segunda-feira, 28 de abril de 2014

Exaurido, sem razões para sorrir


Sempre fui considerado um sujeito muito racional e realista, afastado quer dos otimismos que não cuidam se os recursos ao dispor são adequados ou dos pessimismos ‘suicidas’ daqueles que nunca se animam seja com o que for.

Porém, a verdade é outra: foi a minha profunda emocionalidade e a tendência para alternar humores que me conduziram a perscrutar com espírito crítico a realidade que nos rodeia, a olhar para além do opaco, a afastar a cortina que geralmente encobre a realidade das coisas e das pessoas para desvendar o que é que a cortina pretende que não se veja.

No entanto, nada disso tem sido suficiente para controlar realmente as minhas paixões por certas ideias, por certas pessoas, por certas coisas. E existe na minha vida uma paixão com a qual nunca me consegui entender bem: a que nutro pelo Botafogo de Futebol e Regatas.

Por mais voltas que desse para evitar desgostos desportivos, acabo sempre por ceder aos humores de uma grande paixão e retornar ao nosso Botafogo nas derrotas e nos obstáculos por vezes descomunais que tem enfrentado desde 1894, quando se fundou o Clube de Regatas Botafogo sobre a morte de Luiz Caldas, vitimado na prisão por questões políticas, ou quando os garotos do Largo dos Leões abandonaram drasticamente o campeonato carioca em defesa de um deles, ou quando o Botafogo de Futebol e Regatas acabou por nascer de um atleta morto em plena quadra de basquetebol.

Até mesmo quando sei que “o Botafogo tem a vocação do erro”, nas palavras de Augusto Frederico Schmidt, considero queaté certo ponto é uma espécie de DNA que acompanha todos aqueles que ousam arriscar, perder e tornar a ganhar. Isso não me importou muito ao longo da minha paixão clubista, porque em todas ou quase todas as coisas da vida escolho sempre as minorias: a minha mais profunda opção política é ‘minoríssima’; a minha opção religiosa é ‘minoríssima’; o clube da minha vida é ‘minoríssimo’… Na verdade, escolho sempre o lado mais difícil das coisas porque tenho a certeza que entre as minorias pouco se aprende e pouco se conhece sobre o latejar mais profundo da essência humana.

Escolho sempre o lado mais difícil da vida, porque renascer das cinzas é próprio de uma humanidade que mergulha na profundidade do drama, da emoção, da paixão, da comunhão com um coletivo que pulsa mais forte quando as adversidades teimam em nos acompanhar. Esse renascer é algo tão absolutamente profundo que nem sei como expressá-lo, mas tenho a certeza que o nosso Botafogo já renasceu das cinzas várias vezes, o que me deveria tranquilizar sobre o seu futuro.

Porém, não estou tranquilo. E o que é muito pior ainda: sinto as forças vitais da minha paixão clubista exauridas numa voracidade de irresponsabilidades e incompetências de uma diretoria capitaneada por Maurício Assumpção e apontada diretamente ao abismo.

Nascemos em 1894 paradoxalmente a renascer das cinzas de um desporto náutico que caminhava para o fracasso; reerguemo-nos em 1912, mas atravessámos desertos entre 1912 e 1930, entre 1935 e 1948, entre 1949 e 1957; atravessámos uma das mais dolorosas rotas quando uma diretoria absolutamente irresponsável, incompetente e, quiçá, desonesta, conseguiu, em pouquíssimo tempo, destruir o que uma escol de botafoguenses iniciou na década de 1950, ao ponto de O Globo titular, em 1968, que o Botafogo estava “farto de ganhar”. No futebol, no remo, na natação, no voleibol, no pólo aquático, no basquetebol, até no aeromodelismo, no xadrez e no autobol fomos campeões de tudo – e em 1962 obtivemos 80 títulos de campeão e 40 vice-campeonatos. Charles Borer destruiu isso num lapso ínfimo de tempo, legando-nos a dolorosa rota de renascimento das cinzas ao longo de 20 anos. Renascemos. Renascemos com a luta de Carlito Rocha e de outros, e com a presidência de Emil Pinheiro, para logo ficarmos sob a alçada de Montenegro, Rolim e Palmeiro, que culminou com a necessidade de um ‘tapetão’ em 1999 para não descermos de divisão e que acabámos ainda assim por conhecer esse ‘inferno’ em 2002 – irreversivelmente por virtude de diretorias irresponsáveis e incompetentes.

