quarta-feira, 18 de novembro de 2009

João Moreira Salles: do que ele gosta mais


O cineasta e documentarista João Moreira Salles nasceu no Rio de Janeiro, em 1962, e a sua consagração aconteceu a partir de “Notícias de uma guerra particular” (1999), seguido de “6 histórias brasileiras” (2000). Em 2002 produziu “Nelson Freire” e em 2004 “Entreatos”. Salles possui a particular característica de ser um daqueles torcedores botafoguenses que emociona profundamente os outros ao falar sobre a sua paixão alvinegra.

O cineasta conviveu com João Saldanha durante a sua infância e, apesar de a família ser botafoguense, ele tornou-se botafoguense porque o jornalista, frequentador da sua casa, lhe contava histórias maravilhosas do Glorioso. Porém, tornou-se fervoroso torcedor apenas nos anos 80, por volta dos seus 20 anos, quando a equipa não ganhava nada e era composta por Wecsley, Perivaldo, Cremilson, Jerson e outros.

Nesse período de desterro, poderia ter escolhido ser do flamengo, ou qualquer outro clube que estava na mó de cima à época. Mas os argumentos de João Salles são demolidores para aqueles que preferem a facilidade de escolher clubes de maioria, protegido por arbitragens e regularmente ‘levados’ a títulos.

Eis as palavras do próprio cineasta acerca da sua escolha: – “O Botafogo não ganhava nada, foi seu período de desterro: ele levou 21 anos para ser campeão. Eu acho interessante estar na contra-mão, ser da minoria. No estádio, o Botafogo é sempre o que tem a menor torcida, mas ela é a mais interessante de todas, porque é fanática sem receber nada em troca, porque o time geralmente não ganha. É uma torcida desesperada, mas muito apaixonada, e isso é muito bacana.”

Este posicionamento, que é muito semelhante ao do editor deste blogue, transmite exatamente a alma dos botafoguenses, que são diferentes de muitos outros torcedores – e não populistas, como dizia Sérgio Augusto. Os botafoguenses preferem o risco, o desconhecido e o exercício de uma alegria bem diferente dos clubes da maioria. Eis novamente Salles falando: – “Quando o Botafogo ganha, a alegria vem com uma intensidade muito maior do que a dos outros times. Foi assim em 1989, quando o Rio viveu uma explosão de alegria que só se compara, em intensidade, à tristeza com a perda da Copa de 1982.”

Salles confessa que “é fácil torcer pelo flamengo, pertencer à maioria. Ser Botafogo, não: desde a escola, é uma afirmação de identidade. Significa ter opinião própria, não seguir a moda. Por isso, acho que o torcedor do Botafogo é um torcedor de fibra moral. Ser botafoguense te ensina muitas coisas a respeito da vida.”

O cineasta considera que o interessante de uma equipa que não ganha sempre é que quando ganha tem a sensação que jamais algum flamenguista terá: – "A gente não banaliza a vitória; a vitória é uma coisa muito rara – e, quando ela acontece, eu duvido que alguém sinta a alegria de um botafoguense. A felicidade que eu senti quando o Botafogo foi campeão em 89, depois de 21 anos, eu duvido que algum torcedor de futebol sinta igual. Isso justifica minha paixão pelo time pelo resto da vida, mesmo que ele nunca mais ganhe nada.”

Sobre os rivais, os argumentos de Salles também são muito interessantes. Sobre o flamengo: – “Eu não quero que o flamengo morra, não. Mas eu quero que o flamengo perca.” E sobre o fluminense: – “Fiquei feliz quando o fluminense perdeu a Libertadores. Se eles ganhassem, seria como o rapaz que sempre cortejou uma moça, mas nunca teve chance de casar com ela, porque ela nunca te deu muita bola. Aí de repente o seu vizinho consegue namorar e noivar com ela, está prestes a casar. Lógico que, nesse caso, você prefere que ela case com um estrangeiro, que vem do Equador para levá-la, do que com o cara que está do seu lado e vai ficá-la exibindo o tempo inteiro.”

