por
MÁRIO FILHO
Jornalista
desportivo
Do time do Botafogo, campeão de 10, só três jogadores
trabalhavam: o goalkeeper, Coggin, um
fullback, Edgard Pullen, um halfback, Lefreve. Coggin e Pullen, com
seus 24 anos, os mais velhos de todos. Trabalhavam em firmas importadoras,
inglesas. […] O Futebol tendo, para eles, o seu lugar e o seu tempo, sem
atrapalhar o trabalho. Primeiro o trabalho, depois o futebol. […] Lefreve, o
outro que trabalhava, mais moço, mais livre. Corretor. […]
O resto, tudo estudante. Lulu Rocha, Emanuel Sodré e
Lauro Sodré, acadêmicos de direito. Rolando Delamare e Décio Vicares, acadêmico
de medicina. Dinorah de Assis e Mimi Sodré, alunos da Escola Naval. Abelardo
Delamare ainda no Abílio, terminando os preparatórios. Tinha dezessete anos
como Mimi Sodré. Os caçulas do time. Dinorah com os seus dezoito, os outros com
os vinte e um anos. […]
Fora difícil formar um time, fundar um clube,
transplantar o futebol da Inglaterra para o Brasil. Formado o time, fundado o
clube, o futebol estava pegando.
O Paissandu também tinha um time de futebol. E havia
outro em Niterói. Para Alberto Borghert, Gustavo de Carvalho e Chico Loup,
bastava. SE o Fluminense fosse o único clube, bastava do mesmo jeito. O futebol
era o Fluminense. Para Flávio Ramos e Emanuel Sodré, não. O Fluminense era uma
coisa, futebol outra. Compreenderam logo o futebol, não compreenderam o
Fluminense. […]
Voltaram para casa com a cabeça cheia de futebol. Era
fácil jogar, meter o pé numa bola, sair correndo atrás dela. […] Mas nada do
Fluminense, nada de ir para o campo da Rua Guanabara bater bola. No Largo dos
Leões havia um campo. Uma praça, larga, três filas de palmeiras. Servia
perfeitamente como campo. As palmeiras não atrapalhavam, pelo contrário. Onde
eles iriam encontrar barras de gol melhores do que as palmeiras imperiais do
Largo dos Leões? Se o gol ficasse muito largo, arranjava-se um paralepípedo.
O Botafogo nasceu ali, no Largo dos Leões, no campo das
palmeiras. De tarde, depois das aulas, antes de escurecer, juntavam-se para um
par ou ímpar, os rapazes de Botafogo.
Uns estudavam, como Flávio Ramos, como Emanuel Sodré,
como Lauro Sodré, no Colégio Alfredo Gomes. Outros, como Álvaro Werneck, Mário
Figueiredo e Basílio Viana, no Abílio. Otávio Werneck, Arthur César de Andrade,
Vicente Licínio Cardoso e Jacques Raimundo, eram do Ginásio Nacional, o Pedro
II. Gente do mesmo colégio se separava, gente de colégios diferentes se
juntava. […]
O desejo de ser homem, tão forte em todo o rapazinho,
aproximava-os mais do Fluminense. O desejo de ser homem não era menos forte em
Flávio Ramos, em Emanuel Sodré, com menos de vinte anos. Mas eles se tornariam
homens no Botafogo, no seu clube.
Fonte (livro à venda): FILHO, Mário (2003). O negro no
futebol brasileiro. Mauad Editora, 4ª Edição, pp. 38 e 82-83.
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