domingo, 24 de maio de 2015

Mothel encontra Robertinho


por PAULO MARCELO SAMPAIO
Arquiba Botafogo, 05.02.2015

“Gente, gente, preparem aquela mesa forrada com feltro verde. Daqui a pouco chega uma visita”, avisou o sempre bem informado Roberto Almeida. Informação era com ele mesmo. Principalmente aos domingos quando, prancheta escolar na mão, partia para a central técnica da TVE e coordenava a chegada das imagens com gols de todo o Brasil. Fazia isso com eficiência, exceto em dias de derrota do Botafogo. Aí Robertinho se alterava. Fechava a cara e só abria a boca quando era provocado. Principalmente pelo Sérgio Du Bocage, que sabia explorar o ponto fraco do colega.

Carlito Rocha estranhou a movimentação. Católico praticante e devotado quis saber o que armavam. Foi logo perguntando a Roberto Porto, a quem devotava um carinho grande. Fora Robertão, lá nos idos 70, que o recebera na portaria de O Globo. O presidente dos presidentes tinha sido barrado por algum Zé-ninguém, orientado certamente por um manda-chuva da redação. Já na época, Carlito lutava para voltarmos para rua General Severiano. “Senhor Roberto, o que está acontecendo por aqui?”, quis saber. Robertão ainda tentou esconder o copo com uma dose caubói. “Seu Carlito, é que o Mothel Santoro, aquele do megafone, tá chegando daqui a pouco. Vamos saudá-lo com uma rodadinha de pôquer”, disse o jornalista. Todos ali respeitavam Carlito Rocha, uma espécie de síndico. Sabiam que ele não gostava de jogatina. “Pra perder dinheiro nas roda de jogo, é melhor doá-lo ao Botafogo”, costumava dizer. Seu Carlito fez um muxoxo. Mas a batidinha no ombro de Robertão indicava a autorização para o carteado.

“O homem liberou”, foi logo avisando Oldemário Touguinhó a Robertinho Almeida. E tratou de cuidar da feijoada para a chegada de Mothel. Ex-feirante, tinha experiência em escolher ingredientes. Foi logo chamando Waltencir, homem que gostava de rodas de samba. “Vou ali falar com o Roberto Ribeiro”, avisou. Sandro Moreyra, que ouvia tudo calado, sugeriu chamar Vinicius de Moraes. “Bossa-nova e samba têm tudo a ver. E, afinal de contas, Vinicius era o branco mais preto do Brasil”. Em poucos minutos, chega o Poetinha, ao lado de Lúcio Rangel. “Meus amiguinhos – disse Vinicius –, quando soube que era festa prum botafoguense, trouxe esse cara aqui, que inventou minha dupla com o Tom. Mas isso não foi o melhor que fez, né, Lucinho?” “Não gosto de futebol, gosto é do Botafogo”. João Saldanha vinha passando e, como seu Carlito, fez um muxoxo. E comentou. “Nunca vibrei com um gol do Botafogo”. Aloísio Birruma, o roupeiro supersticioso, riu baixinho. E cochichou com Armando Nogueira. “Como é que se chama quem não acredita em Deus?” “Ateu”, respondeu Arnaldo. “Pois é, já se viu rezar? Pois ‘seu’ João se ajoelhou no vestiário, sem ninguém por perto. Só que o papaizinho aqui viu o beijo que ele deu na imagem de Nossa Senhora da Conceição. Foi em 57.”

“A gente faz cada loucura pelo Botafogo, né?”, observou Robertinho. “Um dia de 1996 descobriram, num jogo contra o porto que comemorava o Campeonato Brasileiro do ano anterior, que tinham esquecido o taça na sede. Lá fui eu com meu Fusquinha azul pegá-la. E chegamos no Maracanã, o troféu e eu, sãos e salvos”. Um garoto lourinho assistia a tudo com os olhos arregalados. Era Oliver Caratsch, um brasileirinho com pinta de suíço. “Mas meu irmão Marco tava me representando lá em baixo, tanto em 1995 como em 1989″. Coincidentemente, Mothel abriu as portas do céu, enrolado com a bandeira do Botafogo que ele levou pra sepultura. “Saí lá de baixo dizendo que tava rindo, mas não tava achando graça”. “Ô garoto – Mothel chamou Oliver – você precisa ver a carreata que organizei da casa da minha mãe – a lindíssima atriz Fada Santoro, que contracenou com o galã Cyll Farney – do Leme ao Leblon. O Rafael Casé, um dos nossos melhores historiadores, ficou impressionado com a quantidade de adesivos que tinha nos vidros do meu carro”. De repente Mothel é interrompido, abraçado por Tarzan e Russão. Robertinho Almeida, com a indefectível prancheta, pega os três e avisa. “Vamos esquecer essa história de pôquer, Mothel. O Paulo Azeredo quer saber notícias do seu neto mais abusado e o mais querido, o Cacá”. Com tão pouco tempo no céu e já com tantas histórias ouvidas, ele estava com saudades da terra. Mas aquela república botafoguense era sua nova casa. Sem sofrimentos.

Sem comentários:

Botafogo 1x0 LDU: do gol relâmpago ao desempenho sombrio

Crédito: Vitor Silva / Botafogo. por RUY MOURA | Editor do Mundo Botafogo O Botafogo fez uma entrada fulminante contra a LDU e aos 12”, ...