quarta-feira, 1 de junho de 2022

Fragmentos ‘futebol do botafogo 1966-1970’: recordando a Selefogo goleando os argentinos… [19]

Arte: Iram Santos.

por CARLOS FERREIRA VILARINHO

especialmente para o Mundo Botafogo

sócio-proprietário e historiador do Botafogo de Futebol e Regatas

 [A narração que se segue antecipa o III Volume da coleção, a editar em 2022, e reporta-se ao ano de 1968]

Recordando Brasil 4x1 Argentina (Maracanã – 07/08/1968)

Na terça-feira (30/07/1968), após ouvir José Carlos Villela (supervisor), Zagalo convocou 22 craques para a seleção carioca que enfrentaria a Argentina. Dez pertenciam ao Botafogo. Cao, único titular alvinegro que não foi chamado, chiou bastante (sem razão). No dia seguinte, Zagalo revelou que o Botafogo seria a base do time, pois os convocados se apresentariam na véspera do jogo. Evaristo estrilou: ele deveria “ter convocado para a reserva os demais jogadores do Botafogo, pois eles já estão entrosados com os titulares”. Reinaldo Reis solicitou a Octávio a dispensa de Brito e Nei, pois contava com ambos para um amistoso. Silva (preterido) desceu o pau: “Isso não é seleção coisa nenhuma, é uma palhaçada”. Wolney Braune ameaçou: “Zagalo terá oportunidade de conhecer melhor o valor dos jogadores do América, domingo”.

Na quinta-feira, 1º de agosto, ciente de que Zagalo não dispensaria os dois vascaínos, Octávio convidou Reinaldo Reis (presidente do Vasco da Gama) para o cargo (diplomático) de chefe da delegação. Reis alegou que chefiaria outra delegação, a do Vasco. Recusou e insistiu na dispensa. No Fluminense, o vice-presidente de futebol Manuel Duque considerou “um absurdo” chamar Suingue (que custara 460 mil) para colocá-lo na reserva. Por isso, defendia a dispensa dos quatro tricolores. Villela ameaçou renunciar ao cargo de supervisor. Duque prometeu a mesma coisa. A crise só foi superada com a interferência de Luiz Murgel. Zagalo rebateu as críticas: “Cansei de ouvir que o time do Santos ou o do Botafogo, com um ou outro reforço, seria a seleção ideal. Agora, já acham que não”.

No apronto (titulares 2x1) de sexta-feira, Rogério deixou o campo com dores musculares na coxa direita. No mesmo dia, Octávio engoliu a desfeita de Reinaldo Reis, mas insistiu em prestigiar o Vasco, convidando Ciro Aranha para chefiar a delegação. No sábado, Ciro Aranha (articulado com João Havelange) nomeou João Saldanha para o cargo decorativo de assessor técnico de Zagalo. Também no sábado, confirmado o estiramento, Rogério foi excluído da partida contra o América. Com isso, Zequinha, destaque dos últimos coletivos, faria sua estreia.

No domingo, o América (em 4-4-2) entrou em campo para empatar ou vencer num erro do Botafogo. Na defesa, Gérson era marcado por Tadeu. No ataque, por Badeco. Cao não foi exigido. Embora mantendo a iniciativa, o Botafogo cozinhava demais o jogo. Numa falta quase no bico esquerdo, Rosã armou a barreira com seis homens. Então, o Botafogo armou outra ao lado com Roberto, Zequinha e Jairzinho. Com precisão, Paulo Cézar fuzilou na forquilha direita. Jairzinho se abaixou, mas atrás dele, Edu salvou de cabeça para córner. Sensacional! Foi o grande lance da primeira fase.