Acerca das características dos botafoguenses, o cineasta escreveu, em 1995, durante o campeonato brasileiro, um texto intitulado “Pelo menos fomos péssimos”, o qual falava de um jogo do Botafogo contra uma equipa paulista, talvez o próprio São Paulo, refere o cineasta.

Salles conta a história referindo-se a um jogo no Caio Martins, o qual, supostamente, o Botafogo ganhava ao São Paulo por 4x0 e o marcador passou a 4x1. Mas, observando-se os resultados daquele ano, esse jogo deve ter sido contra o paulista Guarani, ao qual ganhávamos por 3x0 quando eles diminuíram para 3x1. Conta Salles: – “Quando deu mais ou menos 31 minutos do segundo tempo, o São Paulo, numa falha da nossa defesa, fez 4 a 1. Do meu lado, um pai falou: ‘Meu filho, acabou!`. O filho começou a chorar, o pai começou a bater no alambrado, dizendo: `Eu não agüento mais esse time, isso aqui é um horror, eu vou abandonar o estádio!`. E o que é mais estranho é que ninguém achou isso estranho. Todo mundo começou a reclamar, achando que o Apocalipse estava ali e que, em mais dez minutos, o São Paulo viraria o jogo. É claro que acabou 4 a 1, mas isso é típico do botafoguense. E isso é o que eu acho interessante.”

Salles evidencia tudo aquilo que a torcida maioritária do Rio de Janeiro nos inveja: a ousadia de escolhermos na contra-mão, a capacidade de pensarmos por nós próprios, a altivez do nosso orgulho mesmo quando não ganhamos, enfim, de nos configurarmos como uma verdadeira elite clubista.

Por tudo aquilo que somos é que, de entre todas as frases e ideias interessantes de João Moreira Salles acerca do nosso Botafogo, a sua frase definitiva merece uma lápide:

“Gosto de muitas coisas na vida. Mas, das coisas que eu gosto muito, a que eu mais gosto é o Botafogo.”

Fontes principais:
http://www.cinemaemcena.com.br/Entrevista_Detalhe.aspx?ID_ENTREVISTA=25

14 comentários:

wellingtondodo@hotmail.com disse...

Sou botafoguense há pouco mais de 12 anos por conta própria e mais 10 por meu pai, e vendo esses relatos fico ainda mais convicto que, de todas as coisas que meu pai me deu a melhor, sem dúvidas foi me apresentar O Glorioso.Grande Abraço, Wellington

Gil disse...

Rui,
Mais um texto que vai para minha coletânea!
Torço para que os ilustres torcedores, como o João Salles, algum dia se unam para resgatar o nosso amado BOTAFOGO.

QUEREMOS O NOSSO BOTAFOGO DE VOLTA!

Espero que não estejas tão mal (como dissestes) com a classificação de Portugal!
Vi e torci pelos irmãos de além mar!

Parece que foi ontem (40 anos), que o Pelé fez o milésimo gol!

Abs e Sds, BOTAFOGUENSES!!!

Rafael Barangertusen disse...

Irmãos de Camisa,

Domingo temos mais uma decisão: Botafogo x São Paulo.

Durante a semana vimos diversas reportagens sobre a reta final do brasileirão. O que não poderia ser diferente, pois o campeonato está realmente emocionante; pena que para nóz a emoção esteja associada a aflição, e depois do jogo contra o Barueri muitos dão como certa a queda do Botafogo, inclusive vários botafoguenses...e é nessas horas meus irmãos é que temos que mostrar a nossa força, NOSSA FORÇA SIM!!!, quando cantamos "...E NINGUÉM CALA ESSE NOSSO AMOR E É POR ISSO QUE EU CANTO ASSIM É POR TI FOGO...", queremos dizer que aconteça o que acontecer o nosso amor pelo GLORIOSO BOTAFOGO DE FUTEBOL E REGATAS nunca ira acabar. E o momento é agora meus irmão, quando ninguém mais acredita é que temos que chamar a responsabilidade, gritarmos aos jogadores "EU ACREDITO". Por isso peço aos irmãos que ocupam esse espaço que esqueçam os jogadores, diretoria, comissão técnica e pensem unicamente no Botafogo, no que representa o Botafogo nas suas vidas; as suas Glórias, os Craques que por ali já passaram, nesse escudo que é o mais lindo do mundo, nos seus filhos que você tanto quer que tenha o mesmo orgulho que você tem ao vestir essa camisa linda.

