por LÚCIA SENNA, escritora e cantora
escrito para o blogue Mundo Botafogo
Acabo de constatar que
ando completamente desatualizada. Não sei mais do mundo e o mundo não sabe de
mim. Mas… como assim?
Acordo cedo, leio os
jornais, vou além das manchetes, leio os artigos de fundo e todos os editorias.
Sou assinante de algumas revistas importantes, leio sobre política, economia,
gastronomia, o Caderno B, C , D e sei lá mais o quê. Leio o Caderno dos Esportes, o Boa Chance, os Classificados e, a partir de agora, por me saber desinformada,
incluirei até mesmo o Obituário – de
repente, quem sabe, já morri e nem me dei conta.
Apesar, meus amigos, de
toda essa gama de informações, afirmo com precisão: não estou atualizada não!
Além da minha
resistência de aderir às redes sociais, de comprar em lojas virtuais, de
colecionar selfs nada originais e de
muitas otras cositas más, confesso,
com algum constrangimento, que ainda não ando correndo pelas ruas da cidade
para caçar Pokémons.
Uma coisa é certa: se, hoje em dia, não caças Pokémons, meu
caro, és figurinha totalmente fora do baralho. Na escola, estás fadado a sofrer
bulling, trotes e com as garotas não
terás sorte. É a maldição dos monstrinhos! E há boatos que a segunda geração
deles já está a caminho.
Considero tudo isso uma
verdadeira maluquice! E uma maluquice universal!
Aqui cabe com perfeição
uma citação genial de Raul Seixas: “Pare o mundo que eu quero descer”.
Eu também quero, Raul, pois
tenho também muitas e muitas queixas.
Tomei conhecimento de
uma matéria sobre uma livraria em Paris, situada no Quartier Latin – conhecido
ponto de encontro de intelectuais – onde, acredite, não existe um livro sequer.
No lugar deles, apenas uma impressora que os imprime em tempo recorde. A pessoa,
ao entrar, é imediatamente apresentada a uma espécie de cardápio contendo mais
de cinco mil títulos. Depois de escolhido o livro desejado, é só aguardar por
alguns minutos e sair com seu exemplar debaixo do braço. Surpreendente, não é
mesmo? Tudo muito prático. Tudo muito rápido e eficiente.
Tudo sem poesia, sem
sabor, sem cor. Sem nenhuma ludicidade!
Sou taurina, regida por
Vênus, deusa da beleza na mitologia romana. Preciso do toque, dos cheiros, do visual,
enfim, tudo deve responder aos meus mais
aguçados cinco sentidos. Se assim não for, nada fará muito sentido. Uma livraria onde não há livros a serem
manuseados, explorados, tocados, onde não sentimos o delicioso e quase sensual
cheiro de papel fresco, fica muito a desejar...
Ah!... o aroma dos
livros, simplesmente irresistível.
Uma livraria há de ter
vida pulsando, pilhas e pilhas de livros com suas capas exuberantes e títulos
que, de tão atraentes , nos convidam a abri-los e agarrá-los pelas orelhas na
tentativa de ouvi-los, adivinhá-los e nos encantarmos de vez.
Imaginem, meus senhores,
se a moda pega? Teremos, então, ao invés do prazer lúdico, o monótono e
entediante barulho de uma impressora austera e irritante.
Já disse em algum
momento que estou longe, muito longe, de ser uma xiita radical. Muito pelo
contrário. Sou fascinada pelos avanços da tecnologia, adoro um smartphone e considero os aplicativos essenciais para nos
ajudar a resolver alguns problemas simples do nosso dia a dia.
Mas, por favor, me peçam
qualquer coisa, mas não procurem me convencer que há algum prazer em entrar em
uma livraria onde só existe uma impressora e nada mais. Preciso demais ter
livros de verdade nas minhas estantes não virtuais.
Quanto sair pelas ruas,
aderindo à febre universal de caçar Pokémons, ainda que eles se encontrem nos
lugares mais inusitados da cidade, só
tenho uma coisa a dizer: desculpem, meus caros, mas tenho mais o que fazer.
12 comentários:
concordo plenamente com sua cronica pois também nao sou adepta a caçada de pokemons...rs voce conseguiu expressar de uma maneira super divertida aquilo que realmente acontece.
