sábado, 20 de abril de 2013

Obrigado, Seedorf


por Fernando Calazans

Mesmo conhecendo bem, como todo o mundo, a qualidade do futebol de Seedorf, vi com certo ceticismo a sua contratação pelo Botafogo, por causa dos 37 anos que ele acabou de fazer agora, no primeiro dia do mês. Só pode ter sido preconceito contra a idade. Ainda bem que minha desconfiança não se justificou. Pelo contrário. Suas atuações fizeram crescer minha admiração por este tipo de futebol cerebral.

A chegada de Seedorf está fazendo bem não apenas ao Botafogo, como também ao futebol brasileiro e, mais até do que isto, está fazendo bem à História do futebol brasileiro. Duvidam? Pois ele agora acabou de ressuscitar no lapso de um segundo, com um drible de corpo, a memória de Garrincha. Foi nos 4 a 1 do Botafogo contra o Nova Iguaçu, antes do centro dele mesmo que originou o bonito gol de cabeça de Lodeiro. Foi curioso, porque, sem nenhuma combinação, diversos sectores da mídia associaram o drible de Seedorf aos tantos dribles de Garrincha. E de fato o gesto do holandês deixou o marcador completamente sem acção, perdido no campo, como ficavam os marcadores do brasileiro.

Foi bom porque – por incrível e por cruel que pareça – Garrincha estava meio esquecido, como nós costumamos deixá-lo de vez em quando. O que também é curioso, tristemente curioso. As gerações jovens costumam, sempre costumaram, escolher os melhores jogadores do mundo apenas entre aqueles que viram jogar, deixando a História para trás, condenada ao esquecimento. Os jovens de hoje só abrem exceção para Pelé, imagino que por ser ele considerado – com justiça, por sinal – o maior jogador do mundo. Escalam o Pelé no meio de cinco ou seis contemporâneos, como que dando uma colher de chá ao passado, mas nem se recordam mais – nem mesmo os chamados ‘especialistas’ da jovem e grande mídia – do nome de Mané Garrincha.

A diferença pode se dever também ao fato de Garrincha nos ter deixado ainda cedo, aos 49 anos, enquanto Pelé permanece vivo entre nós e no mundo inteiro, no frescor dos seus 72 anos. Mas, ainda que este seja o motivo, trata-se de uma injustiça. Assim, quero deixar aqui apenas um lembrete. Minha gente, jovens e velhos que me lêem: Garrincha é imortal. Simplesmente isso.

Pois f0i preciso que Seedorf aportasse no Botafogo e no Brasil para que Garrincha voltasse às primeiras páginas; às manchetes, à vibração electrizante do rádio e às imagens puras da televisão. Para que voltasse à nossa memória.

E foi preciso que Seedorf executasse o drible do último domingo para que uma TV holandesa pedisse ao técnico Oswaldo de Oliverira que fizesse uma comparação entre o craque actual e o craque se sempre do mesmo Botafogo. Oswaldo fez duas observações: a primeira, que Garrincha foi, para ele, o segundo melhor jogador de todos os tempos, atrás exactamente do Pelé eterno; e a segunda, que o estilo de um, Seedorf, não tem nada a ver com o estilo do outro, Mané.

É verdade: nada a ver. Embora com claríssimas qualidades individuais, Seedorf se distingue pela participação colectiva, pela arrumação que dá a cada setor do time, com sua movimentação constante em todos os cantos. É o cérebro. Garrincha foi o instinto, a improvisação, o talento genial.

Eu, particularmente, faria assim a comparação: Seedorf é fantástico pela capacidade de organizar seu time; Garrincha foi mais fantástico ainda pela capacidade de desorganizar o time dos outros. Quer dizer: neste sentido, são até antípodas.

O que torna mais deliciosa ainda a oportunidade que ele, Seedorf, nos deu de recordar o Mané. Dois dribles secos, pra lá e pra cá, sem tocar na bola, deixando o rival cambaleante, querendo saber onde estava. Só soube depois da conclusão da jogada, quando a bola já estava dentro de sua rede.

Por isso, no meio da alegria que tomou conta dos torcedores botafoguenses, no meio dos elogios dedicados a ele pela jovem e pela velha crítica, no meio da admiração dos companheiros de time e da perplexidade dos adversários – enfim, pelo ensejo que deu ao futebol brasileiro de voltar a reverenciar a figura de Garrincha, quero deixar aqui registrado um sentimento próprio, muito particular: Obrigado, Seedorf.

2 comentários:

Gil disse...

Rui,

E o melhor de tudo isso é que os dois jogaram e jogam no nosso amado e Glorioso Botafogo!

Abs e Sds, Botafoguenses!!!

Ruy Moura disse...

Sem dúvida, Gil. Assim como Brunos, Adrianos, Vagner Loves e Souzas só podiam jogar onde jogaram. A génese e a cultura de cada clube é o que é...

Abraços Gloriosos!

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