terça-feira, 9 de abril de 2019

Carlito Rocha, Paulo Azeredo e Leônidas da Silva: coisas do Botafogo…

Paulo Antônio Azeredo é, em minha opinião, o Presidente dos Presidentes: discreto, objetivo, estratega e supercampeão. Em ambas as vezes que presidiu ao Botafogo obteve dois terços dos títulos cariocas de futebol até ao fim da 2ª presidência: 1930-1932-1933-1934-1935-1957-1961-1962, contra apenas os títulos de 1907-1910-1912-1948 conquistados por outras presidências. Azeredo investiu em comissões técnicas e em atletas do melhor que havia nessas épocas e os resultados foram visíveis. Em 1962, último ano que presidiu ao Botafogo, obteve 80 títulos de campeão e 40 vice-campeonatos, o Botafogo recebeu o epíteto de ‘Campeão de Terra, Mar e Ar’ e emergiu um novo Clube Social moderno e pujante.

Não obstante, Carlito Rocha sempre foi o mais badalado dos presidentes em virtude da sua emotividade e da suas superstições, que marcaram o perfil do Botafogo como Clube muito emocional e pouco racional. Carlito destaca-se por ter jogado pelo Botafogo com febre de 40 graus por amor ao Clube e por conquistar o campeonato de 1948 crente nas superstições e nas receitas de gemada e leite.

Em artigo assinado por Fausto Neto e publicado na revista Placar, nº 143, de 08.12.1972, Carlito Rocha é o centro da reportagem e revelam-se componentes tão estranhas quanto amadoras que marcam o Botafogo até aos dias de hoje, tal a influência de Carlito Rocha no Clube, apesar de ostentar apenas um único título carioca como presidente.

Ao contrário das inovações de Azeredo, Carlito, segundo Fausto Neto, “na área do treinamento Carlito Rocha se mostra profundamente conservador”. E Neto ilustra com as palavras do próprio entrevistado:

– “Me entreguem o futebol e eu dou o Campeonato ao Botafogo. Sem Cooper e sem esquemas táticos mentirosos. A receita está na cabeça: gemada e leite (por que subir serras e ladeiras, se os atletas jogam em terreno plano?), pagamentos em dia e um esquema de jogo como manda o figurino – goleiro, beques, apoiadores e cinco atacantes.”

Além disso, neto realça a crendice de Carlito.”Devoto de N. S. da Conceição e N. S. das Vitórias, Carlito vai quase todos os dias à sede do clube para colocar flores na capela. E é famosa a história de dar um nó na cortina do salão nobre nos dias de jogos, simpatia que – ele garante – protegeu o time da campanha de 1948.”

Neste quadro de crendice e emocionalidade, Carlito distingue-se claramente de Azeredo. Azeredo era o homem que nas negociações com os clubes do Rio de Janeiro admitiu, em dada ocasião, a existência de seis grandes clubes no futebol carioca: Botafogo, Flamengo, Fluminense, Vasco da Gama e… América e Bangu. Um dirigente botafoguense chamou-lhe a atenção de os dois últimos clubes citados serem apenas clubes médios, não grandes. Azeredo ripostou que colocar América e Bangu abaixo do patamar dos outros quatro iria dificultar as negociações em curso para o futebol do Rio, enquanto o inverso fazia ganhar a simpatia de ambos pelas pretensões do Botafogo.

Pura objetividade funcionando a favor dos interesses do Clube.

Ao contrário, Carlito Rocha descartou o fabuloso Leônidas da Silva quando dirigia a equipe de futebol em 1935 e não tornamos a ganhar nenhum campeonato durante os 13 anos. A história é contada pelo próprio Carlito Rocha:

– “O Leônidas deu uma entrevista, no Rio Grande do Sul, afirmando que era Flamengo de coração. Quando voltou, confirmou-me as suas declarações. Mandei-o embora imediatamente e fixei o preço do passe em 5 contos, que era quanto ele devia à tesouraria do clube. No dia seguinte o Flávio Costa foi lá no clube e levou o Leônidas para o Flamengo. Eu não podia admitir no Botafogo um atleta que dizia, publicamente, que por baixo da camisa alvinegra pulsava um coração rubronegro. Não podia.”

E repare-se que foi Leônidas da Silva a figura do título do tetra-campeonato, cuja qualidade foi reconhecida pelo próprio Carlito, fazendo menção, por engano, ao jogo do título de 1935, vencido pelo Botafogo por 5x4:

– “Fui apitar um jogo do Botafogo com o Bonsucesso. Todo juiz torce, tem time e isso não é desonestidade nenhuma. Mas eu achava que o Botafogo vencia fácil aquela partida e fui rigoroso na marcação de dois pênaltis contra nosso time. O Bonsucesso faturou e engrossou; foi uma parada. Se não fosse o Leônidas, que fez 4 gols sensacionais, até hoje eu estaria devendo explicações ao pessoal aqui de casa.

Pura subjetividade funcionando contra os interesses do Clube.

[Nota do editor: Carlito Rocha, provavelmente devido à distância do acontecimento, enganou-se nas suas declarações sobre o ano, porque esse jogo contra o Bonsucesso não decidiu o título de 1935, mas sim o título de 1932. E quem marcou 4 dos 5 gols do Botafogo contra o Bonsucesso e o 'salvou' de críticas foi o sensacional 'pequeno' Nilo, enquanto Leônidas foi nosso adversário nesse jogo, marcando 3 dos 4 gols do Bonsucesso. Somente três anos mais tarde é que Leônidas envergou a Camisa Gloriosa e se sagrou campeão carioca pelo Botafogo, quando o próprio Carlito Rocha era o técnico da nossa equipe. No entanto, fica o registro do elogio a Leônidas da Silva.]