Vamos ao jogo, vamos levar nossa bandeira, nossa alegria, nossa emoção (sem razão), nossa confiança, nossa garganta, nosso grito, nosso peito, nossa raça, nosso gol, vamos abraçar aquele amigo que está ao nosso lado, que nem conhecemos, mas que naquele momento é sim seu grande amigo talvez o melhor amigo, vamos ao jogo galera alvi negra, vamos torcer como nunca e nos emocionar como sempre.

Não existe o depois o momento é agora, não espere o amanha para mostrar sua paixão

e como diz a música do compositor e cantor Geraldo Andre "...Vem vamos embora que esperar não é saber quem sabe faz a hora não espera acontecer..."

Ruy Moura disse...

Caro Sebastião, já lá fui ontem. É um blogue variado e interessante. O tema que refere daria muito 'pano para mangas' e pode ser muito explorado, já que 'financiar a ausência de idoneidade' parece que é arte de muita gente que anda no futebol. Não acontecem coisas tão escandalosas noutras modalidades. Seria muito interessante construir um grupo nacional de pessoas dispostas, e com capacidades, para desmistificar tudo isso. Explorar um a um cada caso, publicitar nomes de intervenientes, não deixar de apontar todos os envolvidos em casos claros de benefício de clubes em campo - e fora de campo se isso for possível. Haverá alguém suficientemente descomprometido, suficientemente amante do futebol e suficientemente capaz de enfrentar os inimigos da justiça no futebol?...

Se as sociedades não possuírem cidadãos desses, não se pode queixar das prepotências de que são alvo - é a própria ineficácia e facilitismo dos cidadãos que promove os laxismos nacionais.

Abraços Gloriosos!

Ruy Moura disse...

Parabéns, Wellington! Sem dúvida que o seu pai lhe deixou um património bem vivo, um património de honra e ética, que durou pelo menos uns 80 anos depois de 1894 e cujo conteúdo é capaz de servir de guia aos homens. Por isso também precisamos de reverter este Botafogo que nas últimas décadas tem andado excessivamente ao sabor da vontade interesseira dos homens e não corresponde à nossa identidade clubista.

Abraços Gloriosos!

Ruy Moura disse...

Gil, me espanta que haja tantos botafoguenses interessantes e com peso 'político' no país e não se unam num grupo-força nacional ('task-force') para resgatar o Botafogo das mãos de quem anda desde 1992.

Sobre a seleção portuguesa: há momentos que é preciso deixar cair as coisas para que elas mudem; e é 'patriótico' não apoiar os 'esquemas' nem os homens que não interpretam a honra e a ética. Ser 'patriota' não é torcer sempre, mas torcer num certo contexto e numa certa direção. Não gosto do contexto do futebol português (nem do brasileiro), e considero os dirigentes muito abaixo do nível médio que deviam possuir (tal como no Brasil). Por isso, confesso que só tenho torcido com convicção pelo Botafogo e pelo Sporting. Sinceramente, como a scoisas estão, interesso-me muito menos pelas seleções de Portugal e do Brasil do que pelo Botafogo e pelo Sporting que são clubes com uma ética muito diferente do que nos rodeia.

Mas, enfim, lá teremos Brasil e Portugal no mundial. Em termos de cultura 'lusófona' teremos muito por onde torcer no mundial... Ou por onde 'contorcer'...

Abraços Gloriosos!

Ruy Moura disse...

Excelente texto, Rafael. Vou utilizá-lo em parte neste blogue no sábado, se não se importar.

Creio que temos que nos unir muito para duas coisas: para apoiar até ao dia 6 'este' nosso Botafogo nesta reta final, e difícil, deixando de lado as críticas aos que nos têm destruído; para apoiar, a partir de dia 6, aconteça o que acontecer, todas as ações que visem demitir os atuais dirigentes.

