
O artigo Campeão de futebol da Copa Conmebol 1993 narra pormenorizadamente o acontecimento e fornece os principais elementos sobre a conquista.
A alegria foi bem visível nos rostos dos valorosos jogadores que se superaram a si próprios numa final sofrida até ao último instante. O Peñarol empatou o jogo em 2x2 mesmo no final da partida e o título foi resolvido na marca da grande penalidade, favorecendo o Botafogo por 3x1.

Fonte: Jornal dos Sports
Mas hoje também é dia de imortalização dos pés de Mané Garrincha na Calçada da Fama do Maracanã. A placa com os pés de Garrincha será, finalmente, inaugurada.
O seu nome já constava na estrutura, mas como a célebre calçada foi inaugurada dezassete anos após a sua morte, Garrincha não pôde eternizar as marcas dos seus pés que tanto desconcertaram os adversários nos gramados de todo o mundo.
Só é possível realizar esta consagração graças à doação de Caio Mourão, filho do de Diogo Mourão, torcedor botafoguense fanático. Diogo, já falecido, havia conseguido as placas que ficavam expostas no restaurante carioca Pizzaiolo e guardou-as quando o estabelecimento foi demolido.
O artigo Mendonça, o homem do drible ‘baila comigo’ cita os imortalizados na Calçada da Fama do Maracanã, alguns dos quais geniais botafoguenses a que se junta o símbolo máximo da ‘alegria do povo’.
Mais do que qualquer um, Mané Garrincha merecia esta homenagem e o Botafogo de Futebol e Regatas torna-se ainda mais glorioso. Na verdade, o título da Copa Conmebol foi importante, mas o Botafogo internacional, o Botafogo famoso além-fronteiras, o Botafogo que foi escolhido pelo FIFA como um dos 12 clubes mais importantes do século XX, foi o Botafogo imortalizado por Mané Garrincha.
O artigo Futebol botafoguense: no topo do mundo merece ser revisitado à luz deste notabilíssimo jogador, o qual permitiu ao Botafogo ser o único clube brasileiro que tem uma camisa imortalizada no Museu Internacional do Futebol – a gloriosa camisa 7, usada por Mané Garrincha.

Fonte: http://usr.solar.com.br/~juliocba/
Garrincha era a quintessência do futebol, o homem capaz de, na final do campeonato de 1962 contra o Flamengo, estar quase dois minutos com a posse da bola no espaço mínimo de um metro quadrado, cercado por Carlinhos, Jordan e Gérson.
Garrincha, mais do qualquer outro jogador do planeta, conseguia suster a respiração das torcidas e fazer explodir de alegria os corações. Numa excursão na América latina, Garrincha deu um ‘baile’ em Gambetta, um grande lateral argentino conhecido como ‘El Campin’. Numa disputa de bola junto à linha lateral, Garrincha driblou seguidamente Gambetta. Este caía, levantava-se e caía de novo a cada drible. Seria driblado até morrer, mas não desistiria. Em pleno combate, os dois saíram sem querer pela lateral e os dribles continuaram no gramado ao lado do campo. O juiz e o bandeirinha podem ter visto, mas não ousaram interromper a beleza do lance. A jogada só foi paralisada pelo apito do juiz quando os dois já estavam no asfalto em volta do campo – estava ali a quintessência do futebol.
Mas porquê continuar a escrever sobre Garrincha, apesar de o ter visto jogar muitas vezes na minha juventude, se a voz de outros mais abalizados substituem bem a minha?...

