sábado, 16 de abril de 2016

Quando estive na guerra do Zaire

Imagem: Internet

Inesperadamente fui a Accra, capital do Gana, no regresso a Lisboa. Fez-me lembrar uma das inúmeras histórias que se passaram comigo por esse mundo fora.

Foi em 1997. Em maio, julgo eu. Em virtude de os aviões da TAP estarem lotados, embarquei numa aeronave da Companhia Aérea de Angola com destino a Luanda. Estava a chegando à capital angolana quando um Antonov fez looping em plena pista e se estilhaçou em mil bocados ao longo do aeroporto, exíguo à época, originando o seu encerramento.

Então, o avião dirigiu-se para Brazzaville, capital da República do Congo, mas as autoridades não o deixaram aterrar porque o Estado Angolano devia muito dinheiro em combustível ao aeroporto. Com o depósito à beira da exaustão, o piloto do avião rumou diretamente para o então Zaire, hoje República Democrática do Congo (ex-Congo belga), e aterrou em grande risco porque nessa semana Mobutu havia regressado de França, juntara as suas tropas e reiniciara os combates contra o seu opositor Kabila.

Joseph-Desiré Mobutu, ditador entre 1965-1997, trocou o nome do país para Zaire em 1971 e nomeou a si mesmo como Mobutu Sese Seko Nkuku Ngbendu wa Za Bang, que significa O Todo-Poderoso Guerreiro que, Por Sua Força e Inabalável Vontade de Vencer, Vai de Conquista em Conquista, Deixando Fogo em Seu Rastro. O mais corrupto ditador de África de todos os tempos e um dos maiores do mundo, possuía 7 bilhões de dólares em bancos estrangeiros, sonegados ao país de um povo vivendo na miséria.

Nessa semana de Maio, Mobutu regressara de França, após tratamento contra um cancro na próstata – do qual não sobreviveria em fins de 1997, e retomou a luta contra os guerrilheiros de Kabila. E, em plenos combates em Kinshasa, capital do país, eis que chega um avião angolano sem combustível e aterra subitamente.

Então, duas dezenas de soldados, absolutamente semelhantes aos da foto acima, marcharam decididamente sobre o avião já imobilizado na pista e apontaram vinte metralhadoras altamente ameaçadoras às janelas do avião. Situação que me deixou muito calmo, porque mais-valia não se saber o que seria o futuro nas mãos daqueles soldados do que me despenhar em um avião sem combustível. Pelo menos estava em terra. E dali seria impossível sair sem combustível.

Raramente entabulo conversação com passageiros ao meu lado, e daquela vez não foi diferente. Mas quando os soldados marcharam sobre o avião e apontaram as metralhadoras, a senhora que ocupava o assento vizinho, completamente fora de si, exclamou: - “E agora, o que é que vai ser de nós?” – E eu, que nem sou o ‘senhor da calma’, saí-me com esta: - “Esses homens estão rodeando o avião para nos proteger dos soldados do Mobutu, minha senhora. Fique tranquila.

Foi uma das frases mais extraordinárias que proferi em toda a minha vida sem consciência do que dissera, e 19 anos depois ainda ando por cá – não sem antes ter passado por outras situações bizarras e perigosas. Talvez me disponha a contar mais alguma por um dia destes.

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