Imagem: Internet
Inesperadamente
fui a Accra, capital do Gana, no regresso a Lisboa. Fez-me lembrar uma das
inúmeras histórias que se passaram comigo por esse mundo fora.
Foi em 1997.
Em maio, julgo eu. Em virtude de os aviões da TAP estarem lotados, embarquei
numa aeronave da Companhia Aérea de Angola com destino a Luanda. Estava a
chegando à capital angolana quando um Antonov fez looping em plena pista e se estilhaçou em mil bocados ao longo do
aeroporto, exíguo à época, originando o seu encerramento.
Então, o
avião dirigiu-se para Brazzaville, capital da República do Congo, mas as
autoridades não o deixaram aterrar porque o Estado Angolano devia muito
dinheiro em combustível ao aeroporto. Com o depósito à beira da exaustão, o
piloto do avião rumou diretamente para o então Zaire, hoje República
Democrática do Congo (ex-Congo belga), e aterrou em grande risco porque nessa
semana Mobutu havia regressado de França, juntara as suas tropas e reiniciara
os combates contra o seu opositor Kabila.
Joseph-Desiré Mobutu, ditador entre
1965-1997, trocou o nome do país para Zaire em 1971 e nomeou a si mesmo como Mobutu Sese Seko Nkuku Ngbendu
wa Za Bang, que significa O Todo-Poderoso Guerreiro que, Por Sua Força e Inabalável Vontade
de Vencer, Vai de Conquista em Conquista, Deixando Fogo em Seu Rastro.
O mais corrupto ditador de África de todos os tempos e um dos maiores do mundo,
possuía 7 bilhões de dólares em bancos estrangeiros, sonegados ao país de um
povo vivendo na miséria.
Nessa semana de Maio, Mobutu
regressara de França, após tratamento contra um cancro na próstata – do qual
não sobreviveria em fins de 1997, e retomou a luta contra os guerrilheiros de
Kabila. E, em plenos combates em Kinshasa, capital do país, eis que chega um
avião angolano sem combustível e aterra subitamente.
Então, duas dezenas de soldados, absolutamente
semelhantes aos da foto acima, marcharam decididamente sobre o avião já
imobilizado na pista e apontaram vinte metralhadoras altamente ameaçadoras às janelas
do avião. Situação que me deixou muito calmo, porque mais-valia não se saber o
que seria o futuro nas mãos daqueles soldados do que me despenhar em um avião
sem combustível. Pelo menos estava em terra. E dali seria impossível sair sem
combustível.
Raramente entabulo conversação com
passageiros ao meu lado, e daquela vez não foi diferente. Mas quando os
soldados marcharam sobre o avião e apontaram as metralhadoras, a senhora que
ocupava o assento vizinho, completamente fora de si, exclamou: - “E agora, o que é que vai ser de nós?” –
E eu, que nem sou o ‘senhor da calma’, saí-me com esta: - “Esses homens estão rodeando o avião para nos proteger dos soldados do
Mobutu, minha senhora. Fique tranquila.”
Foi uma das frases mais
extraordinárias que proferi em toda a minha vida sem consciência do que
dissera, e 19 anos depois ainda ando por cá – não sem antes ter passado por
outras situações bizarras e perigosas. Talvez me disponha a contar mais alguma
por um dia destes.
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