por LÚCIA SENNA | Escritora e Cantora | Cronista do Mundo
Botafogo
Após
meses sonhando com a Grécia, embarquei em uma excursão de dezessete dias pela Teturismo.
Eu sabia que o meu maior desafio seria o avião. Do Rio a Frankfurt foram doze
horas em uma cadeira desconfortável, com tão pouca inclinação que me senti mais
como uma contorcionista do que como uma viajante. A comida? Ah, essa é uma
história à parte. Lembrei-me do glamour dos voos de antigamente, onde até um
lanche, por mais simples que fosse, tinha um ar de sofisticação. Agora, o que restou foi um misto de desespero
e uma refeição que mais parecia uma experiência de laboratório.
Depois
de uma conexão de mais de três horas em Frankfurt cheguei a Atenas exaurida, um
verdadeiro bagaço. Saí toda bonitinha do Rio, vestida com roupas compradas para
a ocasião, e cheguei lá com o cabelo armado e a maquiagem derretida, pronta
para enfrentar a cidade dos deuses. Mas a recompensa me aguardava: ao avistar a
Acrópole e ver o grandioso Partenon, o coração disparou. As colunas imponentes,
tão perfeitas e antigas, contavam séculos de história. A sensação de estar onde
os deuses eram adorados é inigualável.
E
a emoção continuou com a visita a Olympia, outro lugar mágico onde a história
ganha vida. Caminhar pelas ruínas dos antigos Jogos Olímpicos é como entrar em
um livro. Parecia que estava vendo, nitidamente, os atletas preparando-se para
as competições épicas, e isso - pasme! - em 770 a.C. Em seguida, Meteora, um dos lugares mais
especiais do mundo. E se não tivermos outra razão pra visitar a Grécia, Meteora
já seria suficiente.
Do
continente partimos de ferry para as famosas ilhas gregas banhadas pelo mar Egeu.
A entrada no ferry é uma odisseia moderna. Milhares de turistas, cada um com
suas bagagens, todas muito parecidas, se espremendo numa espécie de “garagem de
malas”. O cenário é digno de um filme de comédia. O desembarque, um verdadeiro
pandemônio onde as malas são as protagonistas e os passageiros detetives atrapalhados.
As pessoas começam a procurar por suas bagagens como se fossem parentes
perdidos. E, entre empurrões e risadas, o que tínhamos era um espetáculo
completo de humor e caos.
Bagagens
em punho, chegamos a Mykonos, a primeira ilha a ser visitada. De dentro de um
catamarã, mergulhei no deslumbrante mar Egeu e, ali submersa nas águas azuis,
extasiada com tanta beleza, não pude deixar de pensar que aquele lugar era um
sonho!
As
coisas começaram a ficar hilárias quando, saindo do catamarã, sentei em um
restaurante à beira-mar e achei que seria uma boa ideia pedir um peixinho
fresco. Que grande erro! O prato chegou e lá estava ele, inteiro, enorme e com
aquele olhar fixo e duro, me encarando, como se quisesse dizer: “Você realmente
vai me comer?” Eu quase desmaiei. Para quem tem horror a animais inteiros,
prontos pra serem devorados, aquela cena foi como um ato de crueldade gourmet. Atordoada,
deixei o local e me abracei com um gelato, pensando que a vida é curta demais
pra comer o que nos desagrada.
A
Grécia, sabemos, é um país caro, especialmente quando se troca reais por euros.
Os preços nos restaurantes pareciam ter sido determinados por algum deus da
fortuna, porque definitivamente não cabiam no nosso orçamento de mortais.
A solução? O dito “farnel”. Sim, o café da
manhã nos hotéis era digno de deuses. E um planejamento estratégico, para
evitar um almoço de preços proibitivos, se fez necessário. Discretamente, nos
agachávamos como verdadeiros espiões em missão para embrulhar em guardanapos,
sanduiches, frutas e bons tacos daquele delicioso queijo grego. Cada novo item
que conseguíamos colocar na mochila era celebrado como uma conquista épica,
digno de um hino de vitória.
Logo
percebemos que a estratégia de “farnel” não era exatamente uma missão secreta.
