quarta-feira, 9 de julho de 2025

John Textor, a figura-chave: variações em análise

Crédito: Jorge Rodrigues.

[Nota preliminar: o Mundo Botafogo publica hoje a reflexão prometida aos leitores após a participação do nosso Clube no Mundial, aproveitando o momento de efetivação de um novo treinador]

por RUY MOURA | Editor do Mundo Botafogo

John Textor, acionista maioritário do Botafogo, assumiu a liderança do futebol do Clube desde o início do ano civil de 2022 quando o Glorioso acabara de se sagrar campeão da Série B e regressara à Série A do Campeonato Brasileiro.

Era a redenção do Botafogo pela 6ª vez na sua história futebolística (década de 1930, década de 1950, década de 1990 e regresso à Série A nos anos 2004, 2016 e 2022).

Porém, embora tendo conquistado o campeonato brasileiro da Série B em 2021 (tal como em 2015), o regresso da equipe à elite do futebol brasileiro foi acompanhado de nuvens cor de chumbo porque, uma vez mais, as desastrosas diretorias do século XXI levaram o Botafogo à rutura financeira e quiçá, à bancarrota, não fosse a operação que decorria paralelamente para a transformação do futebol botafoguense em Sociedade Anônima do Futebol, entrando assim para o grupo Eagle Football, comandado por John Textor.

Então, os dias de granizo que se adivinhavam no horizonte transformaram-se, sobretudo, em dias de uma primavera que ostentava a luz da esperança, a luz de uma redenção que prometia um radioso futuro sem fim.

Textor assumiu realmente as rédeas da SAF Botafogo e 2022 foi um ano tranquilo em que todos os objetivos definidos no início do ano por John Textor foram alcançados.

No entanto, em 2023, John Textor anulou completamente a pré-temporada depois da FERJ rejeitar a disputa do campeonato estadual por atletas da base, embora pudesse ter feito ainda uma parte dessa preparação inicial, mas ainda assim, sem pré-temporada, contra todas as normas de preparação de uma equipe para o ano, o treinador consegue acertar a equipe e chegar à liderança do Brasileirão.

Parecia que tudo iria caminhar melhor, até porque John Textor prometera bons reforços na janela, mas falhou rotundamente contratando atletas ineptos. Na verdade, o líder da Eagle Football tinha a cabeça em Lyon e descurou a gestão do Botafogo, focando-se principalmente nos problemas da equipe francesa.

O desastre foi rápido com a saída de Castro e a contratação de Bruno Lage, que se mostrou inábil na gestão da comunicação com o plantel e com a mídia, e não percebeu a realidade com a qual se deparou, rapidamente se mostrou equivocada, por culpa própria e por pressão do Departamento de Futebol que não se ligou ao treinador.

Era necessário novamente outro treinador, mas como Textor andava mais preocupado com o Lyon e o Crystal Palace, aceitou as preferências do Departamento de Futebol para promover Lúcio Flávio, que obviamente falhou, e o seu sucessor, também escolhido pelo Departamento de Futebol, Tiago Nunes, foi outro falhanço – tendo Textor assumido mais tarde parte das culpas.

E começaram cedo as saídas do plantel dos atletas que mais se destacaram. No futebol feminino a fenomenal Giovanna Waksman foi levada para os E.U. América com destino futuro à equipe feminina do Lyon e Lucas Perri e Adryelson transferidos para o Lyon.

O ano começou como terminou e John Textor reconheceu com clareza que falhou rotundamente a gestão do Botafogo-2023, decidindo então demitir Tiago Nunes e apostar, tardiamente, noutro desconhecido, Artur Jorge, que tinha apenas como currículo muitos anos de gestão das bases do Braga, tal como Castro havia gerido as bases do Porto por muitos anos e Bruno Lage as bases do Benfica. Em suma, treinador com grande currículo nos profissionais Textor não contratava.

Todavia, deu certo, sobretudo pela ousadia e dinamismo de Artur Jorge, mas também por boas contratações de Textor na janela de janeiro para se redimir da sua péssima gestão de 2023, embora na janela de transferências de julho não se aproveitasse praticamente nenhuma das contratações, que rapidamente foram sendo escoadas para o exterior em 2024 e 2025. Ainda assim, Textor proveu o Botafogo dos meios que fizeram sucesso na conquista do Brasileirão e da Libertadores.

