segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Aposentadoria, tempo de poesia...

por LÚCIA SENNA, escritora e cantora
escrito para o blogue Mundo Botafogo

Aposentadoria, quem diria?... Ainda outro dia estava eu vibrando ao saber que havia passado no concurso para Fiscal da Previdência Social. Não que eu não gostasse de trabalhar na biblioteca, muito pelo contrário. Mas o salário mal dava para o básico, para o diário. Realmente era muito baixo.  Era preciso melhorar de vida, ganhar mais. Afinal, havia toda uma família por trás.

Passar no concurso era minha única opção. Era ‘passar ou passar’, não havia outra solução. E tome de estudar dia e noite, noite e dia, além de muita, muita oração! Fiz promessa para todos os santos: São Judas Tadeu, o das causas perdidas; Santo Antônio, sem especial razão; São Francisco, pra não correr nenhum risco; São Jorge e seu dragão; São Cosme e Damião; Frei Galvão... sim, a lista era enorme. Apelei para todos eles com um pacote de velas nas mãos. Aos pés de cada santo, ajoelhei-me e três terços rezei. Cumpri o combinado!

Auditora Fiscal da Previdência Social, título pomposo, grandioso, horroroso, que me metia medo. De bibliotecária a fiscal, meu Deus, tudo me parecia tão nebuloso, tão irreal! A família orgulhosa dizia: “Agora, tens fé pública". E eu, na minha santa ignorância, achava que fé pública tinha a ver com fé em santo, com oração, com religião. Mas não é nada disso, não. É apenas um voto a mais de confiança dado pelo Estado às autoridades públicas. Não havia dúvida: eu era uma autoridade e tinha fé pública!

Quanta responsabilidade! E agora, José? Será que vai dar pé?

Logo me vi envolvida com empresas de todos os portes, com seus contadores, assessores, respeitosos senhores, mesas sem flores, paredes sem cores, ambientes cinzentos, tensos momentos e... cadê os documentos? E as folhas de pagamento? Onde está o livro Diário? E o Razão? Não estão escriturados, não? E as guias de recolhimento, onde estão? E o contrato social? Onde fica o departamento de pessoal? Onde está o diretor, o assistente, o presidente? Assim não tem jeito, não tem nada direito, vou lavrar o débito, tenho dito e está bem feito!

O tempo voando passou, deixando em mim a sensação de dever cumprido e... comprido. Mais um ciclo está se fechando e outro ainda melhor já começa a se delinear. Não, sinceramente, não guardo saudade da época em que tinha fé pública e era autoridade. Quanto ao título de Auditora Fiscal, sempre me pareceu pesado demais. Tão pesado quanto deve ser a farda dos imortais, tão incomodo quanto uma saia justa ou um sapato apertado.

Ser Auditora Fiscal é muito legal para dizer numa reunião social. Ainda assim, o melhor é ocultar, pois corre-se o risco de passar a noite inteira tirando as intermináveis dúvidas daquele chato que está em dívida com a Previdência Social e quer dar um jeito do ilegal tornar-se legal. Que tal?

Aposentadoria rima com liberdade, com alegria, com folia, com novos desafios, com novas formas de olhar o mundo, com Carlitos, o delicioso vagabundo, com viagens a países distantes...

Antes dela, tudo era feito com hora marcada, com o tempo corrido, com os minutos contados. Depois dela, o relógio é esquecido, o tempo é amigo, a hora é aliada, há tempo pra prosa, pro verso e até pra gente se encantar com o universo.                       

Aposentadoria, hora de realizar aquilo que você tanto queria e, por falta de tempo, não podia.

18 comentários:

Anónimo disse...

Na vida há tempo para tudo, até para se aposentar, porém, agora o que falta é o dinheiro para gastar, mesmo assim podemos aproveitar!!!!!!!

Anónimo disse...

Larápia dos comentaristas, fazes a crônica
Única, redondinha, esgotas todo o assunto!
Causa e efeito se completam e dão a tônica
Inteiramente definitiva, chega junto!
Experiência nos entreveros comentados

Mata a cobra e mostra o pau com total maestria,
Ataca o novelo, todos fios bem ligados...
Recorro então aos orixás e aos mais fortes santos:
Inútil, impossível intervir na harmonia
Absoluta conseguida! Só ouço os cantos!

Sérgio Sampaio,
www.umpoetinha.com.br

Anónimo disse...

Oi Lúcia, sou seu fã sem carteirinha,ainda, leio tudo que você escreve aqui e alhures. Sua prosa leve e saborosa nos envolve e nos leva a vivenciar as experiências descritas no texto. Ao ler crônica " Aposentadoria..." fui instigado a colorir o trabalho burocrático que faço e sonhar com a aposentadoria e , certamente , vivenciá-la com o olhar de Lúcia Senna. Beijo

Anónimo disse...

