por RUY MOURA |
Editor do Mundo Botafogo
José Luiz Rolim sucedeu a Carlos Augusto
Montenegro na presidência do Botafogo de Futebol e Regatas em 1997. O Clube
vinha de um ciclo vitorioso iniciado com os investimentos de Emil Pinheiro que
valeram o fim do jejum de 21 anos sem títulos oficiais, conquistando o
bicampeonato estadual de futebol em 1989 e 1990, a Copa Conmebol em 1993 (único
título internacional oficial à época), o campeonato brasileiro em 1995 e a Taça
Cidade Maravilhosa em 1996 (um estadual que a FERJ nunca quis reconhecer).
A nova Administração eleita para o triênio
1997-1999, encabeçada por José Luiz Rolim não desmereceu em matéria de títulos,
conquistando vários troféus de futebol entre 1997-1999 (além de diversos
títulos em outros desportos): Taça Guanabara (1997), Taça Rio de Janeiro
(1997), Campeonato Estadual (1997), Torneio Rio-São Paulo (1998), Campeonato
Estadual de Juniores (1997) e (1998), Taça Belo Horizonte de Juniores (1999),
Copa Rio Juvenil (1999).
Emblematicamente este ciclo vitorioso
encerrou-se com a perda Copa do Brasil de 1999, por obra e graça do árbitro
Márcio Rezende que anulou dois gols legítimos ao Botafogo no jogo de ida, no
Rio Grande do Sul, que lhe dariam a vitória por 3x2 e o resultado de 0x0
registrado no jogo de volta no Maracanã teria sido suficiente para o título
morar em General Severiano.
Apesar das dificuldades financeiras já
sentidas desde a gestão de Carlos Augusto Montenegro, e que se agravaram, a
Administração de 1997-1999 pode-se considerar desportivamente vitoriosa e
lançou, também, o debate sobre o ‘futebol empresa’, já que José Luiz Rolim
vislumbrava a inevitabilidade do investimento privado, sem contudo perder o
controlo do futebol.
Após o desastre da Administração de Mauro Ney
Palmeiro (2000-2002), que conduziu a uma dívida financeira à beira da
bancarrota e à 1ª descida da equipe de futebol à Série B do campeonato
brasileiro, o presidente Bebeto de Freitas (2003-2008) prosseguiu com o assunto
para criar a Companhia Botafogo, reestruturar a dívida e relançar a equipe de
futebol novamente na disputa de títulos.
Porém, somente em 2022 o assunto foi definitivamente
concretizado, não como previsto inicialmente, em que o Botafogo não perderia o
controlo do futebol, mas sim com a perda de controlo, já que John Textor
adquiriu 90% da SAF Botafogo.
As questões de ontem permanecem de certo modo
presentes, designadamente quando José Luiz Rolim escreveu que “esse negócio chamado futebol profissional
[…] só vale, respeitada a nossa cultura,
as nossas tradições. […] Pelo menos
no BOTAFOGO, nós não aceitamos diminuições. Se alguns outros se deixarem
seduzir, rezemos por eles.”
Claro que o mundo mudou, o futebol mudou, o
empresariado tornou-se mais agressivo, avançou em força pelo maior negócio
desportivo dos nossos tempos e tomou conta de muitos clubes, tanto os que já
eram colossos mundiais como aqueles cujas dificuldades financeiras não seriam
supridas sem o investimento privado.
Apesar de decorridos 27 anos sobre as
palavras de José Luiz Rolim, a verdade é que as palavras do então presidente do
Glorioso se mantêm na ordem do dia no que se relaciona a respeitar a nossa
cultura, as nossas tradições, as nossas glórias e não sermos diminuídos por
outros interesses alheios ao nosso Clube.
Segue o texto de José Luiz Rolim, que –
apesar da ‘idade’ – pode servir de reflexão aos nossos torcedores e a John
Textor e sua equipe acerca de ética e conduta a implementar no nosso amado
Botafogo.
Futebol empresa. Por
que sim?
por JOSÉ LUIZ ROLIM,
Presidente | Editorial da Revista Oficial do Botafogo de Futebol e Regatas, nº
252/98
Acervo de ANGELO SERAPHINI gentilmente cedido ao Mundo Botafogo.
«Primeiro,
porque a Lei manda. A Lei 9615 (Lei Pelé, de 24/03/98) determina no seu Artigo
27 que as “atividades relacionadas a competições de atletas profissionais são
privativas de sociedades comerciais” e adiante no Parágrafo Único estabelece
que as entidades que infringirem qualquer dispositivo da Lei terão suas
atividades suspensas. O Artigo 94 nos dá o prazo de dois anos para essa
adaptação.
O BOTAFOGO, antes
mesmo da Lei, percebendo a inevitável caminhada para esse destino, organizou um
encontro em dezembro de 97 para examinar alternativas. Fomos os primeiros a
mostrar essa preocupação mas não tem sido precipitados para tomar a decisão.
Constituí e coordeno
no âmbito do Conselho Diretor, um grupo de trabalho para o exame competente
desse dilema: “como entrar na era do profissional sem entregar a nossa honra, a
nossa história, as nossas glórias”.
O BOTAFOGO é mesmo um
clube privilegiado. Conto com o talento de juristas de peso como os Drs. Sebastião
Figueira, Hugo Ibeas, Alberto Macedo, além dos Drs. Luiz Octavio Vieira e
Ricardo Macieira.
