[O Mundo Botafogo inicia hoje uma série de dez publicações sobre os ‘Joãos’ do inimitável Garrincha, apresentando-se como abertura um texto da revista Placar cujo nº 1072 é dedicado ao ‘Anjo das Pernas Tortas’]
Placar nº 1072
Junho de 1992
Aquela figura alta e imponente posicionada na lateral-esquerda do campo não impressionava Garrincha. Era o primeiro treino do ponta no Botafogo, e os amigos, assustados com sua quase displicência diante do titular da Seleção Brasileira, resolveram alertá-lo: “Você sabe quem vai marcá-lo, Mané?”, perguntou o presidente do Pau Grande, Roberto Leite. “É o Nilton Santos”, completou, esperando uma reação. Nem assim o craque se abalou. “Não tem importância, não”, tranquilizou Garrincha. “Em Pau Grande o João também me marca.”
A referência de Garrincha ao zagueiro-central de sua primeira equipe – João Berruga –, o único que conseguiu anulá-lo em alguns treinos e peladas, serviu como eterna identificação para seus marcadores. Nilton Santos foi apenas o primeiro a sentir na pele a dificuldade de ser um ”João”, levando até bola entre as pernas no primeiro treino de Garrincha.
Por isso, fez questão de tê-lo ao seu lado no Botafogo e jogou toda a responsabilidade para o tricolor Altair, o flamenguista Jordan e o vascaíno Coronel, que ficaram na história como as maiores vítimas dos dribles mais desconcertantes.
Dribles que espantaram o mundo inteiro em Estocolmo, na Copa de 1958, onde Mané acabou com a suposta ciência do futebol soviético, com seu marcador Kuznetsov e fez o sueco Gustavsson deixar tonto o Estádio Raasunda, depois da goleada por 5x2 que deu o primeiro Mundial ao Brasil.
E até Gérson, reconhecidamente um gênio, bailou diante de suas pernas tortas quando, por ordem do técnico Flávio Costa, tentou inutilmente marcá-lo na final do Campeonato Carioca de 1962. Prova que os dribles de Garrincha não escolhiam craques ou pernas-de-pau. Quando a bola estava em seus pés, todos eram iguais e atendiam pelo nome de João.
A CIÊNCIA NO CHÃO
Partida entre a URSS era a estréia de Garrincha em Copas do Mundo, depois de passar os dois primeiros jogos do Mundial de 1958 na reserva. Por isso, humilhou de uma só vez dois marcadores. Começou deixando Krijevski no chão para invadir a área e mandar uma bola na trave. Depois fez o lateral Kuznetsov bailar à sua frente por todo o jogo. E a suposta ciência do futebol soviético caiu por terra.
A CAMINHO DA TAÇA
A final da Copa do Mundo de 1958 não serviu apenas para deixar os suecos boquiabertos. Deixou também o lateral-esquerdo Gustavsson, da Suécia, tonto com os dribles de Garrincha. Durante o jogo, o marcador percebeu que tudo o que se falou sobre o ponta brasileiro no resto da Copa do Mundo era verdade. Por seu setor Garrincha abriu o caminho do título, criando as jogadas dos dois primeiros gols da goleada por 5x2, e fez até os suecos entenderem o sentido de um nome para eles estranho: João.
ABAIXO O ESQUEMA
Coronel ficou para a história como o maior João vascaíno. Sofreu dribles memoráveis em todos os jogos entre Botafogo e Vasco e mereceu ficar com o título. Mas não foi o único vascaíno a sofrer com a magia de Garrincha. O time armava um esquema especial para marcá-lo, recuando o ponta Pinga, deixando Coronel na cobertura e Orlando como terceiro marcador. Conseguiu várias vitórias, mas não parou Garrincha, que driblava em foila todos os seus marcadores.
ATÉ GÊNIO ENTROU NA DANÇA
O flamenguista Jordan passava as semanas que
antecediam os jogos com o Botafogo treinando a melhor maneira para anular
Garrincha. Sofria como qualquer outro marcador em campo, mas foi considerado
até pelo ponta o seu melhor. Na decisão do Campeonato Carioca de 1962, porém, o
técnico Flávio Costa recuou Gérson para marcá-lo e colocou Jordan na cobertura.
Garrincha desnorteou os dois, fez dois gols e criou a jogada do outro nos 3x0
que deram o título ao Botafogo [na
verdade, Garrincha fez os três gols, porque o terceiro foi remate dele que
bateu em um adversário e entrou na baliza]. Jordan
fez seu pior jogo contra Mané e até Gérson virou João.
4 comentários:
Quem diria que hoje somos obrigados a ver essas porcarias de jogadores depois de ver um clube com tantos gênios, sendo para mim Garrincha, o maior de todos. Na minha opinião, em futebol o Botafogo é AG e DG. Abs e SB!
AG e DG com um parentesis para a grande equipe de 1967-69. Jairzinho, Gerson, Paulo Cezar Caju, Rogério e Roberto Miranda constituíam um sensacional quinteto de ataque. Foi a 2ª ou 3ª melhor linha de ataque do Botafogo, só ultrapassável no tempo de Garrincha e, talvez, senelhante à qualidade do tempo de Nilo, Carvalho Leite, Leônidas da Silva, entre outros.
Abraços Gloriosos.
Olá Ruy!
Que matéria linda, que bom dar cores ao João original que de fato era João.
Coronel e Jordan se tornaram mais especiais para o futebol devido os dribles de Garrincha, não apagando seus talentos individuais.
Coronel amigo de Garrincha, mas que teve literamente pesadelos com Mané. Jordan talvez o segundo lateral na história do Flamengo, e é um ídolo meu entre outras qualidades pela lealdade durante toda carreira (611 jogos e 0 expulsão) e Garrincha especificamente.
Li o comentário do Sérgio e sua resposta, que linhas atacantes!
Abração!
São quatro históricos, Leymir. Garrincha porque é aquilo foi e os outros porque são indissociáveis de Garrincha e vice-versa.
Grande abraço.
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