por RUY MOURA | Editor do Mundo Botafogo
Augusto Frederico Schmidt proferiu a Santhiago Dantas a célebre frase “O
Botafogo tem a vocação do erro”. Praticamente desde a sua fundação o Botafogo
teve a vocação do erro em diversos momentos da sua história, com excepção
principalmente dos dois períodos em que Paulo Antônio Azeredo foi presidente e
levou o nosso Clube sistematicamente a grandes glórias, não a títulos de
natureza mais ou menos ocasional, mas títulos preparados com a mudança de
estruturas do Botafogo, tanto ao nível da direção do futebol como ao nível da
criação de infraestruturas ou ao nível de contratações, sem o que nenhum clube
do mundo consegue vencer sustentavelmente por longos períodos como fez o
presidente Azeredo.
E nós queremos vencer com SUSTENTABILIDADE!
O parágrafo desagua nos dias de hoje: tal como no tempo de Paulo Azeredo, o
Botafogo abandonou a vocação do erro. John Textor é o herdeiro direto de Paulo
Azeredo, o único ‘presidente’ que depois deste analisou o conjunto, pensou
global e tomou decisões acertadas, quer do ponto de vista de nomeações, quer do
ponto de vista de infraestruturas, quer do ponto de vista do marketing e da
projeção externa.
A última grande decisão chama-se Bruno Lage, treinador que, aliás, era a
sua principal opção quando contratou o ex-treinador em março de 2022, que só
não chegou nessa época porque era treinador do Wolverhampton.
Sobre Lage escrevi, no Mundo Botafogo, em 8 de julho, na publicação de
apresentação:
“Bruno Lage aposta sem receio nos
jovens, é capaz de mudar a forma de jogar de uma equipe, tem experiência não
apenas de dirigir uma grande equipe como também conhecer bem o futebol melhor
jogado em todo o mundo quando integrou os quadros de três clubes da Premier
League. […]
Dito isto, Bruno Lage é uma interrogação,
justamente porque se apresenta como um treinador com qualidades técnicas, e
quiçá pessoais, bastante interessantes, mas que ao assumir uma equipe disparada
na liderança de um campeonato sempre cheio de surpresas, arrisca-se a ser
execrado e enxovalhado pela mídia, pelos adversários e por boa parte da torcida
botafoguense se falhar o título. […]
Praticamente destinado a obrigar-se ao lema “veni,
vidi, vici” (cheguei, vi, venci), Bruno Lage tem um enorme desafio pela frente
no sentido de perceber rapidamente como se adaptar à sua nova realidade e
acomodar os interesses instalados, tendo como vantagem assumir uma equipe muito
bem preparada, com mentalidade vencedora, predisposta a fazer história e dispor
de uma torcida que certamente fará a diferença nas arquibancadas.”
Publicação completa em: Bruno Lage: predestinado ao lema “veni, vidi,
vici”?
Lage assumiu um grande risco, mas ontem afirmou que está no Botafogo para tomar
decisões e assumir riscos. Na torcida do Botafogo há uma franja de torcedores –
como em todas as torcidas – que reclama do tudo e do nada, que interpreta mal
seja o que for e de futebol percebe muito pouco. Vaiaram a equipe contra o
Patronato, quando a ideia era jogar com o regulamento debaixo do braço e expor
os jogadores o menos possível, poupando-os; após o empate com o Santos clamaram
na sua página “Pára de inventar!”
Mas Bruno Lage ‘inventou’!
Tal como ‘inventou’ quando tornou o Benfica campeão a jogar
espetacularmente após mudar a forma de jogar do Benfica ao mexer na posição de
Jonas e com isso reestruturar todo o modo de atacar benfiquista. Sucede que
Lage conhece muito bem Sauer, que jogou três anos em Portugal, tal como conhece
bem, pelas mesmas razões, Tiquinho Soares, Eduardo, Marçal, Gabriel Pires. E
ontem ensaiou uma espécie de novo ‘Jonas’, aproveitando as características de
Sauer e a sua boa capacidade de remate (mas anteriormente mal posicionado em
campo), mudando a frente de ataque do Botafogo e fazendo brilhar a grande nível
Victor Sá, Gustavo Sauer e o incontornável Tiquinho Soares – talvez o jogo em
que o tridente de ataque funcionou tão perigosamente e incisivamente desde que
John Textor se tornou acionista maioritário do futebol botafoguense.