Parabéns e continue a nos entreter com seus maravilhosos textos.
Logo que o mundo parasse, descerias não,
Uma das coisas que sei por antecipação!
Craca da vida, craque perfeita nas crônicas,
Impecável no palco com um samba-canção,
A imortalidade entre as vocações agônicas,
Mandarias, da “boléia”: retorna a girar!
Apesar de estar, dizes, desatualizada,
Revolucionas, pioneira, a mulherada,
Intimidas alguns homens de forma sem par:
Ao viveres sempre um tanto desajuizada!
Sobre os livros, tu edificas a tua igreja,
Eletrônicos, pra bobos caças-Pokemons,
Numa maluquice que, aos acharem, festeja,
Na certa provando, de cuca, não são bons;
Ah, não entendo como esse pessoal não se peja!
Conquistada pelas livrarias, os e-books,
Ostentação me parecem, só e nada mais...
Sou do canto, sou das festas e sou dos new looks,
Tudo, pra mim, bastante emocionante, demais,
Ao limbo, ao purgatório, os spans, os facebooks...
Sergio Sampaio, www.umpoetinha.com.br
Amiga, partilho de cada palavra sua. Embora tenhamos que acompanhar a fulminante evolução dos tempos, a vida sem Pokémons e com livros que possamos "agarrá-los pelas orelhas" é infinitamente mais rica, mais calorosa, mais criativa, mais poética. Beleza de crônica! Muito orgulho de você, da sua infinita lucidez. Parabéns! Maria Inês Galvão - jornalista e escritora.
Nunca vi coisa mais certa: realmente um verdadeiro absurdo essa historia da caçar
Pokemóns. Achei a crônica muito atual e com muito senso de humor.
Maria de Lourdes Coelho
Pois é, tanta coisa interessante para se fazer...
Passar o fim de semana caçando Pokémons é surreal!
Parece até piada.
Obrigada pela participação
Abraços
A vida real era bem mais divertida. Chego a pensar que o mundo- em alguns aspectos-
involuiu. Final de semana agarrávamos a vida pelas mãos, braços e... pernas pra que te quero :saíamos para dançar, cantar e namorar. É bem verdade que, às vezes, fazíamos amizades com uns garotos meio " maluquetes'. Seriam eles Pokémons não virtuais dos nossos tempos de adolescência ? Vai saber... kkkkkk
Bjs, minha queridona
Temos que colocar sempre uma pitadinha de humor nos nossos textos.
O paladar agradece e a vida também!
Obrigada pelos gostosos elogios.
Abraços
Adoro teus acrósticos, Sérgio.
Traças um diagnóstico genial sobre algumas das minhas características : sou mesmo
do canto, das festas, sou cigarra , mas...não levo a vida na flauta. Minha parte
formiga existe e é bem forte. Aliás, acabo de escrever uma crônica sobre Cigarra e
Formiga. Quem sabe um dia sairá aqui publicada ? Nosso querido editor, Ruy Moura,
é quem decidirá.
Muito obrigada pela poesia. Espetacular!
Um grande abraço.
Como sempre adoro ler as crônicas da escritora Lucia Senna. Geralmente é a síntese do que eu sinto. Eu também sou super desatualizada, mas, com certeza, não pretendo continuar assim, já acho que estou ficando ultrapassada. A caça aos Pokémons nem motivação tenho ainda pra pensar, não sei mais tarde. A adorável crônica da Lucia fala do que sinto. É muito bom. Parabéns! Bjs. Sonia Costa
Obrigada, Sônia, pelo teu ótimo comentário.
bjs.
Tenho um filho de 13 anos que só quer saber de caçar Pokémons. Acabei indo na onda dele
e, confesso, que achei divertido. Sei que é maluquice...mas, cronista, uma maluquice a mais ou a menos nesse mundo do besteirol , não vai fazer diferença.
Gostei do texto; você me fez rir.
Abraços,
Realmente tens razão, caro leitor(a). O mundo está repleto de besteirol e caçar Pokémons
não vai mesmo fazer nenhuma diferença.
Mas, amigo(a), acho que vais concordar comigo que o tema é ótimo para ser explorado numa crônica, não é mesmo?
E se tu encontraste motivo para rir, já me dou por satisfeita (KKKKKKK )
Um grande abraço.
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