrete que mereceram elogios
após a eliminação diante da França. Fora dos gramados, Josimar teve alguns
percalços. Foi preso sob a acusação de que estaria portando drogas. O que nega,
até hoje, veemente. Mas Josimar foi, e aqui não cabe oposição, um dos mais
empolgantes lateral destros da história alvinegra.
A
zaga histórica do idílico Botafogo dos sonhos continua com o argentino Basso
(1950 a 1951), que defendeu o clube em poucos jogos. Não chegou nem a 20
partidas, entre setembro de 1950 e janeiro do ano seguinte. Mas foi o
suficiente para fazer dele, como muitos cronistas botafoguenses do passado
reconhecem, o melhor zagueiro central que já defendeu o Glorioso. O saudoso e
querido cronista Luís Mendes o definia como aquele zagueiro “louro, de técnica
refinada e que jogava como o Domingos da Guia”. Muitos por aqui ignoram quem
foi Basso, e Mendes não exagerou na comparação com Domingos. O craque argentino
é considerado um dos maiores jogadores da história do tradicionalíssimo San
Lorenzo de Almagro e um os melhores defensores argentinos em todos os tempos.
Se Basso aportou em General Severiano, foi graças ao empenho, inicialmente, do
famoso repórter (e torcedor do alvinegro, claro) Geraldo Romualdo da Silva, do
Jornal dos Sports, que disse a Basso que deveria jogar pelo Botafogo, e, em
seguida, do próprio Luís Mendes, que apresentou o craque argentino ao
presidente do clube, Adhemar Bebianno. Foi paixão à primeira vista.
Mas
outros bons jogadores pintaram no miolo da zaga alvinegra: Nariz (1934 e 1941),
que esteve na Copa do Mundo de 1938; Gérson dos Santos (1945 a 1956), que
formou zaga com Nilton Santos no título de 1948, e Brito (1970 a 1971, 1973 e
1974), o xerife da seleção na Copa de 70.
Para
formar dupla com Basso, escalamos outro clássico zagueiro: Sebastião Leônidas,
um camarada incapaz de chutar a bola a esmo. Ela sempre tinha endereço certo:
os pés de algum companheiro rumo ao campo adversário. Leônidas brilhou,
primeiramente, no América e depois migrou para o Botafogo. Esteve cotado para
ir à Copa de 70, mas uma lesão o tirou de cena. A “Selefogo” de 1968, com
Gérson, Roberto Miranda e Jairzinho, teve Leônidas como um dos seus principais
craques.
Uma
das predileções de Leônidas era derrotar o Flamengo. O zagueiro esteve em campo
na goleada de 6 a 0 imposta ao Flamengo, no dia 15 de novembro de 1972, data em
que o rubro-negro festejava 77 anos de existência. Por conta do clássico, o
zagueiro, em um assomo de sinceridade, traduziu em palavras o mesmo estilo
clássico com que tratava a bola. Simplesmente insinuante e mordaz: “O Botafogo
é um time de alma moleque e eu me incluo entre os que adoram ver a torcida (do
Flamengo) aos prantos. Dá uma extraordinária sensação de bem-estar, porque
derrotar o Flamengo é calar toda a cidade.”
Escalaria
para a “reserva” de Sebastião Leônidas o grande Gonçalves (1989 a 1990, 1995 a
1997 e 1998). O zagueiro foi a alma do Botafogo campeão brasileiro, em 1995.
A
zaga ficará completa com a “Enciclopédia” Nilton Santos (1948 a 1964). Jamais
houve (ou haverá) um lateral-esquerdo como ele. Nos corações dos botafoguenses,
Nilton Santos é intocável, um gênio que vestiu apenas duas camisas em toda a
vida: a do Botafogo e a da seleção brasileira. Comovia o amor que nutria pelo
Glorioso. Emocionava a forma como falava do clube. Não... realmente não há como
escolher outro jogador para escalar na lateral canhota do Botafogo dos sonhos.
Mas
o clube teve outros bons jogadores que atuaram pela linha esquerda da defesa.
Heitor Canalli (1929 a 1933 e 1935 a 1940) foi um deles. Com o Fogão,
conquistou o Campeonato Carioca em 1930, 1932 e 1933. Perambulou pela Itália,
onde defendeu o Torino, sem sucesso. Voltou ao Alvinegro, em 1935, e foi,
novamente, campeão carioca. Juvenal (1946 a 1957), campeão em 1948, quando
Nilton Santos ainda jogava como zagueiro, foi outro excelente lateral-esquerdo.
Teve também o Rildo (1961a 1966), brilhante na década de 1960 e também ídolo no
Santos. O último grande lateral-esquerdo do Botafogo foi Marinho Chagas (1972 a
1976). Um jogadoraço.
