
[Editor do Mundo Botafogo abrindo uma nova etiqueta designada por ‘paradoxos’: aprecio um botafoguense falando do Fluminense usando a razão e a sua profunda paixão pelo futebol; amanhã farei o contrário – um fluminense falando do Botafogo]
por Armando Nogueira
"O Fluminense cai pra Terceira Divisão. Dito assim, em breve oração, soa como um fiapo de conversa. Papo de segunda-feira chuvosa. Pra chatear tricolor, os irônicos dizem que, felizmente, não existe a Quarta Divisão.
Mal se dão conta de que o desterro de um grande clube não é um martírio solitário. Por tabela, atinge todo mundo. O Flamengo nunca seria o mesmo se não tivesse a fustigá-lo o tenaz fervor do Fluminense. Os dois criaram, juntos, um dos maiores mitos do futebol brasileiro que é o Fla-Flu. Nelson Rodrigues dizia que há um parentesco óbvio entre o Fla e o Flu. Seriam os irmãos Karamazov do futebol. Amor e ódio. Eu, por mim, vivi uma juventude atormentada pelo "frisson" dos jogos entre Botafogo e Fluminense. Era o chamado "clássico vovô". A manchete dos jornais exaltava cada batalha entre os dois mais antigos rivais do futebol carioca. O Fluminense era um pesadelo na vida dos outros times. Tinha mais títulos. Tinha mais nobreza. Os outros tinham escudo. O Fluminense tinha brasão.
Por favor, não queiram ver no flagelo do Fluminense apenas um time de futebol agonizando às portas do inferno. Estamos vendo consumir-se nas chamas de um longo martírio muito mais que uma simples equipe. São centenas de troféus. São vitrais de três cores mágicas a filtrar a luz de tantas glórias. O Fluminense é um hino. É um sonho de menino.
Mário Lago diz que há muito tempo o Fluminense saiu de suas cogitações existenciais. Do alto de seus oitenta anos, tem todo o direito de ignorar o presente do clube. O tempo passado enche de glórias seu bravo coração tricolor. O Carlinhos é que não tem. O Carlinhos, um garoto de 14 anos, ainda tem muito que palpitar, coração na mão, por seu clube tantas vezes campeão. O Fluminense precisa de seu amor. Mesmo que, agora, Carlinhos não tenha coragem de aparecer no colégio vestido com a camisa do Fluminense.
Bem que ele podia mudar de colégio. Chegaria lá, cara nova, metido no uniforme do Vasco da Gama, que é o time da moda no Rio. Carlinhos seria até festejado.
Mário Filho dizia que é mais fácil mudar de mulher que mudar de clube. Pois é esse o caso do Carlinhos. Ele não tem duas caras. Nasceu Fluminense e Fluminense há de morrer.
Pois é pensando no Carlinhos que escrevo sobre o drama do clube tricolor.
Se o Fluminense acabasse, de vez, o mundo ficaria sem graça pro Carlinhos.
Ele não pode, nem quer virar Flamengo, nem Botafogo, nem Vasco. O sentimento clubístico é mais forte que o sentimento patriótico. A criança descobre o clube do coração antes de descobrir a própria pátria. Carlinhos aprendeu a cantar o hino do Fluminense muito antes de aprender a cantar o Hino Nacional. Antes de ouvir falar em Brasil, Carlinhos já ouvia o pai repetir, dia e noite, debruçado no berço: Flu-mi-nen-se! Essa é a voz que lateja nas entranhas de Carlinhos.
O Fluminense é hoje uma paixão golpeada no coração de Carlinhos.
por Armando Nogueira
"O Fluminense cai pra Terceira Divisão. Dito assim, em breve oração, soa como um fiapo de conversa. Papo de segunda-feira chuvosa. Pra chatear tricolor, os irônicos dizem que, felizmente, não existe a Quarta Divisão.
