[Nota preliminar: Garrincha e Pelé não atuaram nos dois primeiros jogos do Brasil na Copa do Mundo de 1958 [3x0 contra a Áustria e 0x0 contra a Inglaterra], mas após o insosso empate com a Inglaterra Feola escalou os dois craques para o último jogo da 1ª Fase de Classificação e Garrincha liquidou a União Soviética, no dia 15 de junho, em jogo que o Brasil venceu por 2x0 o ‘futebol científico’ dos russo-soviéticos, tendo a premonitória crônica de 17 de junho do JS engalanado Garrincha, que juntamente com Pelé inauguraram a maior dupla do futebol mundial do século XX.]
Crônica de VARGAS NETTO
In Jornal dos Sports, 17.06.1958
Gentileza (acervo) de ANGELO ANTONIO SERAPHINI | Colaborador do Mundo Botafogo
Se há um jogador sem recalques nessa seleção do Brasil que está na Suécia, esse é Garrincha. Ele não conhece o adversário, não quer saber de sua fama, pouco, ou talvez nada, lhe importa a nacionalidade, e o nome, então, esse é o que menos conta… Garrincha põe por sua própria conta um nome em qualquer oponente. Para ele todos se chamam do mesmo modo: João. Qualquer half que jogue contra ele – é João. E todos merecem a mesma indiferença. Pode ser austríaco, inglês ou russo, Garrincha não tem nada com isso… Ele irá jogar com a mesma desenvoltura e prazer como se estivesse em Pau Grande.
Vejam lá se ele dá confiança a essas cidades de nomes complicados que não valem uma moitinha de capim de Pau Grande! Fora do Brasil as cidades se chamam assim: aquela onde o fulano fez isto, ou lhe aconteceu aquilo, aquela outra onde choveu ou fez frio.
Tudo é cidade da estranja, cidade dos gringos. E o que lhe importa se nenhuma é parecida com Pau Grande?! E que lhe importam também os que moram nela, se Garrincha não lhes entende a língua, não pode conversar sobre pescarias ou caçadas como com o pessoal de Pau Grande ?!... E muito menos ele liga para os Joãos que jogarem contra ele por lá.
Quanto mais João melhor. Contra a Rússia é que foi divertido! Tinha João que não se acabava mais! Antes de começar o jogo Feola reuniu a equipe e disse: joguem cio vocês sabem, como se estivessem no Brasil. Não façam conta do adversário, joguem cada um o seu jogo e que ninguém esqueça que precisamos vencer.
Virou para Garrincha e disse: você vai jogar como se estivesse em Pau Grande. Foi o maior prejuízo dos soviéticos. Garrincha a um minuto de jogo já fez vibrar a torcida sueca. Passaram-lhe a bola e ele, depois de passar dois Joãos, mandou uma bomba que fez os soviéticos estremecerem. Aí botaram três ou quatro Joãos cercando Garrincha… Foi um divertimento para ele! Era só russo sentado no chão! E meta drible. E a torcida se esbaldava em aplausos! Garrincha tomou conta da defesa russa e da torcida sueca de um só golpe. Desorganizou toda a retaguarda adversária, pôs os oponentes em pânico. Se não o cercam e derrubam ele vai parar dentro das redes. A sorte dos russos foi o árbitro não marcar os penalties. E dê-lhe botinada e rasteira… E toma drible… Como nós estivemos com vantagem no placar, desde saída, Garrincha recebeu ordem de prender a bola e gastar tempo…
Imaginem só, que
divertimento! Só poderia terminar como terminou: com um baile!... E o
mestre-sala foi Garrincha…
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