Finalmente, uma curiosidade de Carlito Rocha sobre os primórdios da sua vocação de atleta (foi futebolista, nadador, remador e jogador de polo aquático), relatada na mesma entrevista:

– “No entanto, me meti no esporte por acaso. Por influência de meu cunhado Joaquim Antônio de Sousa Ribeiro (tão amigo da família que ficou viúvo de minha irmã mais velha e casou com a mais nova). Ele foi presidente do Botafogo, clube que eu já amava, e me levou para aquele convívio.”

Sousa Ribeiro foi o homem forte a quem se deveu o Botafogo não ter sido extinto em 1912 e fechado portas quando ficou reduzido a 12 sócios após abandonar a Liga em 1911, em solidariedade com Abelardo Delamare.

Em suma, no Botafogo convivem mundo vários: os ‘Azeredos’ e os ‘Carlitos’, a objetividade e a subjetividade, a razão e a crendice, ou, como diria um torcedor clássico, “Coisas que só acontecem ao Botafogo”.

Pesquisa de Rui Moura (editor do blogue Mundo Botafogo).

6 comentários:

Carlos Eduardo disse...

Acredito que os 2 muito acrescentaram ao Botafogo,cada um do seu jeito.Provavelmente sejam os maiores presidentes do nosso Botafogo.
Quanto ao fato de praticamente mandar embora o Leônidas pela declaração,acho que em certas coisas o jogador tem é que se calar.
Fico imaginando uma declaração dessas nos dias de hoje o quanto repercutiria.
Todo mundo tem um clube de coração,se eu jogo num clube rival eu acho que eu tenho que RESPEITAR o lado que eu estou...
Duvido se Carlito fosse presidente hoje se ele já não tinha mandado embora esses que se dissem atletas profissionais de futebol (bem mixurucas por sinal) que vestem atualmente a nossa camisa.
Não temos ninguém que os substitua a altura,e isso já faz mais de 50 anos.
Acorda,BOTAFOGO!!!

Ps: Carlito e Paulo Azeredo são desde o tempo da fundação do clube,os 2 chegaram a ser amigos????


Ruy Moura disse...

Não sei responder à sua questão, Carlos Eduardo, mas sei seguramente que, se não eram amigos, participaram ambos durante décadas, lado a lado, nos destinos do Botafogo. Carlito Rocha esteve sempre presente no Botafogo. P. A. Azeredo foi presidente durante muitos anos.

Paulo Antônio Azeredo e Carlito Rocha foram os presidentes mais visíveis, um pelos títulos e a modernização do Botafogo, o outro pela paixão exacerbada. Mas houve outros bons presidentes, entre os quais eu gostaria de destacar Joaquim Antônio de Souza Ribeiro. Estou plenamente convencido que o não desaparecimento do Botafogo FC deve-se a ele, pois o Botafogo teria soçobrado na crise de 1911 e anos seguintes. Foi Souza Ribeiro que aguentou o barco.

Abraços Gloriosos.

Carlos Eduardo disse...

Não sabia desse fato sobre Joaquim Antonio ter segurado a barra em 1911,a história eu sabia.
Enfim,acho que entre a decada de 30(tanto o regatas quanto o futebol)até a epoca pré-Borer,a meu ver politica era muito forte em prol do clube.
Augusto Frederico Shimidt,Alvaro Werneck,Ibsen de Rossi,Paulo Azeredo,Carlito,Bebiano,Darcy,Ney Cidade,Althemar Dutra;todos quase numa mesma sequencia de governança.
O que temos atualmente em GS beira o ridículo chamar aquilo de política.
Vejo que ter algum tipo de oposição(leia-se ser totalmente contra esses caras todos citados acima) na política do clube no passado era o mesmo que dar com os burros n'agua.
Abraços,Ruy!!!

Ruy Moura disse...

Concordo inteiramente, Carlos Eduardo. Até Althemar fazia-se política. O Rivadávia deitou tudo a perder quando quis pagar as dívidas - enquanto os outros clubes não pagaram e não se afundaram - e preparou a venda da Sede. E a seguir o Borer executou a venda preparada. Daí para a frente reconheço, em minha opinião, apenas o esforço do Maninho - mas que se esgotou pessaolmente com os problemas imensos e não trouxe resultados -, o Emil Pinheiro - cujo investimento resgatou o Botafogo - e o Bebeto de Freitas, que nos resgatou da 2ª divisão com a coragem de assumir a presidência de um clube que não tinha dinheiro para papel higiênico!

Abraços Gloriosos.

Carlos SantAnna disse...

Oi acho que tem alguma inconstência pois como consta no seu artigo sobre o Leônidas. o jogo do título foi contra o Andarai e neste jogo ele não marcou, Quem marcou foram Álvaro (2), no 1° tempo; Patesko, Carvalho Leite e Russinho, no 2° tempo. O Diamante Negro foi substituido por Eduardo Viveiros. Pode me esclarecer.

Ruy Moura disse...

Tem toda a razão, amigo Carlos SantAnna. Obrigado. Efetivamente, Carlito Rocha confundiu o ano (foi o jogo do título de 1932 e não o jogo do título de 1935), e o artilheiro contra o Bonsucesso em1932 foi Nilo, ao marcar 4 dos 5 gols do Botafogo. Leônidas foi nosso adversário nessa partida e marcou 3 gols. Eu não me apercebi do lapso, mas até teri sido fácil s etivesse prestado mais atenção: em 1935 Carlito Rocha foi o técnico do Botafogo e obviamente não poderia ter apitado nenhum jogo do nosso clube.

Obrigado pela sua nota. Estou sempre disponível para emendar lapsos e acrescentei uma nota ao texto esclarecendo o assunto.

Abraços Gloriosos.

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