Nos hotéis, mensagens de alerta começavam a aparecer por toda parte: “É
proibido fazer farnel.” Uau, não sabíamos que estávamos tão perto da
ilegalidade. A surpresa veio quando um grupo de coreanos, na maior cara de pau,
ignorou a mensagem e começou a desferir suas próprias táticas de farnel. Fiquei
admirada com a ousadia deles. Mas, diante de almoços de preços absurdos, não
nos restou outra saída a não ser programar nossa próxima ação clandestina com
um pouco mais de astúcia.
Outro
momento memorável e hilário do passeio aconteceu em visita à caverna Melidoni,
em Creta. A guia, com uma energia contagiante, nos fez subir por alguns bons
minutos em degraus de pedras escorregadias, como se estivéssemos numa maratona.
Depois, com sorriso radiante, revelou que estávamos no caminho errado. O sol
forte fez nosso humor azedar, até porque essa não era a primeira vez que a moça
errava. No palácio de Knossos, qualquer tentativa de fazer perguntas era
frustrada pelo já famoso: “Calma, sobre isso depois vou explicar.” Tal explicação jamais se concretizava.
Em
contrapartida, tivemos o privilégio de conhecer um guia grego que falava
português com uma fluência impressionante. Culto e engraçado, nos falou sobre a
mitologia de uma forma tão envolvente que mais parecia que estávamos assistindo
a uma peça de teatro. Sua paixão pela Grécia era contagiante e nos fez sentir
como se fossemos parte da própria história.
Mas,
apesar do esforço do guia, volto dessa viagem com uma certeza: a mitologia
grega é o meu calcanhar de Aquiles. Como entender essa confusão de mitos e
lendas, onde os deuses tanto podem ser a solução como a causa dos dilemas
humanos? Zeus, por exemplo, o grande
chefão do Monte Olimpo, tem um currículo impressionante. É o deus do céu, do
raio, do trovão... e da infidelidade. Se existisse um tinder no reino dos
deuses, ele seria o rei dos matches. Hera, coitada, vivia de canto chorado,
lamentando as inúmeras traições do sujeito. Dizem que entrou em depressão
profunda, quando ouviu do safado: “Hera, você já era!”
Voltando
para Aquiles, o grande herói grego, fico aqui pensando como se sentiria se
soubesse que sua fraqueza acabaria se transformando em um termo para descrever
nossas inseguranças modernas. Aposto que ele, muito provavelmente, daria uma
risada e diria: “Então, agora sou o símbolo da vulnerabilidade? Que maravilha!”
Em seguida, criaria um podcast chamado “superando vulnerabilidades”, onde
dividiria suas experiências de heroísmo e, claro, daria dicas de como lidar com
inseguranças e, logicamente, com os calcanhares.
Em nome de
ZEUS, quem diria que o calcanhar de Aquiles seria mais famoso que suas inúmeras
vitórias? Pois é, na guerra da fama, fraquezas se tornam lendas.
9 comentários:
Lúcia Senna voltou para alegrar nosso blog ,com suas deliciosas e bem humoradas crônicas. A de hoje está uma gostosura! Alexandre paiva
Em nome de Zeus, Lúcia Senna, não se ausente por tanto tempo. Você faz falta. Suas crônicas são especiais e nos tiram da mesmice da rotina. Joaquim Alves
Parabéns, Lúcia! Cronica hilária como sempre! KKKKK Celso Rodrigues
Você, amiga, explorou o lado engraçado da viagem e o fez com muita graça, pois o lado cultural todos nós conhecemos bem. Mais um texto diferente e divertido! LOURDECA
Obrigada ,Alexandre !
Dizem que o bom filho a casa torna, não é? Então, eu posso até me ausentar por um período, mas como boa filha , estarei sempre voltando.
Grande abraço
Oi, Joaquim
Boa noite!
Fiquei emocionada com o seu comentário. Portanto, em nome de ZEUS , prometo não mais me ausentar...bem, se o nosso querido editor concordar.
Abraços gloriosos!
Que bom que você gostou! Fico feliz em saber. Grande abraço!
Oi, Deca querida !!!!
Nessa minha viagem aconteceram muitas situações inusitadas. Precisei escolher algumas pra contar. Outras tantas ficaram de fora. Acho que vou acabar aproveitando- as para escrever EM NOME DE ZEUS 2 KKKKK
Beijão
Lucia, q crônica deliciosa! Vc voltou da Grécia completamente inspirada pelas musas!!
Sol de Anlarec
Enviar um comentário