por RUY
MOURA | Editor do Mundo Botafogo
«Luís Castro viveu
um inferno no clube nos primeiros meses desse ano. […] Mas se ele serviu para alguma coisa, foi para mostrar que não é fácil
vencer no futebol brasileiro. Muito menos no Botafogo.» – Blog do Mansell.
Gosto de ler o Blog do Mansell e, na
generalidade, alinho pelos seus comentários. Todavia, entendi realçar o
comentário acima porque não concordo com a ideia e acredito que Mansell poderia
ter explorado o caso noutro sentido com uma conclusão bem mais evidente e quiçá
mais pertinente.
Cito apenas alguns exemplos de técnicos
estrangeiros que conquistaram títulos ou conseguiram resultados significativos
desde praticamente o início da sua chegada: Abel Ferreira e Jorge Jesus com
inúmeros títulos de topo a nível brasileiro e continental, assim como Jorge
Sampaoli e Juan Pablo Vojvoda com resultados de surpreendente qualidade.
E parece que outros também estão agradando,
mas mesmo que não agradem o destino não é diferente do praticado pelos
dirigentes dos clubes com os treinadores brasileiros: “FORA, FULANO DE TAL!”.
O que eu creio que Mansell poderia ter
concluído com vigor, contribuindo para reforçar a necessidade de mudança de
visões, estratégias e comportamentos dos dirigentes dos clubes e do próprio
ambiente nacional, desde as cúpulas até aos torcedores, são as absurdas
decisões de despedir treinadores com poucas semanas após a tomada de posse e
até mesmo com apenas 3, 4 ou 5 jogos realizados.
A maior ou menor rapidez de um treinador
acertar com um plantel depende muito da qualidade do próprio plantel: Abel e
Jesus dispuseram de bons plantéis à partida, mas dispunha o Botafogo, e outros
clubes, de plantéis de qualidade para que o treinador pudesse brilhar desde o
início (e, ainda assim, com as dificuldades naturais de mudança de país, de
cultura e de postura futebolística)?
Quer isto dizer que qualquer treinador
estrangeiro necessita de alguma adaptação à cultura e ao futebol do país, e
qualquer treinador nacional e estrangeiro necessita de tempo para ajustar as
suas ideias ao perfil dos jogadores e às características dos adversários.
Construir de raiz uma nova perspectiva
sustentável não se compadece dos apressados: fazer “depressa e bem, não há quem…”
Em consequência, a conclusão que eu retiro
das dificuldades encontradas por Castro, desde o quase despedimento ao
brilharete de o Botafogo liderar o seu grupo na Copa Sul-Americana e o
campeonato brasileiro após ¼ de competição decorrida, além de possuir a melhor
defesa, um dos melhores ataques, jogadores e treinador premiados rodada após
rodada, é que um treinador precisa de apoio institucional, tempo e compreensão
para conjugar todos os ‘astros’ na rota de metas possíveis, desejáveis e
realizáveis.
Quem acompanha o Mundo Botafogo regularmente
sabe que considero que o futebol brasileiro ainda tem prestígio devido aos seus
extraordinários jogadores e que, em geral, os seus dirigentes (confederativos,
federativos e de clubes), árbitros, treinadores e mídia desportiva não
evidenciam a qualidade exigida pelo futebol moderno e, objetivamente, as suas
ações não dispõem de prestígio nem têm beneficiado o futebol brasileiro na sua
projeção mundial.
No caso dos treinadores pode-se dizer que
também são vítimas, porque além deles, nenhum dos mencionados é despedido ou
penalizado seriamente pelos seus comportamentos erráticos e altamente
prejudiciais ao futebol brasileiro, sejam eles intencionais ou simplesmente
equivocados.
Os treinadores são despedidos das formas mais
injustas, permanecem pouco tempo nos clubes e mesmo os vencedores (veja-se o
absurdo despedimento do competente Dorival Júnior) não conseguem cimentar a sua
presença duradoura.
Não obstante, em minha opinião, o futebol
brasileiro nunca teve grandes treinadores (fora poucas exceções) provavelmente
porque a qualidade dos jogadores era tal que as táticas e as dinâmicas de jogo tendiam
a ser secundarizadas face à arte individual dos jogadores, que agiam
praticamente de forma autónoma em campo. E os treinadores habituaram-se a essa
facilidade, não se atualizavam suficientemente (e muitos ainda não se atualizam
como deviam) e mantiveram-se acomodados sob o seu umbigo em vez de olharem para
fora, para o mundo, para o que dele podem absorver a seu favor.
Porém, por outro lado, os treinadores são
vítimas de não os deixarem evoluir harmoniosamente, isto é, ou ganham logo ou
caem fora numa incompreensão da sua delicada e difícil função.
Os treinadores são despedidos das formas mais
injustas, permanecem pouco tempo nos clubes, não têm margem para a construção
serena de um projeto global e mesmo os vencedores (veja-se o absurdo
despedimento do competente Dorival Júnior) não conseguem cimentar a sua
presença.
No que respeita ao pendor crítico relativamente
aos treinadores estrangeiros que chegam ao futebol brasileiro, especialmente
por parte dos colegas brasileiros como Renato Gaúcho, Vanderlei Luxemburgo,
Mano Menezes, até mesmo de Dorival Júnior e tantos outros treinadores
brasileiros com certo renome, e mesmo sem renome, verifica-se, por um lado, o
temor de os treinadores estrangeiros lhes tomarem lugar e, por outro lado, um
certo nacionalismo bacoco num tempo em que as grandes ligas são-no justamente
porque o futebol se tornou global e os seus principais dirigentes compreenderam
que a circulação de jogadores e treinadores entre países e continentes é
altamente favorável à evolução dos clubes.
Tais posições são meramente reativas e não
conduzem à proatividade, que é haver grandes treinadores brasileiros que sejam
invejados e procurados pelo mundo, algo que não ocorre há muito tempo porque no
evoluído futebol europeu os treinadores brasileiros não tiveram sucesso, nem sequer
Luxemburgo no galáctico Real Madrid nem Felipe Scolari no campeão Chelsea em
tempos mais recentes – isto é, os fantásticos jogadores brasileiros continuam
brilhando nos campeonatos europeus e os treinadores brasileiros a serem
despedidos extemporaneamente dos clubes brasileiros.
Não se compreender a situação de parente pobre
do Brasil em relação ao futebol mundial de clubes, não aceitar que o país foi
ultrapassado em toda a linha e não haver políticas para retomar um papel de
vanguarda, é aceitar uma espécie de colonização ao estilo de aproveitamento da
matéria-prima dos grandes jogadores brasileiros para promover valor
acrescentado particularmente ao futebol europeu, é promover a insustentabilidade
do futebol brasileiro praticado ao nível de clube.
2 comentários:
O texto descreve com precisão o futebol brasileiro, não só o atual, mas em todo seu tempo de vida.
Infelizmente os dirigentes nunca estiveram realmente interessados na qualidade e desenvolvimento do nosso futebol, mas o que ele poderia proporcionar do ponto de vista pessoal e financeiro, e as exceções confirmam a regra. O grande problema do país e que gera grandes problemas em relação não só ao futebol mas a nação de um modo geral, pode ser resumido numa frase bastante famosa no país:" farinha pouca, meu pirão primeiro", retrato fiel da cultura brasileira, infelizmente
ABS e SB!
Sobre os dirigentes, Sergio, há várias coisas que faltam ao seu vocabulário: ética, imparcialidade, cooperação, comprometimento, inovação, modernidade, integridade, respeito, transparência...
Abraços Gloriosos.
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