Não havia dinheiro para pagar a luz. Os nossos troféus estavam ao abandonado num armazém e num baldio. De tal modo que o cupim destruiu a base da taça do campeonato carioca de 1989, tendo que ser reconstruída.

Coube a Bebeto de Freitas essa corajosa tarefa de reerguer o clube. Paulatinamente o clube reergueu-se. Montaram-se bons times de futebol, as modalidades amadoras tomaram um novo fôlego, as finanças foram saneadas, o Engenhão foi ganho. Porém, uma espécie de Charles Borer do século XXI conseguiu, em pouco tempo, destruir tudo ou quase tudo aquilo que com muito suor e muitas lágrimas foi reconstruído depois de 2003.

O que nunca nenhum irresponsável e incompetente conseguiu obter de mim em toda a minha vida, foi conseguido por Maurício Assumpção capitaneando o nosso (ex)Glorioso clube: anular a minha força vital, erodir a minha vontade, exaurir a minha esperança, estuprar o meu sorriso clubista.

O Gigante que nós ressuscitamos durante a Taça Libertadores foi transformado num anão pela irresponsabilidade e incompetência que, por vezes, ganham aos melhores.

Ganham até mesmo à fantástica torcida do Botafogo, cuja maioria dos seus membros merecia muito mais do que um presidente que 18 anos depois da nossa última presença na Taça Libertadores da América, conseguiu até hoje permanecer calado sobre a escandalosa jogada do Engenhão, fazer Seedorf ir-se embora farto de tanta incompetência, empurrar Rafael Marques para a rua contra a vontade do próprio, não contratar nenhum reforço capaz, tirar o Botafogo do Ato Trabalhista por alegada evasão fiscal, enfiar o Botafogo num buraco financeiro descomunal, contratar atletas para não jogarem (o irmão do funcionário Souto, o genro de Húngaro, Ronny, Mario Risso…) e que, finalmente, a fim de dar a cajadada final em qualquer esperança por mais remota que fosse, promoveu a técnico para a Libertadores um homem que tinha como experiência e como saberes a condução de um clube da 4ª divisão portuguesa e os atletas da base de futebol do Botafogo.

Que saudades que eu tenho de Paulo Azeredo, de João Saldanha, de Renato Estelita e… de Otacílio Batista do Nascimento à frente da combativa torcida organizada do Botafogo!

4 comentários:

marlon disse...

Prezado Rui,
acho que seu estado de espírito é um pouco geral. A passagem do ano passado para este, com todas as lambanças patrocinadas por nosso presidente e que desembocaram na campanha da libertadores, telexfree e salários atrasados, foi um golpe muito duro em todos nós. Acompanho-lhe diariamente aqui no blog e sempre encontro em suas reflexões um pouco de ar diante de tudo isso. Precisamos continuar contando contigo.
grande abraço, Marlon

Ruy Moura disse...

Em suma e traduzindo as suas palavras, Marlon: Assumpção intentou destruir a alma botafoguense com a sua irresponsabilidade e incompetência, e impôs-nos não o branco, não o preto, mas o cinzentismo da vulgaridade.

O próximo presidente deveria abrir uma auditoria em todas as frentes à (con)gestão de Assumpção e responsabilizá-lo criminalmente se houver lugar a isso. O presidente do Sporting Clube de Portugal fez isso e vai agir de acordo com os resultados da auditoria.

Quanto ao Botafogo continuar contando comigo, será para sempre! Mas não com este presidente nem com a camarilha liderada por Montenegro.

Ou o Botafogo se livra deles ou eles acabarão por destruir o Botafogo, exatamente como se destruiu o América.

Estarei sempre – até que a vida me leve – nesta tribuna em defesa do Botafogo, mas não me peçam para assistir a jogos de futebol como os que foram patrocinados pelas maléficas mãos de Assumpção na Libertadores e no Carioca.

O Botafogo é, para mim, muito mais que o futebol: é um clube em toda a aceção da palavra, e não apenas um time de futebol.

Temos muito por onde explorar, apesar de, claramente, à exceção do remo, as nossas modalidades estarem a cair a pique. Mas ainda há o Botafogo social: o Botafogo social que sempre nos acompanhou desde 1904 até à emergência do energúmeno Charles Borer.

