por GUSTAVO MARIANI | Histórias da Bola |
jornaldebrasilia.com.br
«Os poetas escrevem que “Garrincha
saiu desta vida para viver na história”. Exatamente! No 30 de janeiro de 1983,
brincaram os humoristas, ele chegou em uma nova dimensão e já foi convocado,
por São Pedro, lhe dizendo: “Vamo qui vamo, Mané! A seleção do Céu está
perdendo, por 2x0, do time do inferno. Vá lá, entorte os capetas e vire o
placar”, que Deus tá na torcida!
Aqui na Terra, quis o destino que
Garrincha encarnasse o papel do “Demônio das Pernas Tortas”, pela última vez,
exatamente, pelo Natal de 1982, quando vestiu a camisa de um time amador
chamado Londrina, que nem existe mais. O relógio marcava 15h30, no Estádio
Adonir Guimarães, em Planaltina. O árbitro Eano Carmo Correa, que iria apitar a
pugna, aproximou-se dele e disse-lhe: “Antes de mais nada, quero agradecer-lhe
por estar vivo”. Mané não entendeu nada. Eano, então, relembrou-lhe: “No tempo
em que eu era do Departamento Autônomo da Federação Carioca de Futebol, fui
apitar um jogo em sua terra, Raiz da Serra. De repente, um cara resolveu me
desmoralizar, arrancando o apito da minha boca, me chamando de ladrão. Você foi
até ele, passou-lhe um carão e o obrigou a devolver o apito e a me pedir
desculpas. Só assim saí vivo do campo”, contou.
Instantes depois, naquele 25 de
dezembro, o Mané partia pra cima do seu último “João”, como ele chamava os
marcadores, dos quais nunca sabia do nome. O cara da vez era Marcelo, isto é, Marcelino
Teixeira de Carvalho Branco, que havia combinado, com Manoel Esperidião Filho,
o Manelzinho, promotor do jogo, não dificultar a marcação, para a torcida
vibrar com o velho Garrincha, que receberia marcação folgada. E, já que seria
assim, no primeiro lance, o Mané, malandro, dominou a bola, partiu pra cima do
seu último “João”, gingou, a torcida gostou, ele passou e cruzou, não acertando
o alvo para a galera gritar “uuuuuhhh!”.
Aos 49 de idade, sem se cuidar,
com problemas com o alcoolismo, Garrincha não teria muito o que mostrar. Mesmo
assim, colocou para trabalhar o goleiro Paulo Victor, do Fluminense e da
Seleção Brasileira, que estava em férias por aqui e foi para o gol do time da
Associação de Garantia ao Atleta Profissional do DF. “Mané chutou duas vezes ao
meu gol. Da primeira, cobrou uma falta, da entrada da área, e me obrigando a
ceder escanteio, na base da experiência; da segunda, passou por dois e cruzou,
para eu ceder novo escanteio”, contou o ex-goleiro Paulo Victor, que havia
voltado a residir em Brasília.
Garrincha não teve fôlego para
jogar durante todo o segundo tempo. Aos 15 minutos, foi substituído por
Valdemar Pereira da Silva, um goiano que ficou famoso em sua terra, São
Domingos, por causa daquilo. Como o placar foi o que importou, 1x0 para o time
da casa, o Mané saiu de campo aplaudido, posando para fotos e distribuindo
autógrafos. Na véspera da partida, como se tivesse lido o seu futuro, dissera a
Manelzinho, de quem era amigo, desde 1960, quando o organizador do amistoso
jogava pelo América-RJ: “Talvez esta seja a minha última partida” – e foi.
Antes do jogo daquele Natal de
1982, Garrincha havia jogado só duas vezes no DF. Nos amistosos Botafogo 6x0
Clube de Regatas Guará, em 17 de setembro de 1961, quando marcou um gol, e
Flamengo 3x1 Seleção Brasiliense, em 3 de março de 1969. Como botafoguense, a
patota era: Manga (Adalberto), Cacá, Zé Maria, Chicão e Nilton Santos (Rildo);
Garrincha, Amoroso, Amarildo (Aírton) e Zagallo. Já o seu time flamenguista teve:
Dominguez, Marcos, Onça, Manicera e Paulo Henrique; Rodrigues Neto e Liminha:
Garrincha (Cardosinho), Dionísio (Zezinho), João Daniel e Arilson (Reyes). Na
última patota do Mané, todos os atletas do Londrina jogaram: Luis Ribeiro,
Joel, Paulo Ferro, Vicente e Tonho Esteves; Israel, Tião e Amauri; Garrincha,
(Valdemar),Tião Mafra, Paulo Lira, Tião Jorge, Apolinário, Pires, Geraldo
Martins e Cirilo.»
Fonte: jornaldebrasilia.com.br/blogs-e-colunas/historias-da-bola/o-ultimo-mane-2/

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