sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Menino de asas


Irreverente, sim. Mas Garrincha sempre quis a vitória tanto quanto os dribles. Sem ele, o Brasil não teria a metade das glórias que alcançou em sua história.

por Edson Rossi

Dizer o quê de quem fez a torcida gritar pela primeira vez olé dentro de um estádio de futebol? E nem era a torcida do time dele, o Botafogo, mas sim mexicanos que assistiam a uma de suas exibições pelo mundo. O jogo valia por um desses torneios caça-níqueis aos quais o time carioca era convidado. O adversário do Botafogo era o River Plate, da Argentina – o jogo terminou empatado por 1x1. O adversário de Garrincha era apenas o lateral Vairo, que, de tão humilhado em campo, acabou substituído. Num dos dribles, o ponta parou, encarou o inimigo e partiu para o cruzamento, como se não houvesse ninguém por ali. Os torcedores soltaram o primeiro olé, expressão até então típica de touradas. “Não há nada o que fazer, é impossível”, sentenciou Vairo ao sair do gramado. João Saldanha, técnico do Botafogo na época, notou que o argentino estava feliz.

Não havia mesmo nada a fazer diante de Garrincha. Assim como não há como defini-lo senão dizendo que Mané arrebentava. Era imprevisível e dono de um futebol que jamais se enquadrou a esquemas táticos, características que lhe renderam uma das mais incorretas famas dentro do futebol nacional, a de que preferia o drible ao gol, a inconseqüência à vitória. Seu amor pelo espetáculo não significou, em momento algum, que Mané não fosse um atleta obcecado pela vitória. Era, sim. Em quase 13 anos no Botafogo, em que conquistou os títulos cariocas de 1957, 1961 e 1962, fez 579 jogos (249 gols). Pela Seleção Brasileira jogou 50 vezes (13 gols) e perdeu apenas uma – a última, na Copa de 1966, nos 3x1 para a Hungria. E quando jogou ao lado de Pelé, o Brasil nunca foi derrotado. É isso mesmo: com Pelé e Garrincha de camisa amarela, ou dava empate ou dava Brasil.

Uma das pessoas que melhor entenderam Mané foi outro botafoguense histórico, o dublê de cronista, jornalista e treinador João Saldanha. “Daqui a 400 anos, toda a vez que falarem de futebol, terão de falar de Mané Garrincha”, resumiu Saldanha. Nada mais justo para o ponta que ganhou lugar no time principal do Botafogo por humilhar o lateral de Seleção Brasileira Nilton Santos num treino. “Se Mané não estivesse no mesmo time que eu, dificilmente eu jogaria até os 38 anos e teria sido titular numa Copa do Mundo aos 37”, admitia Nilton Santos, certo de que todos os laterais esquerdos do país caiam no ostracismo ao enfrentar Garrincha.

Os estragos que fazia com a camisa botafoguense ele repetia com a da Seleção Brasileira. Mané foi bicampeão mundial e, para muitos, não fosse ele o Brasil teria saído da Copa do Chile, em 1962, muito mais cedo. Naquele mundial, Pelé machucou-se no segundo jogo e não voltaria mais ao time. Pois Garrincha assumiu o comando da Seleção, fez quatro gols – tornando-se um dos artilheiros do torneio – e voltou de Santiago com a taça na bagagem. O jornal chileno “El Mercurio” resumiu o que foi a participação dele na Copa com a manchete “De que planeta vem Garrincha?”

Em 1965, os problemas crônicos com os joelhos já o impediam de jogar e Garrincha praticamente se despediu do Botafogo. No ano seguinte foi para o Corinthians e depois para o Flamengo. Não tinha mais, no entanto, a mesma ginga, o mesmo arranque. Dispensado, passou a rodar atrás de clubes menores. Vestiu a camisa do Milionários, do Olaria e fez vários jogos na várzea – nos quais ganhava algum dinheiro por partida. Sua última apresentação com uma camisa 7 nas costas aconteceu de forma melancólica, no Natal de 1982. Mané estava com 49 anos e jogou 20 minutos pelo Planaltina, do distrito federal, contra um time sindical. Menos de um mês depois, no dia 20 de janeiro de 1983, morreu de crise depressiva e em função do porre que havia tomado no Natal.

Foto: Popperphoto

6 comentários:

Leonel disse...

Pois é Rui, o Brasil nunca perdeu nenhum jogo com Pelé e Garrincha em campo.
Além disto, com Garrincha em campo, o Brasil só perdeu um jogo: contra a Hungria, na copa de 1966. Pelé não jogou por estar contundido e Garrincha já havia passado sua melhor fase.
Abraços!

aaa disse...

Venho mais uma vez parabeniza-lo por esse blog maravilhoso!

Além de parabenizá-lo, gostaria de sugerir um tema(não sei se esse seria o veículo ideal, porém não encontrei o seu e-mail). Certa vez você citou o bravíssimo Adhemar Bebiano como um de nossos patronos, após a sua citação tentei pesquisar sua história e não encontrei nada!

Fica a sugestão de mais um tópico: Grandes Patronos do Botafogo.

Espero estar colaborando com o blog!

Abraços e sucesso!

Ruy Moura disse...

É verdade, Leonel. Foi uma pena Garrincha ter ido ao Mundial em 1966, porque a sua forma não era boa e, sobretudo, aquela seleção estava destinada ao fracasso desde os bastidores, devido a erros de palmatória. Se não tivesse ido jamais teria perdido.

Abraços Gloriosos!

Ruy Moura disse...

Certo, meu amigo, farei algo sobre Adhemar Bebiano. Incluirei na rubrica 'dirigentes' já criada, junto dos demais dirigentes / patronos. Obrigado.

Abraços Gloriosos!

Lorismario disse...

Garrincha não morreu. Ghandi não morreu.Galileu não morreu. Einstein não morreu. Da Vince não morreu. Carl Sagan não morreu, Dante Alighieri não morreu. Outros tantos não morreram. Só morre quem desaparece. Loris

Ruy Moura disse...

Nem mais, Loris. Quem é lembrado inspira, quem inspira, influencia, quem influencia está vivo na cultura do mundo.

Abraços Gloriosos!

Botafogo Campeão Metropolitano Sub-12 (todos os resultados)

Equipe completa. Crédito: Arthur Barreto / Botafogo. por RUY MOURA | Editor do Mundo Botafogo O Botafogo sagrou-se Campeão Metropolitano...