Mas... às vezes canso-me de viver do passado e de sentir tão poucas alegrias nas modalidades do presente, além de não ver um futuro risonho quando a Globo concretizar a sua estúpida e destruidora aposta na 'espanholização' – e ninguém a contrariar. Quando os clubes acovardados derem por isso, só existirão dois clubes brasileiros. Aí o futebol de clubes acabará definitivamente na (ex)pátria do futebol da 2ª metade do século XX.

E há uma coisa que também me preocupa: os yes-man, os puxa-sacos, os submissos e os acomodados que também existem na nossa torcida. Na torcida da década de 1960 – quando me apaixonei pelo clube - TOOS os torcedores exigiam do Botafogo o limite das suas forças. Menos do que o limite ninguém aceitava, e hoje lê-se, lamentavelmente, o que se lê nas redes sociais proveniente da submissão e do comodismo que nunca beneficiou a performance seja de quem for. A critica construtiva e permanente, apoiando e desaprovando sempre que necessário, é essencial para se criar um grande clube. Veja-se como a torcida do Barcelona começou a exigir ao próprio endeusado Messi que acabasse com o corpo mole que tem feito porque quer preservar-se para a Copa do Mundo.

O Porto, tricampeão português, reagiu do mesmo modo a esta época desastrosa do clube devido a erros crassos da direção. Os grandes clubes - não necessariamente os 'maioritários', mas os ‘melhores’ – têm torcidas exigentes. A exigência puxa a exigência, e o resultado é a competência e a conquista.

Abraços Gloriosos.

Gil disse...

Rui,

O teu espírito em relação ao atual Botafogo é o espírito de muitos. Ontem, como muitos que vi, tive vontade de sair ao final do primeiro tempo. Desisti devido a esse amor incondicional, porém, me comprometi esperar mais 15 minutos, se nada mudasse sairia.

A incompetência é tanta e em todos níveis que até a nossa promessa na natação, Matheus Santana, foi para outro clube.

Pobre do atual Botafogo!
Pobre de nós, Torcedores!

Abs e Sds, Botafoguenses!!!

Ruy Moura disse...

Gil, a tão badalada aposta nas modalidades ditas olímpicas foi uma enorme fraude de Assumpção. Começou logo pelo coordenador-geral dos desportos que prometeu como prioridade formar uma equipa de atletismo. Conheceste algum atleta nessa modalidade? Esse tal de Luz (mão me recordo do resto do nome) acabou por sair SEM FAZER NADA!

As modalidades cairam a pique. A natação deixou de estar entre os primeiros do Brasil, o Pólo Aquático já não ganha um título há anos, o Basquetebol e o Voleibol passaram estes anos todos sem time principal, somente o remo foi realmente muito impulsionado, mas devo referir que o Assumpção ganhou uma flotilha nova em 2010 ou 2011 encomendada por... Bebeto de Freitas! O Murad e o Xoxô é que se dedicaram deveras ao remo e fizeram dele o melhor remo do brasil.

Apostaram em quê? No futebol soçaite, que chegou a ganhar um título mundial, mas caiu nos dois anos subsequentes; o futsal teve algum sucesso por virtude da utilização de jogadores da Casa de España; o mais foram apostas de brincadeira. Eu cito-as:

Temos um garoto no taekwondo, ninguém mais; temos uma equipa no judô que fica entre o 6º e o 8º lugar; inventamos o Poker-Pró; apostamos sem nenhum sucesso no futebol americano de praia, no futebol americano de grama e no futebol de areia.

E no futebol os desmanches e os desmandos batem recordes.

Esse Assumpção conseguiu, paulatinamente, instalar a tristeza na torcida; a resposta de Assumpção à torcida foi criar todas as más condições possíveis para fazermos a péssima figura que fizemos no estadual e na Libertadores: nenhum planejamento; nenhum reforço decente; nenhum treinador capaz; desmando da comissão técnica que levou o time à insubordinação total em campo, sem estratégia, sem tática, sem direção.

Assumpção deveria pagar por todo o mal que nos fez em seis anos, deixando o clube financeiramente falido, se não mesmo tecnicamente falido. Os próximos meses o dirão.

Abraços Gloriosos.

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