
Sejamos francos sobre o jogo de ontem e admitamos que a nossa equipa tem pouquíssimos jogadores capazes de estarem à altura de uma equipa de futebol do Glorioso. Contam-se pelos dedos de uma mão os titulares realmente capazes: Renan, Leandro Guerreiro, Maicosuel, Reinaldo e Victor Simões. Talvez sirvam para reservas Juninho, Thiaguinho, Gabriel, Fahel e pouco mais. Os outros podem ir para o Tabajara…
Se falha o goleiro ou o Leandro Guerreiro, então teremos seguramente uma baliza absolutamente vulnerável. Foi o que aconteceu no jogo de ontem. Renan teve quatro bolas para defender em todo o jogo: os gols do Americano em que claramente fracassou, a do penalty em que foi completamente driblado e uma bola finalmente espalmada quando a cortina do jogo se preparava para baixar sobre o Engenhão. Se é deste modo que Renan pretende assegurar a titularidade, creio que o Castillo terá fortes possibilidades de o conseguir.
Leandro Guerreiro esteve irreconhecível, a saída de bola continua muito deficitária e por isso o meio campo não consegue armar e o ataque marcado daquele modo pelo adversário é absolutamente inoperante.
Por outro lado, a defesa insiste em fazer faltas muito próximas da área e foi de duas faltas assim que saíram os gols do Americano. O nosso adversário treina-se precisamente para isso, remetendo-se à defesa e explorando essas faltas em contra-ataque. E nós, uma vez mais, fizemos a vontade ao adversário.
No meio campo somente Tiaguinho funcionou com regularidade, fazendo bons lançamentos, mas revelando-se muito deficiente a chutar. Como Maicosuel só fez uma jogada realmente muito boa, quando lançou Reinaldo para gol, o ataque manteve-se desentrosado. Como o ataque não esteve bem, as jogadas de Thiaguinho perderam-se. Reinaldo continua muito aquém das expectativas, salvando-se apenas no giro que fez antes de marcar o segundo gol, e Victor Simões, além de ‘bico’ na bola no primeiro gol, teve por ‘mérito’ obter dois cartões amarelos e ser expulso – um dos quais redundou em gol do adversário.
Ney Franco tentou alterar o esquema, reforçou o ataque, e, com isso, o Botafogo apareceu mais no segundo tempo para tentar ganhar, mas depois do 2º gol a equipa encostou-se novamente e não perdeu por acaso.
Claro que eu não gosto do esquema montado pelo Ney, porque prefiro, de longe, duas linhas de quatro à moda do futebol europeu, as quais revelam enormes virtudes de articulação entre defesa, meio campo e ataque, conferindo ao jogo uma plasticidade e uma eficácia muitíssimo maiores. Um esquema destes, mesmo com os nossos jogadores, dava para ganhar a Taça Rio e o campeonato por antecipação. Porém, respeito o esquema do treinador, porque é a opção dele e, nesse quadro, creio que procura fazer o melhor, mostrando, por diversas vezes, que não é retranqueiro. O que não tem é uma equipa que, apesar de ofensiva e goleadora neste campeonato, mostre qualidades suficientes para o esquema bolado. Por isso é que as duas linhas de quatro seriam essenciais.
Quanto ao Americano, o seu esquema foi muito bem montado, não se desviou um milímetro do alvo, mesmo perdendo por 1x0 e por 2x1. As marcações forma muito fortes e a equipa mostrou que, sendo bem marcada, produz pouco, porque não tem grandes valores individuais. O Botafogo só pode ganhar através do jogo de conjunto, da aplicação em campo e da cooperação entre os jogadores.
Além de montar um forte esquema defensivo, o treinador adversário foi para mim uma enorme e agradável revelação ao fazer as notáveis declarações de lealdade de disputa antes do jogo e, no final, utilizando uma argumentação absolutamente sólida e capaz quanto à grande penalidade não assinalada a favor da sua equipa. Um exemplo raro de civismo linguístico e gestual no futebol brasileiro!
O mesmo não aconteceu do nosso lado. Numa noite que não foi pautada por falta de sorte nossa, a equipa beneficiou claramente de dois momentos anormais: um gol escandalosamente ‘oferecido’ pelo zagueiro adversário logo no início de jogo e uma grande penalidade feita sobre o Americano com Renan completamente batido. O Americano teve aí a hipótese da virada no Engenhão, mas o juiz, bastante mau, favoreceu-nos num jogo ‘menor’ para adiante sermos prejudicados num jogo ‘maior’. A comissão técnica deveria ter reconhecido e repudiado a não marcação da grande penalidade, ganhando poder de intervenção para o futuro (porque o globoesporte, que acha “polémicos” os erros contra os urubus, tratou logo de realçar a grande penalidade “evidente” não assinalada).
O futebol é sempre uma incógnita e creio que teremos hipóteses de ganhar a Taça Rio se a equipa der o melhor de si e trabalhar em conjunto, mas receio que o nosso esquema seja demasiado conhecido e frágil. À falta de valores individuais, é o esquema tático que tem que evoluir, bem como o comportamento dos jogadores em campo, designadamente a sua postura em vontade, em cooperação mútua e em concentração no jogo – e também em traquejo que não têm, evitando situações de faltas muito perigosas para nós à entrada da área.
O crescimento verificado ainda não foi suficiente para assegurar concentração permanente no jogo, saída de bola no chão e não através de chutão, passes calculados e posse de bola com mudanças rápidas de velocidade. Enquanto isto não se consolidar, seja qual for o esquema tático adoptado, viveremos sempre entre extremos – vitória de goleada, derrota de goleada e empates ‘colaborantes’ de arbitragens complacentes.
Eu quero ganhar sempre – mas com mérito!
FICHA TÉCNICA
Botafogo 2x2 Americano
Gols: Victor Simões 12’ e Reinaldo 78’ (Botafogo); Ernani 22’ e Kieza 41’ (Americano)
Competição: campeonato carioca
Data: 25/03/2009
Local: Estádio Olímpico João Havelange, o ‘Engenhão’
Arbitragem: André Luís Paes Ramos; Raimundo Araújo dos Santos e Ricardo Saldanha Batermarqui
Cartões amarelos: Victor Simões e Alessandro (Botafogo); Anderson, Siller, Kieza e Renan (Americano)
Cartões vermelhos: Victor Simões (Botafogo); Gil (Americano)
Botafogo: Renan, Alessandro, Emerson (Jean Carioca), Juninho e Thiaguinho; Leandro Guerreiro, Fahel, Léo Silva (Gabriel) e Maicosuel; Reinaldo e Victor Simões. Técnico: Ney Franco.
Americano: Jefferson; Elson, Anderson e Carlão; Paulo Henrique, Renan, Siller (Kim), Diego Sales (Cafezinho) e Ernani; Eberson (Gil) e Kieza. Técnico: Toninho Andrade.