Temos tido, vez por
outra, a ajuda do Dr. Montenegro, um dos maiores entusiastas da idéia e, com
certeza, ainda teremos mais, até porque, sabe bem como é difícil administrar
sem receitas, especialmente nesses tempos em que folhas de pagamento correm
celeremente para a casa do milhão.
A questão essencial
é: “Ser competente para engrandecer o BOTAFOGO sem jogá-lo na vala comum dos
negócios de mercado”.
Essa premissa já nos
fez repudiar várias propostas, justamente por pretenderem comprar o nosso
BOTAFOGO.
Hoje tanto os Clubes
como os investidores já aprenderam muito com a evolução das tratativas. No
Brasil, esse negócio chamado Futebol profissional é diferente. Só vale,
respeitada a nossa cultura, as nossas tradições.
Não temos medo das
negociações porque nós somos competentes.
Quando tivermos que
decidir, o grupo de trabalho, de homens competentes, honrados e, sobretudo,
Botafoguenses, não irá ao Conselho para ensinar o Canto da Sereia.
Não corremos riscos.
Isso é coisa do passado. Do tempo em que grupos representantes do Capital não
haviam percebido que, pelo menos no BOTAFOGO, nós não aceitamos diminuições. Se
alguns outros se deixarem seduzir, rezemos por eles.»
7 comentários:
Agora o amigo ativou gatilhos em diversas camadas na minha memória botafoguense, rs... O período do Rolim foi justamente aquele em que passei a perceber alguns meandros do futebol que antes para mim vivia apenas no lúdico. Talvez a melhor definição deste presidente foi a que ouvi de um colega numa daquelas vitórias por placar mínimo (1-0, 2-1) que eram típicas de sua gestão: "Esse cara é o Maluf do Botafogo, ele rouba mas faz". Não tenho provas nem estou a acusar ninguém de nada, até porque nenhum processo ou auditoria - que eu lembre - sequer foi aberto contra o mesmo, tendo sobrado tudo no colo da (PAVOROSA) gestão Mauro Ney Palmeiro, mas que o Estadual de 1997 e o "pesado" Rio-São Paulo de 1998 (já expliquei diversas vezes aqui e no Datafogo o porquê) foram conquistas bem apreciáveis e apreciadas na altura, bem como a campanha "a la Botafogo" na Copa do Brasil de 1999.
Agora esta questão do clube-empresa ter sido discutida da altura do Rolim é para mim novidade. Talvez pela circulação da informação na época ser mais restrita, tempos pré-internet, o mais próximo deste sentido que eu tivera conhecimento fora o esquema (e é este o termo) do Banco Excel Econômico. Depois surgiu aquela conversa da Hicks Muse, acho que aventada pelo Montenegro para eleger o Mauro Ney, que virava cortina de fumaça toda vez que parecia que o time ia cair, até que despareceu quando a tragédia aconteceu em 2002.
Foi uma boa gestão desportiva entre 1997-1999. Sobre o comportamento financeiro do Rolim nada sei, mas sei que os défices se agravaram de diretoria para diretoria até chegar ao Bebeto de Freitas. Gostava muito de saber porquê. CA Montenegro deve conhecer todas as histórias, já que à excepção do Bebeto de Freitas as demais diretorias tiveram o seu beneplácito. Aliás, na sanha de não perder a influência sobre o Clube agarrou-se ao Textor.Enfim...
Abraços Gloriosos.
Depois que conheci como funcionava o ambiente de General Severiano - e isso já conta-se exatas duas décadas - tomei verdadeiro nojo da política, bastidores e 'camaradagem' do clube. Desde então só voltei uma vez à GS, mesmo assim como cortesão de uma amiga que queria conhecer o clube, ainda na gestão Bebeto. Deixei de ter interesse em tornar-me sócio, que até então era um sonho de juventude, e só tive algum ânimo - que não durou mais que um par de anos - no tempo da gestão CEP. Estas dívidas e números das gestões antigas nós jamais iremos saber, até porque, SE houve ilicitudes, estas certamente já prescreveram. Ademais, com o amigo bem referiu, depois da consolidação da SAF o clube associativo tornou-se um híbrido de museu com clube social anacrônico e decadente orbitado por fantasmas de um passado que consistia em autobajulação e sinalização de virtude.
Lembra-me bastante o clássico do Luis Buñuel chamado "O Discreto Charme da Burguesia", rsrsrs. Prefiro continuar a torcer 'de longe', como já faço desde o tempo do Muffarrej. Como dizia aquela música antiga: "Longe dos olhos, mas perto do coração". O Botafogo é poesia pura!
Frase que sinteteza fenomenalmente o meu próprio pensamento: "depois da consolidação da SAF o clube associativo tornou-se um híbrido de museu com clube social anacrônico decadente orbitado por fantasmas de um passado que consistia em autobajulação e sinalização de virtude." Uma pena porque o verdadeiro clubismo é social e desportivo.
E genial a lembrança d'O Discreto Charme da burguesia!
Abraços Gloriosos.
Ruy,
Pelo que se soube, quando Bebeto assumiu, tinham sumido os computadores que, teoricamente, continham as informações sobre as finanças.
Saudações Gloriosas!
Émerson.
Esclarecedor, Émerson... Parece que quando Bebeto chegou não havia sequer dinheiro para materiais de uso corrente. Porém, creio que a velha oligarquia continua a dominar o Botafogo Social.
Abraços Gloriosos.
Adenda: antes os erros e os equívocos de Textor do que estarmos sujeitos a gente do passado no que respeita a futebol.
Abraços Gloriosos.
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