terça-feira, 16 de novembro de 2010

Entrevista com Luiz Mendes (2)

Luiz Mendes e José Carlos Araújo entrevistados por um estudante

Comentarista esportivo da Rádio Globo, colunista do Jornal dos Sports e com passagens pela TV Rio, TV Educativa e Rádio Nacional.

por Rafael de Morais Venâncio, em 2005

P - Em conversa com o Roberto Porto, ele me disse que se não fosse o Santos o Botafogo teria sido hegemônico nessa época…

R - Eu não chego a concordar com o meu amigo Porto. Porque aqui no Rio o futebol era mais difícil, era mais parelho do que em São Paulo. Lá existia uma distância muito grande do Santos para os outros. E aqui o Botafogo não tinha uma distância tão grande assim, tanto que nesses mesmos 15 anos o Botafogo ganhou sete títulos. Aqui havia coisas que você não pode nem imaginar que no regime profissional acontecessem.

P - Que tipo de coisas?

R - Por exemplo, Vasco e Flamengo decidiram o campeonato de 1944 na Gávea. O Flamengo não quis ir para um estádio maior que seria São Januário, que era o campo do adversário. Ele preferiu decidir um título num estadinho, quer dizer, arrecadar dinheiro pouco importava. O lado profissional da coisa desaparecia em benefício do lado esportivo. Aí o Flamengo foi campeão no campinho deles contra aquele timaço que o Vasco tinha que se chamou o “Expresso da Vitória”, que foi vice-campeão nessa decisão com um gol irregular do Flamengo. No ano de 45 o Vasco foi campeão invicto, no ano de 46 ele perdeu por um ponto para quatro clubes: América, Botafogo, Fluminense e Flamengo. Em 47 o Vasco também conquistou o título invicto e em 48 o Botafogo quebrou a sequência dele decidindo em general Severiano, que também era um estadinho para uma decisão de campeonato do Rio de Janeiro. Em 49 o Vasco voltou a ser campeão invicto.

P - Por sinal o Heleno de Freitas estava no Vasco…

R - O Heleno jogou algumas partidas, mas criou muitos problemas, pois ele já estava perturbado mentalmente. Inclusive o Flávio Costa uma vez andou atrás dele com revólver nas mãos.

P - Por que o Botafogo tendo vestido tantos craques do futebol brasileiro é motivo de chacota na imprensa?

R - Porque eles são contra aquele time que dava olé neles. Por duas décadas, levavam olé, levavam goleadas. Então eles ficaram com ódio daquel time que ganhava sempre do deles.

P - Mas você acha que isso dura até hoje?

R - Perdura, passa de geração para geração. Havia um cara no São Cristóvão chamado Cantuária que lançou uma frase: “percam para todos menos para o Botafogo”. E essa frase passou para os outros. O Botafogo não é assíduo em ganhar títulos, tanto que dos grandes foi o que menos ganhou, mas respeitado por todas as razões. Por exemplo, um jogo ocorrido em 1968, Brasil e Argentina… e a CBD, que hoje é CBF, não quis formar uma seleção nacional, entregou ao Botafogo, que pediu três reforços: um goleiro, que foi Félix, que era do Fluminense, Nado, ponta pernambucano que jogava no Vasco e mais um do qual não me recordo. E esse time do Botafogo ganhou da seleção da Argentina por 4x1 no Maracanã, com o maior olé da história, 52 toques, que culminou com um gol de Jairzinho. Esse time tinha que ser ao mesmo tempo respeitado e odiado pelos adversários.Eu tinha um vizinho que me dizia assim: “enquanto tiver esse demônio desse Garrincha jogando a gente não ganha”. Ele era Flamengo. Realmente, nesse ano em que ele disse isso o Botafogo meteu 3x0 no Flamengo na decisão com o Garrincha fazendo e acontecendo.

P - Até que ponto você acha que a paixão clubística interfere na construção de uma matéria?

R - Claro que acontece só que não é uma regra. Há várias personalidades na crônica esportiva que são honestas. Há várias personalidades dignas, que não se deixam influenciar pelo coração. Usam a razão, acima do coração. O profissional que trabalha nessa área tem que policiar sua paixão.

P - Como você vê a interferência nas matérias ocasionada por questões mercadológicas?