Eu esperava de Bruno Lage uma de duas coisas (opostas): ou terminaria com
dificuldades como teve no Benfica e no Wolverhampton com duas lideranças de
balneário que o boicotaram devido a vaidades de jogadores, ou conseguiria
perceber onde estava e aplicaria aquilo que alguns designam como “treinador de
finas táticas”.
Ontem, mudou claramente o sistema de ataque do Botafogo, fazendo – segundo
as suas palavras – diminuir a típica ‘correria’ do futebol brasileiro, a qual
sempre tenho criticado devido ao desgaste e à consequente quebra dos sistemas
de jogo, favorecendo os clubes menos apetrechados tecnicamente, substituindo a
‘correria’ pela ‘velocidade inteligente’ associada à criatividade, usando o
jogo interior com discernimento em vez das loucas e maioritariamente inúteis
correrias de Luís Henrique e Júnior Santos.
Textor contratou um treinador que esquematizou o novo Botafogo coletivo,
resiliente e com mentalidade vencedora durante 15 meses; depois escolheu um
treinador interino que inteligentemente não mexeu na estrutura, recuperou
Carlos Alberto (que eu prefiro a Luís Henrique) e manteve um discurso alto de
vitória; seguiu-se finalmente um treinador ‘artístico’, capaz de novos voos se
a sua arte, engenho e sorte coincidirem.
O Botafogo precisava de um treinador com capacidade para altos voos, no sentido em que seria fundamental, a bem da equipe e do futebol, tornar-se um coletivo tecnicamente muito evoluído e muitíssimo perigoso. Ontem, Bruno Lage iniciou esse percurso ‘reinventando’ Gustavo Sauer e assumindo riscos, escolhendo, contudo, um cenário favorável para as suas intenções: um estádio abarrotado de gente apaixonada apoiando a equipe e, teoricamente, contra um adversário em que se o risco não tivesse sido ganho na primeira parte do jogo, sempre poderia, na segunda parte, implementar um plano B para ganhar a partida.
Contudo, importa acompanharmos atentamente a evolução do sistema tático e,
sobretudo, quem decide, melhorar diversos pontos ainda sujeitos a falha: Lucas
Perri avança demais na área, e à segunda tentativa tomou um gol daqueles que,
sendo muito bonito, não deveria acontecer; Philipe Sampaio perdeu de cabeça uma
jogada impensável, que iniciou o gol anulado do Coritiba; no jogo anterior
falharam Adryelson e Marçal em jogadas que não costumam falhar, etc. Além,
evidentemente, da melhoria de jogadores que, a continuarem, não podem ser tão
perdulários, como têm sido os pontas Júnior Santos e Luís Henrique, que correm
muito e falham muito.
Ontem, Lage foi o cérebro da vitória, Sauer o executante mais brilhante com
dois gols e uma assistência, Victor Sá o assistente perfeito para três gols e,
obviamente, o artilheiro do campeonato com dois oportuníssimos gols de cabeça à
moda de craque!
Alguém sugeriu que o ‘homem do jogo’ foi VÍTOR SAUER!!!
Os demais atletas fizeram globalmente um bom jogo (Cuesta, Tchê Tchê, Marlon
Freitas, Eduardo e até mesmo os mais ou menos execrados Philipe Sampaio e Di
Placido, etc.) e reforçaram o nosso inesperado e incrível domínio no futebol
brasileiro: ‘campeões do turno'; liderança com 12 pontos de avanço; 100% de
vitórias em casa; melhor mandante e melhor visitante; melhor ataque (juntamente com Palmeiras); melhor defesa
disparada; artilheiro do campeonato. É sonho ou realidade?!...
E principalmente a torcida tem sido abundante e espetacular!
