quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Do além, assina Heleno

* por HELENO DE FREITAS
31.01.2016

[Nota preliminar do Mundo Botafogo: Trata-se de crônicas escritas pelo meu amigo Paulo Marcelo Sampaio, publicadas no seu blogue Arquibabotafogo, em nome de grandes figuras do Glorioso.]

Tudo lembrava o ano em que vivi por lá. São Januário, com o busto do grande navegador, o vice-almirante; com os azulejos antigos nos banheiros; com o escudo talhado no cimento perto das tribunas; tudo parecia um retrato art-decô. Quem tem a paciência de ler essas linhas deve estar me achando um saudosista. Não, caros, não há a menor chance disso. Mas hoje vivi um dia diferente.

Conheço o estádio do vasco desde os tempos em jogava pelos segundos quadros do Botafogo. Naquela época meu sonho era tabelar com Carvalho Leite. Mas ocupávamos o mesmo espaço. Só virei titular quando ele resolver se dedicar definitivamente à medicina. Tive, no entanto, a honra de substituí-lo na estréia do campeonato de 1940, contra o são cristóvão, Fiz dois gols. Isso é passado. Às favas com ele.

O que eu não esperava num sábado de sol, aqui de cima, era ver o que vi. Um torcedor vestia uma camisa diferente. No lugar do escudo, apenas uma estrela branca, costurada com fios dourados. No lado oposto, uma assinatura que não descobri de quem era. Quando o rapaz, meio manco, se dirigia às sociais, vi meu nome costurado. Sorri. Como ser lembrado mais de 56 anos depois que vim pra cá?

Eu falava de São Januário e não consigo esquecer do quiprocó com o Flávio Costa, aquele fracassado. Mesmo campeão, não fui feliz por lá. Reconheço até meus destemperos, mas aquilo ali mais parecia um quartel. Eu me recordava há pouco a estréia no campeonato de 40 e já estava eu ligado noutra estréia, a de ontem, contra o bangu, naquele campo de guerra que tanto pisei. Porque, pra mim, futebol era guerra.

A vida, ou melhor, a além-vida, nos traz uma certa maturidade. Se como jogador, me irritava até com colegas de time, hoje, como torcedor, me aborreço com as exigências pela perfeição. As vaias ao menino Gegê me contrariaram. Porque se o torcedor não vai pra ajudar, é melhor ficar em casa. Uma outra imagem me deixou intrigado. Um rapaz, de seus quarenta e poucos anos, assistia a partida das sociais, com óculos parecidos com os meus. Sopraram pra mim que é nosso dirigente. Mas por que o chamavam por um diminutivo de um cartola vascaíno? Como nos meus tempos os dirigentes por essas bandas daí eram Ciro Aranha e Antonio Rodrigues Tavares, não entendi a brincadeira.

Mas isso pouco importa. O que importa é que vencemos, com uma tarde boa de Jacaré, o meia recém-chegado do Sarmiento. Confesso que estava com um pouco de má vontade com o argentino. É que tudo que me lembra aquelas bandas orientais não me traz boas lembranças. Me sentia como Rubem Braga, feliz ao encontrar noivos na calle Florida. ‘minha longa tarefa é outra, é não ser infeliz e me proteger e guardar, ser forte dentro de mim, forte, quieto, sereno.’

É com essa serenidade, incomum quando estava entre vocês, que procuro conviver, ao lado de velhos amigos como Neném Prancha, Geraldo Romualdo da Silva, Armando Nogueira, João Saldanha e alguns outros, que conheço há menos tempo como Maurício Torres, Roberto Porto e Ivan Lessa. Essa é a minha turma. Porque isso aqui é Botafogo, porra!

* Eu, Heleno de Freitas, mineiro de São João Nepomuceno, fui o jogador que mais amou o Botafogo.

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