Aos 5 do segundo tempo, Tadeu entrega a Edu, que dribla Moreira, evita Zé Carlos, progride até a meia-lua e atira seco. A bola quica no terreno, bate no braço de Cao e entra no canto esquerdo: 0x1. Os rubros aumentam a retranca, contudo, Badeco se machuca (aos 19). Sérgio entra na lateral direita e o jovem Paulo César passa a marcar Gérson, agora bem avançado. Paulo Cézar estraçalha na esquerda. Aos 26, Humberto substitui Zequinha e troca de posição com Paulo Cézar. E aos 39, na meia-lua, Jairzinho se livra de Renato e toca para Gérson, desmarcado, atirar um petardo, que quica no chão e explode no canto esquerdo: 1x1. Golaço!

Na segunda-feira, Reinaldo Reis protocolou o pedido de dispensa dos vascaínos, porém, constrangido pelo cargo, Ciro Aranha contornou a crise. Jogada de mestre de Octávio.

Na Última Hora, Maneco Müller compôs a ridícula comédia: “Saldanha só aceitou essa assessoria técnica para salvar o barco e prestigiar Zagalo. (...) A verdade é que João Saldanha deveria ser conselheiro permanente do Havelange, ao invés de conselheiro eventual do Zagalo”. Se para dirigir uma seleção local, Zagalo precisava dos conselhos de um comentarista, como poderia pensar um dia em ser técnico do Brasil? Na terça-feira, Zito (supervisor do Santos) declarou que ele ainda “precisava aprender muito”. Pelé preferia vê-lo “em ação” antes de opinar, mas reforçou: “Acho-o imaturo para tamanha responsabilidade”.

Na terça-feira, Paulo Henrique (estiramento) nem trocou de roupa. Para o seu lugar foi convocado Dimas. Após o coletivo de meia hora (titulares 1x0), Luís Carlos (contusão) e o suplente Rogério (estiramento) também foram reprovados. Zagalo, desta vez, só convocou um jogador: Nado.

Na outra noite, os brasileiros entraram em campo debaixo de vaia. Os argentinos foram ovacionados. Na boca do túnel, Zagalo foi alvejado com copos de café, bolas de papel e bagaços de laranja. “Nos primeiros minutos, qualquer chute errado recebia vaia” – dirá Zagalo, um ano depois. Aos 41 minutos, apanhando o rebote do lateral direito Ostua, Valtencir vem na corrida e atira um míssil que passa zunindo entre Perfumo e Basile: 1x0. Golaço! No segundo tempo, aos 5, Nado cruza do fundo e Roberto encobre Sanchez com linda puxeta: 2x0. Aos 32, concluindo passe de Paulo Cézar, Roberto amplia de canhota: 3x0. E aos 43, depois de quatro minutos e meio de olé, Nei toca para Jairzinho, recebe de volta, dribla o goleiro, fica sem ângulo e devolve para Jairzinho empurrar levemente para o barbante: 4x0. Gol de placa! Na saída de bola, num córner, Basile vence Brito e reduz a vergonha: 4x1.

O Botafogo lavou a alma! Leônidas comentou: “Jogo fácil para o Botafogo e, nos meus 13 anos de profissional, nunca vi um espetáculo tão lindo como o do antecedente ao quarto gol”. O treinador José María Minella irá lamentar: “Quando soube que os cariocas iam montar a seleção na estrutura de um time como o Botafogo, senti que a parada seria duríssima”.

Extraído do livro “O Futebol do Botafogo – 1966-1970” (a lançar em 2022).

Os volumes I e II podem ser adquiridos através do endereço:  https://mauad.com.br/index.php?route=product/search&search=o%20futebol%20do%20botafogo

2 comentários:

Sergio disse...

Esse jogo da Selefogo em 68 é um dos que mais doem nos nossos inimigos, em especial o último gol, obra prima que como disse o Zagallo, o que o Barcelona faz hoje o Botafogo já fazia em 68. ABS e SB!

Ruy Moura disse...

62 foi o ano de Mané, mas 68 foi o ano de um Coletivo! Abraços Gloriosos.

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