Aparentemente as arbitragens estão se comportando diferentemente com o
Botafogo, sendo imparciais e justas nas suas decisões. Ao contrário de alguns,
considero que Tchê Tchê foi afastado da jogada com um braço nas costas e um
toque final de joelho, embora isso tenha ocorrido por prender demasiadamente a
bola.
Se Lage acertar nas suas ‘invenções’ e se os jogadores interiorizarem as
‘novidades’, teremos não apenas um Botafogo que galgou a liderança às vezes com
vitórias que exigiram muita doação e enorme capacidade de sofrimento face ao
caudal de jogo dos adversários, mas também um Botafogo soberbo, verdadeiramente
um terror não apenas para os clube menos apetrechados tecnicamente, mas também,
e sobretudo, colocando em sentido os Palmeiras, Flamengos e outros tantos que
seguem estes dois vice-líderes.
PORQUE O LÍDER CONTINUARÁ DISPARANDO!
PS: Talvez a torcida pudesse abandonar o ‘Olé’ que, nos dias de hoje, se mostra
claramente desrespeitoso do adversário. Já era antes, mas atualmente tornou-se
mais claro. Vencer com galhardia é bastante mais nobre e à altura dos
pergaminhos botafoguenses.
FICHA TÉCNICA
Botafogo 4x1 Coritiba
» Gols: Gustavo Sauer, aos 2’ e 45+2’, e Tiquinho Soares, aos 36’ e 50’
(Botafogo); Bruno Gomes, aos 8’ (Coritiba)
» Data: 30.07.2023
» Local: Estádio Olímpico Nilton Santos, no Rio de Janeiro (RJ)
» Público: 38.951 pagantes; 43.071 espectadores
» Renda: R$ 2.274.415,00
» Árbitro: João Vítor Gobi (SP); Assistentes: Fabrini Bevilaqua Costa (SP)
e Marcelo Carvalho Van Gasse (SP); VAR: Wagner
Reway (PB)
» Disciplina:
cartão amarelo – Eduardo (Botafogo) e
Natanael, Matheus Bianqui e Robson (Coritiba)
» Botafogo: Lucas Perri; Di Placido, Philipe Sampaio, Victor Cuesta e Marçal;
Marlon Freitas, Tchê Tchê (Danilo Barbosa) e Eduardo (Lucas Fernandes); Gustavo
Sauer (Matías Segovia), Tiquinho Soares (Janderson) e Victor Sá (Júnior
Santos). Técnico: Bruno Lage.
» Coritiba: Gabriel Vasconcelos; Natanael (Diogo Batista), Kuscevic, Henrique e
Jamerson; Bruno Gomes (Lucas Barbosa), Matheus Bianqui (Fransérgio) e Andrey;
Marcelino Moreno, Robson (Maurício Garcez) e Diogo Oliveira (Edu). Técnico:
Thiago Kosloski.
4 comentários:
Não sei por onde começar, exceto por ler mais uma vez, e isso e tem sido rotina, elogiar esse texto brilhante.
Dito isto, vou resumir o que achei ontem, pois me resta pouco a comentar.
1- finalmente o Botafogo se torna um clube profissional, e a gestão Textor tem sido exemplar. Ao ouvir uma entrevista de um empresário do ramo de patrocínio ele relatou que a mudança de atitude do Botafogo foi impressionante. Relatou que na época dos amadores a conversa era, vamos ver se isto é bom para nós referindo-se aos amadores. Hoje a pergunta é: vamos ver se isto é bom para o clube.
Sobre o jogo. Quando vi a escalação do Sauer pensei, o que será que o Bruno Lage pretende? E no jogo me deu a resposta, foi uma grande sacada utilizar o Gustavo Sauer encostando no Toquinho, fechando dentro da área pelo meio e utilizando o Di Plácido pela extrema.
2- Lage soube utilizar muito bem o nosso lado esquerdo com o Vitor Sá, que fez um partidaço
A impressão que me passou é que o BL estava ciente das fraquezas do adversário.
3 - não entendo as reclamações do gol anulado , foi correto, pois foi claro a falta no Tchê Tchê. No Fla 0X0Flu dois gols foram anulados exatamente porque na origem do lance houve falta,. Afinal o var serve exatamente para dirimir os erros de arbitragem, muito embora ainda seja muito controversa a sua utilização.