Em dezembro J. Textor e A. Jorge eram uma espécie de Deuses para os botafoguenses, mas simultaneamente Textor era uma espécie de Diabo para os torcedores do Lyon, que se sentiam abandonados pelo ‘dono’.

E os problemas da Eagle Football, fora o sucesso desportivo do Botafogo, foram se acumulando em resultado das derivas de John Textor. No Brasil, John Textor envolveu-se em polêmicas que mais tarde percebeu que não tinha base de apoio suficiente para vencer e acabou mudando de estratégia; no Crystal Palace os acionistas maioritários não seguiam os planos de Textor e a sua influência era nula; no Lyon a crise financeira instalou-se e as críticas subiram de tom; quanto à equipe belga Textor decidiu recentemente mudar a sua designação e revoltou os torcedores. Quanto à equipe americana, tem permanecido fora dos nossos holofotes e pouco se sabe dela.

E neste pano de fundo em que Textor se mexia, ora para um lado, ora para outro lado, os seus clubes navegavam ao sabor do vento, ou melhor, ao sabor das prioridades de Textor, que não conseguia chegar a todos, beneficiando uns em prejuízo de outros e sem alcançar uma gestão equilibrada no quadro da Eagle Football, seja de estabilidade desportiva seja de estabilidade financeira.

Em 2025, face ao desastre financeiro do Lyon e à sua possibilidade de despromoção, Textor virou-se totalmente para o clube francês, embora no final de 2024 tenha prometido um ano ainda mais glorioso para o Botafogo. Porém, o Lyon não deixou…

Quando um clube chega ao auge como o Botafogo chegou em 2025, é fundamental que se mantenha a pegada dinâmica e vitoriosa, mas a gestão de Textor fez deste novo ano o pior da sua gestão, perdendo quase inutilmente o 1º semestre.

Em primeiro lugar deixou escapar Artur Jorge, com culpas deste, é certo, que correu atrás do cheiro dos petrodólares, mas também de Textor que não fez o mínimo esforço para o manter, e depois liquidou o ataque botafoguense: saíram Luiz Henrique (contra sua vontade, segundo as suas declarações), Thiago Almada e Júnior Santos, sobrando apenas Igor Jesus no que respeita aos atletas mais avançados.

Sem treinador, andou três meses para contratar um, depois de serem anunciadas conversas com treinadores como Rafael Benítez ou Roberto Mancini. Foi uma festa para a mídia: de nome em nome todos recusaram, até mesmo um tal de Vasco Matos, totalmente desconhecido e treinador do muito mediano clube Santa Clara, do arquipélago dos Açores.

O Lyon continuava sendo a preocupação de Textor. E a contratação de um treinador de nomeada permaneceu sem sucesso, ao mesmo tempo que, enredado nos problemas criados no Lyon, descartava a disputa de competições que considerava menores, como a Recopa Sul-americana, a Supercopa do Brasil e o Campeonato Estadual, as duas primeiras perdidas ingloriamente e no Estadual o Clube registrou a pior classificação de sempre.

E depois de – supostamente – muito procurar pelo mundo inteiro, acabou contratando um treinador residente no Rio de Janeiro: Renato Paiva, livre no mercado, sobre o qual o Mundo Botafogo publicou o perfil realçando os altos e baixos da sua curta carreira como profissional, já que foi mais um treinador contratado com base em anos de gestão das bases do Benfica. Na verdade, foi uma contratação de recurso.

Aos trancos e barrancos, com uma equipe sem pré-temporada e muito desequilibrada de individualidades, e praticamente sem banco, bem como 'escandalosas' contratações inexpressivas até agora (p. ex.: atacantes como Mastriani, Rwan Cruz e Elias Manoel, estando estes dois últimos já em negociação de saída), Paiva foi-se salvando aqui e ali, mas sem conseguir consolidar-se – o que seria ‘milagre’ se o tivesse conseguido nas circunstâncias atuais.