Fonte: http://www.botafogoweb.hpg.com.br/
Eis algumas dessas vozes:
«Estávamos em pânico, quando pensávamos no que Garrincha podia fazer. Não existia marcador no mundo capaz de neutralizá-lo” – Nils Liedholm, médio da Suécia em 1958.
“Em cinquenta anos de futebol jamais apareceu um jogador como Garrincha” – Daily Mirror, jornal inglês.
"Garrincha, de que planeta vienes?" – Jornal El Mercurio, de Santiago, na Copa de 1962.
“Garrincha é um verdadeiro assombro. Não pode ser produto de nenhuma escola de futebol. Nunca vi um jogador igual” – Gavril Katchalin, técnico soviético em 1962.
“Eu fazia o lançamento e tinha vontade de rir. O Mané ia passando e deixando os homens de bunda no chão. Em fila, disciplinadamente” – Didi, sobre o Mundial de 1958.
“Eles começaram marcando no mano a mano. Tsarev contra Garrincha. De repente, passaram a amontoar vários outros naquele lado esquerdo do campo. Era hilariante o desmanche que Mané fazia por ali." – Nílton Santos, na partida contra a URSS em 1958.
“Ele deu-me um baile. Pedi que o contratassem e o pusessem entre os titulares. Eu não queria enfrentá-lo de novo” – Nílton Santos, sobre os testes de Garrincha no Botafogo.
“A um passe de Didi, Garrincha avança/Colado o couro aos pés, o olhar atento/Dribla um, dribla dois, depois descansa/Como a medir o lance do momento./Vem-lhe o pressentimento; ele se lança/Mais rápido que o próprio pensamento” – excerto do poema de Vinícius de Moraes, «O Anjo das Pernas Tortas»
“Para Mané Garrincha, o espaço de um pequeno guardanapo era um enorme latifúndio” – Armando Nogueira, jornalista e escritor.
“Se há um deus que regula o futebol, esse deus é sobretudo irónico e farsante, e Garrincha foi um de seus delegados incumbidos de zombar de tudo e de todos, nos estádios” – Carlos Drummond de Andrade, poeta.

E Mané era tão simples e brincalhão. Uma das suas maiores graças ocorreu na final da Copa do Mundo de 1958. Nílton Santos abraçou Garrincha, o seu companheiro de Botafogo, dizendo entusiasmado: “– Somos campeões do mundo, Mané, campeões do mundo!” O craque, mais ou menos alheio a toda aquela comemoração, fitou o colega e disse num tom irónico: “– Já!? Mas que campeonatinho vagabundo é esse, que não tem nem segundo turno!?”
Depois de arrumar as chuteiras e num dia de homenagem à sua pessoa no Maracanã, Garrincha foi para a tribuna com Juca Kkfouri assistir aos jogos da rodada dupla do campeonato carioca: o Vasco da Gama contra o Madureira e a seguir o Flamengo contra o Botafogo de Jairzinho, Roberto Miranda e Paulo César, entre outros.
Quando a equipe botafoguense surgiu no túnel, os olhos de Mané marejaram, ficando com um brilho diferente. Depois de alguns segundos de silêncio, ele disse algo surpreendente:
“– Como um simples torcedor é a primeira vez que vejo o Botafogo entrar em campo. Olha que joguei tantos anos por essa agremiação, mas estou com o coração apertado por causa desse momento”.
Juca argumentou que era a mesma emoção que sentiu a torcida do Vasco, do Flamengo, e a que sente a do Fluminense ou qualquer torcida do mundo quando seu time entra em campo. Então, com aquela inatingível genialidade, naquele modelo provinciano de expressar suas emoções, explicou:
“– Juca! O Botafogo é diferente. Quando ele entra em campo, entra junto uma história de glórias. Eu sei que a torcida de Vasco, Flamengo, Fluminense, Bangu, América ou qualquer outra tem orgulho de seu time, mas a torcida do Botafogo tem orgulho das realizações de um time que mudou o conceito do futebol brasileiro. Nenhum time no mundo teve no mesmo período craques como Nílton Santos, Didi, Amarildo, Zagallo, Paulo Valentim, Pampolini, Adalberto, Quarentinha...”
E continuou a falar:
“– Nós fizemos história para todas as torcidas. Preste atenção: quando Botafogo entra em campo parece que ao lado da camisa 3 entra um Nílton Santos; da camisa 7.... Ao lado da camisa 8, um mestre Didi; ao lado da 9, Quarentinha; da 10, Amarildo: ao lado da 11, Zagallo. Não importa a época. Daqui a alguns anos, com certeza, não estarei vivo. Mas o Botafogo continuará sendo respeitado por suas glórias para o futebol brasileiro na década de 60. Se eu fosse um daqueles fotógrafos no campo, pediria para o time do Botafogo posasse de costas, porque mais importante do que os atletas que se sentem honrados ao vestir aquela camisa listrada está o número que levam às costas.”
“– Todos os grandes clubes tiveram craques que brilharam e levaram seus clubes a grandes títulos. Mas passaram e virão sempre outros. Nós não passamos, nós eternizamos o Botafogo. Por isso, quem entra em campo não é um time, é uma glória”.
Foi gol do Botafogo no Maracanã... A ‘Alegria do Povo’ não vibrou. Não precisava.