Armar
o meio de campo do maior Botafogo que desejaríamos ver, sem tempo, sem relógio,
não é tão simples assim. O que tem de craque de bola não está no gibi. Tivemos
de remanejar um deles, que jogava um pouco mais avançado, para a posição de
centromédio ou volante, como queiram. Esse cara é o Gérson (1963 a 1969), o
“Canhotinha de ouro” da Copa do Mundo de 1970 e da “Selefogo”, de 1968. Ao
contrário do Capita, que foi ídolo do Fluminense e curtia mais reservadamente a
paixão pelo Fogão, Gérson é torcedor loquaz do Tricolor, porém ídolo inconteste
do Glorioso. Desde que começou, no Flamengo, e depois brilhou intensamente na
Seleção, no Botafogo, no São Paulo e no Fluminense, “Canhotinha” falava em alto
e bom som que o Fluminense era o time para o qual torcia. Mas, defendendo o
Botafogo, e sobre isso não tenho dúvida, Gérson foi muito mais craque. Muito
mais ídolo, inclusive. Por isso, encontramos uma forma de fazer dele o par
perfeito de Didi (1956 a 1959, 1960 a 1962, 1964 a 1965) nessa meia cancha
memorável. Mas o Botafogo, ao longo dos seus mais de 100 anos, vibrou com
grandes volantes. Listamos quatro deles: Martim Silveira (1929 a 1933 e 1934 a
1940), titular na Copa do Mundo de 1938; Ávila (1947 a 1952), ídolo eterno do
Internacional e ícone da conquista do Campeonato Carioca de 1948; Pampolini
(1955 a 1962), o escudeiro de Didi nos timaços que o Fogão montou no final dos
anos de 1950 e começo de 60; Alemão (1982 a 1986), que sofreu com a escassez de
título para o Botafogo e o período de dureza do clube, quando o futebol
alvinegro foi transferido para Marechal Hermes, e, por fim, o holandês Seedorff
(2012 a 2014), cuja passagem pelo Botafogo foi sensacional.
De
Gérson para Didi, a bola rola fácil, macia, e formamos aquele que seria o
melhor meio de campo em qualquer clube. Eleito o melhor jogador da Copa de
1958, Didi, cuja ótima biografia é assinada pelo jornalista Péris Ribeiro,
recebeu da imprensa europeia o justo e carinhoso apelido de Mr. Football
(Senhor Futebol). Nelson Rodrigues o chamava de “Príncipe Etíope do Rancho” tal
a elegância com que desfilava nos gramados.
Didi,
igualmente a Carlos Alberto Torres e Gérson, é outro exemplo de ídolo alvinegro
e tricolor. Pelo Fluminense, foi ele a estrela do time campeão da Copa Rio, de
1952, uma espécie de “Mundial Interclubes”, realizada no Brasil. Mas foi no
Botafogo em que atingiu o ápice. Foi jogando pelo Glorioso que inventou a
“folha seca”, um chute que, de forma incrível, fazia a bola mudar a trajetória
rumo ao gol dos pobres e incautos goleiros adversários. “Quem corre é a bola”,
dizia, sabiamente, o mestre. E, sob essa filosofia, Didi comandou o meio de
campo do Botafogo e da seleção bicampeã mundial, em 1958 e 62.
Outros
dois meias armadores encantaram a torcida alvinegra. Geninho (1940 a 1954) e
Afonsinho (1966 a 1970). O primeiro foi ídolo no futebol mineiro. Para muitos,
o melhor jogador de Minas Gerais no final dos anos de 1930. Jogava tanta bola
que passaram a chamá-lo de “O arquiteto”. Certa vez, um repórter da antiga
revista Esporte Ilustrado questionou-o sobre o porquê de a diretoria do
Botafogo relutar na concessão do passe livre. Ele humildemente respondeu, porém
com um coração alvinegro latente e comovente, o seguinte:
“Para
quem tem onze anos de clube, como eu, não adianta pensar nessas coisas. Com
´passe’ ou sem ‘passe’, estou amarrado. Estou preso pelo coração”. Enquanto o
romântico Geninho pouco se importava com as questões do “passe livre”, o outro
meia-armador histórico do Fogão, Afonsinho, pensava diferente. Foi ele o ícone
da luta do jogador brasileiro pelo passe livre, e mais: fez isso durante o
período mais acirrado da ditadura militar no Brasil, entre 1970 e 1974. No
campo, Afonsinho incomodava os adversários pelo toque refinado e maestria com
que tratava a bola. Fora dos gramados, os incomodados eram cartolas
subservientes ao governo ditador e treinadores que não curtiam a ousadia do
craque, um deles, Zagallo. Tornou-se notória a birra do “Velho Lobo” com
Afonsinho, ora pelos vastíssimos cabelo e barba que o jogador ostentava, ora
pela ideologia libertária que pregava. Ou mesmo as duas coisas juntas.