De Textor esperava-se o prometido: grandes contratações para o Botafogo poder brilhar no Mundial de Clubes. Porém, foram contratações sem qualquer efeito, porque se tratava de jogadores que não jogavam regularmente há bastante tempo, bem como não poderiam, assim, ajustar-se adequadamente à equipe em apenas 15 dias – a não ser que fossem realmente grandes contratações para atuações a níveis individuais elevados.

A equipe que jogou no mundial foi praticamente a mesma que vinha do passado, sem reforços efetivos e sem os atacantes Luiz Henrique, Thiago Almada e Júnior Santos, ficando apenas Igor Jesus muito isolado no ataque e também de saída para Inglaterra. Foi graças ao esforço do técnico e dos jogadores que fizemos um Mundial com repercussão, apesar da falta de recursos  suficientes no plantel. Textor até beijou publicamente Paiva aquando da vitória do Botafogo sobre o campeão europeu, mas dez dias depois demitiu-o. Supostamente porque Paiva não lhe permitia escalar a equipe, designadamente não dando montra a Santí Rodrigues para o valorizar em possível transferência ou escalando Cuiabano no ataque – por falta de opções de um ataque que foi quase totalmente vendido –, já que Textor o queria como lateral no Mundial para o valorizar em nova venda, quiçá no futuro imediato junto ao pacote Igor Jesus e Jair Cunha, indicados para rumar ao Nottingham Forest.

Simultaneamente o Lyon via-se a braços com a possibilidade de ser despromovido por incumprimento financeiro, Textor decidiu vender a sua parte acionista no Crystal Palace e rapidamente as ações mudaram de mãos. Porém, nem assim o Lyon se salvou da condenação oficial de despromoção (ainda sujeita a recurso).

Por outro lado, Textor envolvera-se em ataques públicos ao presidente do PSG e à Federação Francesa de Futebol, tendo saído mal dessa compita, e decidiu afastar-se do Lyon descentralizando a gestão, com a torcida em polvorosa acusando Textor de ‘destruir’ financeiramente o Lyon – e principalmente figuras históricas do clube, que chegaram a avisar que Textor também acabaria por levar o Botafogo a situações complicadas, o que todos esperamos que jamais aconteça.

Descartado do Crystal Palace, afastado do Lyon, distante do clube belga cujo nome trocou, Textor garantiu à TV Globo que “vou passar muito mais tempo a pensar na Eagle Football e focar-me novamente no Botafogo” – reconhecendo publicamente que se desfocara do Glorioso e negligenciara a gestão estratégica da Eagle Football.

Esperamos, fervorosamente, que essa promessa seja integralmente cumprida!

Davide Ancelloti na chegada ao Rio de Janeiro, e que traga com ele os deuses do futebol.

Porém, a procura de novo técnico seguiu os trâmites costumeiros, com todo mundo descartando treinar o Botafogo. Textor tirou então um 'coelho' da cartola: já que não conseguiu contratar um nome de peso, contrata o filho de um nome de peso – Carlo Ancelotti –, que nunca foi treinador principal, o que pode constituir um sério problema, embora como auxiliar técnico tenha estado em comissões técnicas vencedoras em grandes clubes europeus.

Na verdade, a aura de modernidade e inovação que alguns atribuem a Ancelloti por ter trabalhado com o pai em grandes clubes europeus assemelha-se à contratação do “discípulo de Pep Guardiola”, Domènec Torrent, assistente técnico nos maiores clubes do mundo, que iria “inovar e revolucionar o futebol brasileiro” e colocar o Flamengo num patamar mundial – demitido poucos meses depois e ainda hoje sem nenhum título significativo.

Davide Ancelotti, filho de Carlo Ancelotti, é mais um tiro no escuro, que talvez acerte no alvo, ou talvez, para nosso desespero, passe novamente ao lado.