Até lá seremos todos um único corpo comandados por uma única alma: a inigualável ALMA BOTAFOGUENSE!

Abraços Gloriosos!

Guilherme disse...

O João consegue transmitir o que é a essência de ser botafoguense.
Rui, parabéns pelo magnífico post. Vamos torcer para que as palavras do João inspirem e motivem a torcida pois nessa reta final de campeonato precisaremos apoiar o time.

PS. Se alguém tiver o texto completo do conto citado no post “Pelo menos fomos piores” por favor me encaminhe por e-mail pois não encontrei na internet. Obrigado!

Ruy Moura disse...

É isso mesmo, Guilherme. Apelo a todos os blogueiros que incentivem a equipa e a ida ao estádio. Trataremos dos nossos problemas depois.

PS: Eu também não consegui encontrar o texto a que se refere o João Salles. Se alguém tiver, envie, por favor, para mundobotafogo@gmail.com

Obrigado! Abraços Gloriosos!

Ruy Moura disse...

O Mauro Axlace deixou um extenso comentário que eu não validei na moderação porque puxei o seu comentário para artigo do blogue (já postei).

Quero agradecer-lhe os parabéns que me enviou e aproveito também para enviar os parabéns ao seu filhote de seis anos, que aniversariou um dia depois de mim.

Esse filhote é muito inteligente ao querer uma festa do Botafogo no ano que vem!!! Tão esperto, percebe-se logo que é mais um que nasceu... Glorioso! rsrsrs...

Abraços Gloriosos!

Anónimo disse...

Rui:

Belíssimo texto. O João realmente exala BOTAFOGO. E descreve muito bem a personalidade botafoguense. Como também o faz você.

Peço permissão pra contar um historinha:

Estava eu com alguns amigos, tomando uns chopes, quando chega o Chico de um jogo da urubuzada no Maracanã. Com a arrogância típica dos inseguros (Fazer o quê? É uma defesa deles...), que se protegem nas maiorias, bradou:
"Nós temos a maior torcida do mundo!".

Olhei pro lado e percebi o garçom chegando:
"Tem Ballantines 15 anos?", perguntei.

E o garçom: "Não".

Virei pro Chico:
"´Tá vendo, otário? Coisa boa não tem em qualquer lugar..."

Assim são eles: pardais aos milhares em torno de raros rouxinóis.

Abraços,
Marcelão

Ruy Moura disse...

Marcelão, quero dizer que o seu comentário é magnífico porque... é exatamente isso!...

É a imbecilidade de resguardo nas maiorias; por isso, na generalidade, essas pessoas são covardes, porque não estão habituados a lutar sozinhos esgrimindo as suas capacidades, só atacam em maioria, nem têm a mínima noção que entre o 'mais' e o 'melhor' foram sempre os melhores que fizeram o mundo avançar. Os 'mais' limitam-se a ir atrás; os 'melhores' são os faróis-guia, os que tornam a vida uma arte. Até o comunismo, veja-se!, foi implantado por uma minoria esclarecida, não por operários e camponeses que se limitaram a seguir os líderes...

Além de tudo, a distinção entre 'mais' e 'melhor' existe precisamente porque é a existência deles, tal como a concebem, que fez nascer a necessidade de distinção. Jamais haveria 'melhores' se eles não conduzissem as suas vidas como conduzem...

É engraçado ter pedido whisky de 15 anos, porque quando quero expressar o mesmo que o Marcelão, peço vinho do Porto com... 30 anos! rsrsrs...

Abraços Gloriosos!

Irresponsabilidade Civil disse...

Agora é a hora.
Moreira Salles, eu te agradeço por tudo.
Que o Botafogo volte a ser Glorioso.

Ruy Moura disse...

Esperemos que seja a hora. Se os Salles avançarem é preciso ter um grande controlo sobre quem vai gerir, porque se uma nova gestão se apoderar das finanças do Botafogo como antes se fez, então será, definitivamente, o fim do Clube. É urgente alguém verdadeiramente sério a geriro Clube para lhe devolver a Grandeza.

Abraços Gloriosos.

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