Mal se dão conta de que o desterro de um grande clube não é um martírio solitário. Por tabela, atinge todo mundo. O Flamengo nunca seria o mesmo se não tivesse a fustigá-lo o tenaz fervor do Fluminense. Os dois criaram, juntos, um dos maiores mitos do futebol brasileiro que é o Fla-Flu. Nelson Rodrigues dizia que há um parentesco óbvio entre o Fla e o Flu. Seriam os irmãos Karamazov do futebol. Amor e ódio. Eu, por mim, vivi uma juventude atormentada pelo "frisson" dos jogos entre Botafogo e Fluminense. Era o chamado "clássico vovô". A manchete dos jornais exaltava cada batalha entre os dois mais antigos rivais do futebol carioca. O Fluminense era um pesadelo na vida dos outros times. Tinha mais títulos. Tinha mais nobreza. Os outros tinham escudo. O Fluminense tinha brasão.
Por favor, não queiram ver no flagelo do Fluminense apenas um time de futebol agonizando às portas do inferno. Estamos vendo consumir-se nas chamas de um longo martírio muito mais que uma simples equipe. São centenas de troféus. São vitrais de três cores mágicas a filtrar a luz de tantas glórias. O Fluminense é um hino. É um sonho de menino.
Mário Lago diz que há muito tempo o Fluminense saiu de suas cogitações existenciais. Do alto de seus oitenta anos, tem todo o direito de ignorar o presente do clube. O tempo passado enche de glórias seu bravo coração tricolor. O Carlinhos é que não tem. O Carlinhos, um garoto de 14 anos, ainda tem muito que palpitar, coração na mão, por seu clube tantas vezes campeão. O Fluminense precisa de seu amor. Mesmo que, agora, Carlinhos não tenha coragem de aparecer no colégio vestido com a camisa do Fluminense.
Bem que ele podia mudar de colégio. Chegaria lá, cara nova, metido no uniforme do Vasco da Gama, que é o time da moda no Rio. Carlinhos seria até festejado.
Mário Filho dizia que é mais fácil mudar de mulher que mudar de clube. Pois é esse o caso do Carlinhos. Ele não tem duas caras. Nasceu Fluminense e Fluminense há de morrer.
Pois é pensando no Carlinhos que escrevo sobre o drama do clube tricolor.
Se o Fluminense acabasse, de vez, o mundo ficaria sem graça pro Carlinhos.
Ele não pode, nem quer virar Flamengo, nem Botafogo, nem Vasco. O sentimento clubístico é mais forte que o sentimento patriótico. A criança descobre o clube do coração antes de descobrir a própria pátria. Carlinhos aprendeu a cantar o hino do Fluminense muito antes de aprender a cantar o Hino Nacional. Antes de ouvir falar em Brasil, Carlinhos já ouvia o pai repetir, dia e noite, debruçado no berço: Flu-mi-nen-se! Essa é a voz que lateja nas entranhas de Carlinhos.
O Fluminense é hoje uma paixão golpeada no coração de Carlinhos.
2 comentários:
Caro Rui. Não gosto de discordar de textos tão brilhante como este.Armando deixou um vazio enorme quando por doença se afastou da TV. Armando não morreu agora. Armando acabou de se transformar de E= mc2 para um gás que brilhará junto com outras estrelas.Estrela ao lado de estrela. Louvo o afago feito por Armando no texto a Carlinhos. Que bela criança mal direcionada. O pai que verbalizava Flu-mi-nen-se ao berço tinha todo este direito. Mas, perdoe-me Armando, bem que a mãe poderia verbalizar ternamente ao ouivdo de Carlinhos o seguinte : BO-ta-fo-go. Mães e pais são eternos mas coração de mãe costuma prevalescer na cultura ocidental. Desculpem-me Rui e Armando.Loris
Por mim, não tem importância discordar, Loris; está no seu direito absoluto. Mas a nova etiqueta chama-se... 'paradoxos' !!!
Abraços Gloriosos!
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