quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

Heleno de Freitas: a soberba de um craque

O herói e a cultura: um estudo do filme Heleno

por FAUSTO AMARO

Um excerto sobre individualismo vs coletivismo

Tinha a si mesmo [Heleno de Freitas] em “alta conta”, considerando-se um grande atleta, singular e genial, como fica exposto ao ser questionado por jornalistas antes do embarque para o Sul-Americano do Chile, em 1945: “Do jeito como estou jogando agora o Brasil seria campeão do mundo. Espero que não cancelem também a [Copa do Mundo] de 50 no Brasil. Senão, eu vou lá e acabo com os alemães.”

Em diálogo com o médico do Botafogo, seu caráter individualista tem novamente lugar: “Até a imprensa já percebeu que eu jogo sozinho.” Esse ar soberbo e o reconhecimento de seu próprio valor não são comuns na cultura brasileira, onde parece reinar a (falsa) humildade. Falar elogiosamente de si não é tão bem visto assim. Heleno se assemelha a Romário (HELAL, 2003) no quesito egocentrismo.

Aqui podemos entrever também a oposição entre o craque individualista, que seria típico do estilo brasileiro de jogar futebol, e o craque mais coletivista, que se preocuparia com a equipe e jogaria um futebol mais colaborativo. Enquanto o primeiro jogaria para si e para o público, o segundo estaria preocupado com os resultados de sua equipe e com seus companheiros de time.

O craque individualista, muitas vezes alçado ao posto de herói, seria mais valorizado pela imprensa brasileira. Ao se encaixar nessa categoria, Heleno pode ter caído nas “graças” dos jornalistas da época. Isso fica evidente quando, em uma conversa antes do treino, Heleno mostra seu desprezo pelos companheiros de equipe, o que é repetido em outros momentos do longa-metragem.

Destaco que nessa primeira metade do século 20 o debate sobre qual deveria ser o estilo de futebol adotado pelo Brasil era tema central das crônicas futebolísticas publicadas nos jornais. […]

A última fala do filme, na voz do próprio Heleno ficcional, sumariza diversos elementos que compõem a narrativa, como o amadorismo, a visão romântica do futebol, o futebol como arte e fato social, a soberba do jogador:

«Glória. Não é bom? [...] Acho que todo jogador de futebol deveria assistir uma ópera antes de entrar em campo. Pro sangue subir à cabeça. Eu não acredito em futebol sem o sangue fervendo, sem a faca entre os dentes. O jogador morre pensando na torcida. Não consigo imaginar alguém jogando futebol sem ser pela torcida. No juízo final, os satisfeitos e os covardes vão ser os primeiros a se retirar. Alguém pode achar que alguma coisa que eu fiz é impossível, mas não existe impossível para mim. Eu não sou um jogador de futebol. Eu sou a própria vontade de jogar. Eu sou a gana em forma de gente. Eu sou!»

Fonte: Contemporânea. Ano 12 | Vol.1 | Nº 23 | 2014.

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