Aurélio Moraes, jornalista, botafoguense
[Nota de Mundo Botafogo: Entendo que não devo me envolver no que se está
passando na sociedade brasileira em artigo da minha autoria, porque embora eu
seja culturalmente luso-carioca, formalmente não exerço direitos cívicos e
políticos no Brasil, não estou completamente a par da complexidade dos
movimentos sociais em curso, nem este blogue tem natureza cívico-política, mas
desportiva e botafoguense. Assim, recorro ao meu amigo Aurélio Moraes,
jornalista, botafoguense, que publicou no seu blogue este artigo eminentemente
cívico e que me parece de alcance universal. É a minha forma de cooperar com o
seu profundo apelo à ‘cidadania completa’ no artigo que publicou.]
A recente onda de
manifestações que tomou o país é o reflexo de uma sociedade que não conseguiu
educar para a cidadania diária seus milhões de habitantes. A grande pauta de
reivindicações mostra que o brasileiro não está participando da vida política
do país com a intensidade necessária.
É compreensível que
as pessoas peçam o “fim da corrupção”, mas há de lembrar-se que a mesma é
praticada no dia-a-dia por milhões de pessoas, quando o cidadão estaciona o
carro em vaga de deficiente, sonega impostos, tenta obter pequenas vantagens
ilícitas, etc. Precisamos de um currículo escolar que contemple aulas de
cidadania, ensinando desde cedo que o político corrupto veio da massa homogênea
da população.
Saber o papel do
vereador, ter conhecimento que qualquer brasileiro pode e deve assistir a uma
sessão da câmara da sua cidade, agendar uma reunião com os vereadores e cobrar
da sua prefeitura devem ser situações basilares na vida de uma pessoa.
Se tivermos pessoas
bem instruídas, que cobram dos políticos no cotidiano, fazendo que os mesmos
cumpram seus papéis de funcionários públicos que são da maneira correta, não
precisaremos chegar a um ponto onde manifestações populares legítimas são
cooptadas por agendas reacionárias e fascistas, onde paradoxalmente pessoas
tentam coibir partidos políticos, legalmente constituídos e que podem existir
devido a muitas lutas na democracia. Não duvido que muitos apenas repetem este
discurso “antipartidos” por desinformação.
Há de se abrir um
debate com educadores, antropólogos, sociólogos, professores e com outros
segmentos da sociedade sobre a necessidade de uma agenda educacional onde todos
os brasileiros aprendam, desde cedo, que podem e devem participar da vida
política da nação, não só cobrando os políticos, mas tomando gosto por debater
a política e ocupar os partidos de suas preferências. O brasileiro precisa
pesquisar a vida dos candidatos nos anos de eleição, conversar com eles,
apresentar propostas, questionar quais são suas bandeiras, verificar se eles
são ficha-limpa e depois de eleitos, cobrar de todos as promessas, durante os
quatro anos de mandato.
Além de termos as
próximas gerações educadas e preparadas para apreciar o debate político e o
exercício diário da participação na política, peço que todos tenhamos o hábito
de acompanhar de perto o que as esferas do poder estão fazendo.
Acessar os portais de
fiscalização do dinheiro público (como o portal da transparência), denunciar
irregularidades ao Ministério Público, acessar os sites das prefeituras,
câmaras municipais, assembleias legislativas e presidência, questionar
saudavelmente o que a mídia publica e sobretudo dar o exemplo na convivência
diária na sociedade. Do que adianta o cidadão reclamar que há “políticos
corruptos”, se ele desrespeita seus semelhantes no dia-a-dia, ouvindo música
alta sem fone de ouvindo, deixando de ceder o lugar para idosos no ônibus,
parando o carro em vaga para deficiente, tentando subornar o guarda, etc.? Atos
irregulares de políticos nada mais são do que reflexo de uma sociedade que
precisa refletir sobre si mesma e exigir uma educação de mais qualidade, das
três esferas de poder (federal, estadual e municipal).
Veja o que está
fazendo o deputado no qual você votou, se ele comparece às sessões, como ele vota
nas pautas importantes, etc.
Acesse o site da
prefeitura da sua cidade, da Assembleia Legislativa do seu estado e da Câmara Municipal
de onde você mora.
2 comentários:
Obrigado por reverberar meu artigo.
Fico realmente preocupado em ver milhões de pessoas, transformando o Brasil em uma confusão, sem saber o que querem e como querem.
Abraços
Aurélio, os trilhos da vida estão cheios de surpresas, buscas, indecisões. O caminho faz-se caminhando. É isso que a alma popular está fazendo. Do modo como sabe e sente. A democracia não é uma constituição e legislação abundante, nem apenas o voto ano após ano; a democracia é algo que é interiormente sentida, civicamente exercida, ou então ainda não é realmente democracia.
O civismo custa, mas aprende-se. Os escandinavos foram povos 'bárbaros', piratas de mar e sei lá que mais, e hoje - num quadro político moderado - são o exemplo mais acabado do planeta como democracia interiorizada. Ainda não é a 'minha' democracia, mas é uma democracia bastante avançada.
Levou séculos a fazer-se. Com erros e acertos. É preciso tentar, exercer a cidadania e aprender a viver um coletivo solidário.
Antigamente contava-se que o chefe de um armazém ou era ladrão, porque roubava o patrão, ou era palerma porque não roubava o patrão. Falta chegar o dia em que seja reconhecido como cidadão íntegro.
Abraços Gloriosos!
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