Para
completar essa “meiúca” espetacular, o nosso camisa “10” é Heleno de Freitas
(1939 a 1948). Seria “9”, mas decidimos escalá-lo como ponta de lança. Não há
como “barrar” Heleno no “Botafogo dos sonhos”. Acho, até, que nenhum treinador
em sã consciência ousaria fazê-lo. Primeiro, porque Heleno foi o jogador mais
“casca-grossa” que existiu. O chamado “gênio genioso”, como a ele se referia o
jornalista e radialista Luís Mendes, não aceitava a reserva, de forma alguma.
Heleno tem uma das biografias mais singulares da história dos maiores ídolos do
futebol brasileiro. Sua trajetória foi soberbamente narrada pelo jornalista
Marcos Eduardo Neves. Leitura obrigatória para quem ainda acredita que o mundo
do futebol é idílico. Talvez, somente Nilton Santos “rivalize” com Heleno pelo
posto de ídolo que mais amou o Botafogo.
Outros
grandes pontas de lança de ofício se destacaram com a “10”: Pirillo (1948 a
1952), um camarada que mantém até hoje, mas jogando pelo Flamengo, o recorde de
gols em campeonatos cariocas; Paulo Cézar Caju (1967 a 1972 e 1977 a 1978), que
foi simplesmente um gênio com a bola nos pés e, certamente, o mais versátil
craque que o Botafogo já teve, e Mendonça (1975 a 1982), um camisa “10”
clássico, estupendo, mas que, igualmente ao Heleno, jamais levantou,
profissionalmente, troféus vestindo a camisa alvinegra. Coisas que, definitivamente,
só acontecem ao Botafogo.
Hora
de montarmos o nosso ataque, sob o bom e saudoso “1-4-3-3”. Para a
ponta-direita, uma unanimidade: Garrincha (1953 a 1965), e não se fala mais
nisso. Mané dispensa apresentações, delongas ou “mais-mais”. Praticamente tudo
já foi muito bem escrito sobre ele pelo Ruy Castro, na antológica biografia
“Estrela Solitária: um Brasileiro Chamado Garrincha”. Este dublê de jornalista
e cartunista, que assina estas pretenciosas letras sobre o Fogão, arriscou-se
como documentarista, e conseguiu alguns bons depoimentos para o filme
“Garrincha: Simplesmente passarinho”, ainda em edição. Há, ainda, boas
histórias sobre Mané a serem contadas.
Nosso
centroavante é o Quarentinha (1954 a 1964), maior artilheiro da história do
Glorioso, com 313 gols. Sua história é contada no livro “Quarentinha: o
artilheiro que não Sorria”, assinado pelo Rafael Casé e lançado pela Editora
Livros de Futebol, do bravo botafoguense Cesar Oliveira, em 2008. Alvinegros de
quatro costados, o jornalista Armando Nogueira era fã incondicional do
centroavante, mas se surpreendia com a aparente frieza do craque em campo:
“Quarentinha jamais celebrou um gol, fosse dele ou de quem fosse. Disparava um
morteiro, via a rede estufar, dava as costas e tornava ao centro do campo,
desanimado como se tivesse perdido o gol”. O artilheiro era assim, retraído,
mas fenomenal. Impiedoso com os goleiros. O maior goleador que já vestiu a
camisa alvinegra. Seria injusto, contudo, afirmarmos que houve apenas
Quarentinha como grande goleador do Botafogo. A lista é extensa, com destaque
para Carvalho Leite (1928 a 1941), Paulo Valentim (1956 a 1960), Amarildo (1958
a 1963), Roberto Miranda (1962 a 1971 e 1971 a 1972) e Túlio (1994 a 1996,
1998, 2000 e 2012).
Para
finalizar a escalação dessa memorável “Selefogo”, deslocamos para a
ponta-esquerda Jairzinho (1965 a 1974 e 1981), o “Furacão da Copa” de 70,
permitindo a liberdade necessária para ele trocar de posição com Quarentinha,
na linha de frente do ataque. Isso deixaria os adversários tontos. Jairzinho
foi um atacante extraordinário e verdadeiramente apaixonado pelo Botafogo.
Bastava o Gérson lançar a bola em profundidade para a corrida desenfreada de
Jairzinho. Ninguém o parava. Mais um gol do Botafogo estava consumado. Na
canhota, o Fogão teve verdadeiros craques: Mimi Sodré (1908 e 1916), Nilo
Murtinho Braga (1919 a 1922 e 1927 a 1937), Patesko (1934 a 1940 e 1942 a 1943)
e Zagallo (1958 a 1965). Mas, que todos me perdoem, Jairzinho tinha de entrar
nesse time inesquecível. O maior Botafogo que o escalaríamos, se não existissem
os relógios. Um Botafogo que, nos sonhos de todos os alvinegros, manterá sempre
vivas as estrelas de uma constelação solidária ao amor que todo botafoguense
nutre pelos seus heróis, em preto e branco. Um Botafogo de cinema, meus amigos,
diria o centenário (e botafoguense) João Saldanha.
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