por OLDEMÁRIO
TOUGUINHÓ (*)
Jornalista
botafoguense (1934-2002)
O campo parecia de várzea. Jogo de campeonato
brasileiro, série B, mas campeonato brasileiro. Lembrava muito o estádio Mané
Garrincha, não o de Brasília, o original mesmo, no calorento bairro de Marechal
Hermes. Vivíamos a expectativa de subir pra elite. No meio da tarde, quem se
preparava para subir pra cá era uma velha conhecida. Conheci Sandrinha no
departamento de pesquisa do velho JB. Filha de um amigo querido, era moça de
sorriso largo. Não nos encontrávamos muito. “Rua, o negócio é rua!”, sempre repetia
pra ela. Ainda bem que me ouviu. Pelas lentes da Globo, fez sucesso. Na rua.
É engraçada a vida. Ou a vida depois da morte. Se aí
por baixo se chora, aqui ficamos felizes. É a chance de rever grandes amigos.
Eu falava de Sandra, de campos ruins e quem me aparece? Ele, Emil Pinheiro! Não
fosse ‘seu’ Emil e estaríamos comendo o pão que o diabo amassou. Dia desses, no
dia do jogo contra o luverdense, que nem existia quando eu estava por aí, ouvi
aqui de cima o Jorge Aurélio defendê-lo. “O Emil, como presidente, não
atrapalhou em nada nossa volta pra General Severiano”.
Bandeira do Botafogo a meio-pau é a certeza de rever
pessoas queridas. Já fiquei imaginando o encontro de Sandra com o pai, com
Nilton, com Mané. E, sobretudo, com o Heleno. Embora não tenha conhecido o
Heleno, Sandra suspirava por ele. ‘Talvez ele tenha sido o jogador mais
apaixonado pelo Botafogo. O Nilton era também, mas era uma paixão contida’, me
disse certa vez a Sandrinha.
A arquibancada aqui do céu tem mais um lugarzinho.
Noite tensa, de alguns perigos. Se não conseguimos contra o criciúma, por que
conseguiríamos contra o luverdense, perguntavam os mais céticos. ‘Porque isso
aqui é Botafogo’, responde Heleno, socando com raiva o próprio peito. Foi só
ele falar isso e Daniel Carvalho, o único realmente lúcido do time, passa a
Ronaldo. Não pro Gaúcho, pro Fenômeno. Simplesmente para o melhor dos Ronaldos.
Quando Neilton perdia o pênalti, no finzinho do jogo,
Sandra, nervosa, sem querer ver os últimos instantes, grita da cozinha. ‘Tá
pronto’. E todos nos deleitamos com um linguado ao molho de ervas que só ela
sabe fazer. ‘Tá faltando o uísque’, reclama Sandro. ‘Não combina, pai.’ João
Saldanha se intromete. ‘Com esse peixe, o bom é o vinho branco da Alsácia,
safra 1980′. Sandro resmunga qualquer coisa. Mas todos estão felizes.
(*) O texto, claro, é ficcional. Foi publicado no
blogue ArquibaBotafogo com autoria de Paulo Marcelo Sampaio, a 12.11.2015.
Sem comentários:
Enviar um comentário