É o 7º treinador na Era SAF (média de 6 meses por treinador) e nenhum de renome, o que é preocupante, especialmente sendo o Botafogo campeão Brasileiro e Sul-americano – e nem assim se conseguiu atrair um treinador de destaque no mundo do futebol. No entanto também já houve treinadores que – como Davide Ancelotti – passaram anos ‘agarrados’ a um treinador de nível mundial e aprenderam o suficiente para obterem resultados bem sucedidos e inovar desde o início da carreira, como foi o caso de José Mourinho, assistente de Bobby Robson no início da carreira, e desde a sua estreia como treinador figurou durante muitos anos no top mundial.

E que seja futebol vertical e ousado como Ancelotti anunciou, apoiado criativamente pelo setor intermédio e suportado por uma defesa inexpugnável  como é da minha preferência, e provavelmente da maioria dos botafguenses.

À margem desta análise, devo dizer que há muito tempo que sou fã de Carlo Ancelotti, que considero o melhor treinador do mundo, e se o filho tiver sucesso ficarei duplamente feliz – pelo Botafogo e pelos Ancelotti. Em caso de sucesso o 'coelho' tirado da cartola por John Textor pode transformar-se numa jogada de mestre tendo em consideração que se os Ancelotti tiverem sucesso o acionista maioritário do Botafogo marca pontos no plano institucional.

Porém, para o sucesso de Ancelotti ainda em 2025 urge que se façam dispensas no plantel e sejam contratados reforços a valer e não apenas gente encostada aos seus clubes de origem, porque o plantel continua muito desequilibrado e neste momento o nosso trio de atacantes, vitorioso na Libertadores, foi vendido (tal como o reserva Júnior Santos); urge que o desenvolvimento das categorias de base seja alvo de grande incremento a partir dos bons resultados obtidos neste ano, recuperando a tradição de 'clube formador'; urge que o Botafogo estabeleça relações institucionais sérias e exigentes com as instituições desportivas e outros parceiros e que os seus dirigentes, principalmente John Textor, tenham postura realmente de dirigentes e não de torcedores, porque para torcer estamos cá nós, que somos muito bons nisso; urge que as contas do Clube sejam transparentes, algo que continua sob nevoeiro e é crucial para garantir a estabilidade financeira do Clube e a confiança da torcida.

De ‘provedor’ do nosso Clube – mercê de saneamento financeiro das dívidas do passado, melhoria de infraestruturas e bons resultados desportivos – a ‘carrasco’ neste ano corrente – falhando todos os seus atos de gestão – John Textor precisa refletir seriamente sobre como tem gerido a Eagle Football e em particular os seus clubes, porque claramente tem havido ziguezagues que tanto têm beneficiado como têm prejudicado financeiramente e desportivamente os clubes da Holding.

No nosso caso John Textor focou-se no Botafogo em 2022 e 2024 e desfocou-se em 2023 e 2025, alternando o seu foco e indiciando que não consegue gerir com regularidade todos os clubes em três continentes e culturas, tornando-se necessário repensar a gestão global da Holding de modo a descentralizar responsabilidades e estabelecer objetivos e metas aos dirigentes locais para que o nosso Clube (e os outros) não esteja à mercê de dependências do que se passa nos demais clubes da Holding.

A deriva tem que terminar de vez para consolidarmos o nosso Clube desportivamente. Do lado financeiro a transparência é fundamental para não entrarmos em insolvências como no passado, porque se um dia Textor resolve vender o Clube, e creio que todos torcemos para que não o faça, a bem da estabilidade para a conquista de títulos, quem fica somos nós – seja com o Clube no verde, seja no vermelho.

É justamente por isso que é necessário clarividência para exercermos tanto o nosso agrado como o nosso desagrado face a cada situação concreta de gestão do Clube, porque chame-se ele SAF Botafogo, Botafogo de Futebol e Regatas ou outra designação futura qualquer, ele está acima de qualquer figura individual dentro ou fora de campo e será sempre o mesmo e único Botafogo que pulsa no nosso coração e enche as nossas almas de alegria.

Ao contrário da triste frase proferida recentemente pelo mais alto dignitário do Botafogo FR (“Botafoguense que critica John Textor bom sujeito não é”), Botafoguense que critica John Textor – ou quaisquer outros dirigentes, membros de comissões técnicas ou jogadores – com fundamento e construtivamente, em defesa do Glorioso Clube da Estrela Solitária, bom sujeito é!

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