R - Isso acontece também. Eu vou te contar uma história… o Jornal dos Sports, segundo me disse o [José Antônio] Gerheim, que é o redator chefe do jornal, ele me contou que a venda do jornal dos Sports quando o Botafogo ganha é maior do que quando ganham os outros clubes. Os torcedores do Botafogo preferem o Jornal dos Sports. Isso acontece porque o Jornal dos Sports tem uma forma de proceder usando o clássico como atracão. Se um dos jogos é Vasco x Botafogo e o outro é Flamengo x Fluminense, se os dois primeiros estiverem somando mais pontos, o Jornal dos Sports dá mais importância a esse jogo do que ao outro. Eles não estabelecem a torcida como parâmetro. Eles estabelecem a importância do jogo face ao andamento da competição. Então isso aí mostra uma independência maior. Em outros jornais… poxa… o Flamengo joga contra o “Arranca-toco”, esse jogo é sempre mais importante do que as partidas dos outros clubes.

P - Eu estou realizando um estudo de “O Globo” em que eu comparo a cobertura destinada aos quatro grandes do Rio e fica clara a preferência por Flamengo e Fluminense. Não sei se um menor destaque ao Vasco se deve ao Eurico Miranda…

R - Depois que o Eurico Miranda bateu de frente com a crônica esportiva… tem dois sujeitos que são realmente odiados dentro da crônica esportiva. Um é o Caixa D’ Água, Doutor Eduardo Viana, e o outro é o Eurico Miranda. Então é um negócio muito sério. O Doutor Eduardo Viana é muito sincero, ele não deixa de manifestar o seu pensamento. Se ele não gosta de um determinado cronista, ele diz publicamente. Ele tem ódio do Sérgio Noronha, do Fernando Calazans, do Renato Maurício Prado, que soa grandes colunistas. São opiniões que pesam. O acusam de desonestidades financeiras, mas até hoje ninguém provou. Eu me lembro que escreviam que quando o Eurico Miranda perdesse a imunidade parlamentar seria preso. Há quanto tempo ele perdeu a imunidade parlamentar e está solto aí, tranquilo. A gente não vai dizer que não sejam verdadeiras as acusações feitas a esses dirigentes, só que até hoje ninguém provou nada. E nem puniram coisa nenhuma. O Eduardo Viana ficou fora da Federação durante um tempo, mas como não encontraram nada que pudesse incriminá-lo, ele voltou. Outra acusação que fazem a ele é que ele protege o Americano, mas isso não seria diferente daquilo que muitos cronistas esportivos fazem em relação ao seu clube de coração. Muitos jornalistas protegem o clube do seu coração.

P - Eu estava conversando com o Waldir Luiz, radialista da Rádio Nacional, e ele me disse que devido ao fato de o editor de esportes de O Globo ser tricolor as matérias sobre o Fluminense são sempre destacadas.

R - As matérias do Fluminense são mais envernizadas.

P - E as matérias do Botafogo, mesmo tendo conquistado a Taça Guanabara, recebem um tom pejorativo: “Botafogo é campeão, mas não tem motivos para sorrir”. Sempre enfatizando os salários em atraso.

R - Todos os clubes estão com os salários atrasados, mas parece que só o Botafogo que está devendo. Por isso é que eu muitas vezes o defendo, participando do programa “Enquanto a bola não rola”. Os meus colegas falam: “mas o Botafogo está devendo”. Mas quem é que não está devendo?

Fonte: VENÂNCIO, Rafael de Morais (2005). “HÁ COISAS QUE SÓ ACONTECEM AO BOTAFOGO”. O mito da imparcialidade dentro do jornalismo esportivo. Juiz de Fora: UFJF; FACOM, 116 fl. Projeto Experimental do Curso de Comunicação Social.

2 comentários:

Aqipossa Informativo disse...

Rui,

confesso que estou um pouco atarefado nos últimos dias e por isso estou esperando ter fim esta entrevista para lê-la por completo.

Não faço idéia das palavras usadas até agora, se queres ter uma idéia. Ainda falta uma parte, é isso?

Saudações.

PS. Uma vez, exatamente no Vasco 0x0 Botafogo em 89 no primeiro turno, eu estava no corredor das cabines de rádios do Maracanã junto de meu avô falecido, Mário Derrico que estava trabalhando para a Rádio MEC, fazendo comentários do jogo entre a programação da Rádio, e ao fim da partida, encontramos todos, eu, meu avô, seu irmão - também já falecido e xará de Luiz Mendes - e o próprio Luiz Mendes no corredor. Após nos cumprimentarmos, ao meio da conversa, LM afirmou ainda naquela rodada do Carioca de 89: "Taí o time campeão. O Botafogo vai ser campeão esse ano."

SOA (Saudações Ocupadas Alvinegras)
Mauro Axlace

Ruy Moura disse...

A entrevista está dividida em três partes. A última é publicada amanhã.

Esse encontro de 1989 merecia ter tido foto.

Abraços Gloriosos!

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