4- com o Philipe Sampaio em campo o Botafogo tomou 4 gols: 1 contra o Patronato 2 contra o Santos e 1 ontem. Anteriormente escrevi que não confiava no FS, muito embora não tenha sido uma partida desastrosa ontem,.mas urge contratar um zagueiro mais seguro.
5- sem querer desmerecer o trabalho do treinador anterior, muito pelo contrário, apesar da saída do fulano de tal ter sido da forma que foi, acho que o Bruno Lage é mais ousado e mexe na equipe mudando a maneira do time se comportar, ao contrário do treinador anterior que me parecia bastante conservador nas substituições. O Bruno Lage me parece ter uma leitura mais apurada do jogo.
6- concordo com você bebcim o Gerson Canhotinha, o Perri não deveria estar tão adiantado, eu achei que ele falhou no lance do gol, apesar de ter sido um arremate muito bonito, mas se o Perri tivesse 3 passos atrás pegaria a bola. Longe de mim criticar o Perri, pois o acho um goleiro muito bom, mas precisa corrigir esse defeito de ficar muito adiantado.
O Tiquinho ontem resumiu de forma muito simples as atuações do Botafogo: todo mundo se ajuda. O elenco todo está muito consciente do que tem que fazer e muito unido. Se continuar nessa batida creio que será campeão brasileiro.
Sobre o olé, eu acho que foi mais empolgação vida torcida do que atitude dos jogadores.
Sobre a torcida só tenho uma coisa a dizer: maravilhosa! ABS e SB!
Não tenho nada a dizer após as quatro primeiras linhas do comentário do Sérgio (E portanto do editor). A não ser lembrar que só vou começar contagem após a primeira rodada do returno. Passo a passo...
Que belos comentários, Sergio!
1. Todos amadores desde Paulo Azeredo, incluindo Bebeto de Freitas, embora pessoa de caráter, competente em diversos aspetos, mas amador também.
2. Fez algo semelhante no Benfica, mudou o modo de jogar ao reposicionar o Jonas, que se tornou artilheiro, recuperou 7 pontos ao Porto e foi campeão. Ontem, prescindiu dos pontas que corriam, corriam, e erravam, erravam e substitui-os por Victor Sá e Sauer, optando pela técnica em vez das correrias loucas de J. Santos e L. Henrique, ou até mesmo Carlos Alberto, embora eu goste mais dele do que dos outros dois. As correrias desgastam os jogadores, partem o jogo e beneficiam os adversários mais fracos devido a jogarem em contra ataque.
3. Também não, mas até amigos meus botafoguenses consideram que não foi falta. Quanto a mim foi, e se marcam falta noutros casos semelhantes, porque não ontem? Foi empurrado e tirado da jogada, claramente.
4. Sampaio melhorou bastante porque joga mais tempo, mas ainda assim não me infunde muita confiança.
5. É mais ousado e mais apurado tecnicamente, sem dúvida, mas não teria conseguido dar um ganho de mentalidade e postura tão vitoriosa como a que o ex-treinador conseguiu. A montagem da estrutura da equipe e dessa mentalidade vencedora é do ex. Mas creio que o Lage é tecnicamente melhor e mais criativo, segundo me parece e alguns amigos benfiquistas consideram. Vai dar asas para um futebol vistoso de uma equipe muito perigosa atacando.
6. O Perri tem que cuidar desse aspeto, mas na verdade ele ainda se está testando para encontrar as melhores posições em campo. Ontem avançou porque supostamente a bola iria para a frente, mas afinal foi para trás e o remate do Bruno Gomes foi muito imediato.
7 - Tiquinho sabe… Sobre o Olé, não me expressei bem. Na verdade eu referia-me às manifestações da torcida, não aos jogadores. Já emendei a frase para ficar mais claro.
Obrigado pelo gosto que teve pela crônica. Abraços Gloriosos.
Muito bem, Vanilson! Dia a dia, treino a treino, jogo a jogo! É isso mesmo!!!
Abraços Gloriosos.
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