A Crônica acelerou a minha vontade de liberdade. Estou quase lá. Lúcia Senna, quero desfrutar das mesmas regalias.
Beijos.
Eliana Martelotta - professora de literatura e escritora

Anónimo disse...

Amiga, que bom que a sua aposentadoria nos permite ler crônicas deliciosas como esta. Agora sim, auditora do cotidiano com o olhar livre e leve sobre a vida, atenta aos registros da memória e distante dos enfadonhos registros fiscais.Parabéns mais uma vez e sempre. Maria Inês Galvão - jornalista e escritora.

Anónimo disse...

Lúcia Senna escreve leve mas há muita profundidade em tudo que diz. Já poderia ter me aposentado, mas tenho medo de não saber o que fazer com o tempo livre. E lá vem a escritora nos demonstrando que " podemos nos encantar com o universo ". Tenho uma curiosidade: Lúcia, você já escrevia antes de se aposentar?
Obrigado pelo incentivo de sempre. Acho que já vou dar entrada na minha aposentadoria e iniciar um novo ciclo na minha vida.
Um abraço
João Paulo - analista de sistema

Anónimo disse...

Ora,amiga, só você para escrever esta deliciosa crônica sobre nosso trabalho ( fomos colegas) e a sonhada "aposentadoria" que, felizmente, já chegou para nós. Identifico com tudo que você escreveu. Significa não só a liberdade dos horários rígidos, da entrega das tarefas,dos chefes, como a iniciação de uma nova etapa. Adorei sua maravilhosa crônica, e no final, tudo parece encantador. Parabéns! Sonia Costa

Anónimo disse...

Concordo com todo o teor dessa crônica. Você conquistou com
exito, o direito de usufruir da sua aposentadoria. Vejo que valeu a pena
Agora você está desempenhando
aquilo que certamente gostas de fazer:escrever crônicas.
Um abraço.
Maria da Luz.

Anónimo disse...

De fiscal da previdência a escritora? Como assim? A sua atividade devia ser árida para não dizer chata. Não posso imaginar você fiscalizando livros de contabilidade. Você tem o dom da escrita ; mas da escrita contábil - realmente inconcebível. Gosto das suas cronicas, prosa rimada e engraçada. O blogue ganhou em leveza com a sua participação.
Abraço,
José Augusto Lima- advogado

Lúcia Costa disse...

Oi, José

Só não entendi o motivo da surpresa... És meu amigo desde sempre, fizeste o comentário do
computador aqui de casa e sabes que fiz o concurso não por opção mas por falta de. Como eu digo na crônica " Afinal, havia toda uma família por trás ". Estava separada com filhos e
bem... já conheces a história. Gostei dos elogios, mas fiquei sem entender a razão da surpresa.
De qualquer maneira, valeu!
Bjs.

Lúcia Costa disse...

Oi, Eliana

Ainda sinto saudades da época da faculdade, onde nos conhecemos e ficamos amigas.
Seguiste a carreira Quanto a mim, não dei uma aula sequer (kkkkk). Fui trabalhar na VARIG e depois parti para os Concursos Públicos. Tomara que te aposentes logo. Assim teremos mais tempo para batermos aqueles nossos intermináveis papos, alegres e descontraídos.
Te espero, no lado prazeroso da vida (kkkkkk)
Beijos, querida

Lúcia Costa disse...

Oi, querido amigo

Não, João, não escrevia nada ( ou muito pouco). Depois de aposentada do Serviço Público descobri que gostava de colocar no papel as coisas que me aconteciam e as emoções que elas me provocavam. E, depois da morte da minha mãe, intensifiquei a escrita. Foi a forma que encontrei para desanuviar o meu enorme sofrimento.
Curiosidade satisfeita? (kkkkk)
Obrigada, meu amigo, pelos deliciosos elogios. Amei!!!

Lúcia Costa disse...

Oi, meu fã sem carteirinha (kkkkkk)
Quanta honra saber que tenho um fã tão conectado com os meus escritos... Poxa vida!!! Que coisa boa!!!
Pois é... certamente encontrarás um mundo super colorido pós aposentadoria. Eu encontrei. Desejo-te o mesmo, meu caro leitor.
Um abraço e obrigada pelo carinhoso comentário.

Lúcia Costa disse...

Maria, minha querida

Lembra quando , lá no início, eu lia algo que tinha escrito pra ti e tu me dizias:
" Nossa, Lúcia, você devia publicar... está tão bacana..." Tu sempre me incentivaste a escrever e a cantar também. Agora, divido contigo, a minha felicidade. Obrigada pela tua boa e sincera amizade.
Beijos

Lúcia Costa disse...

Oi, querida

Era um trabalho muito tenso. Os empresários queriam ver o diabo, nunca a fiscalização. Mas, o importante é que desempenhamos a nossa missão com competência e HONESTIDADE!!! Como disse,na crônica : "Não guardo saudade da época que tinha fé pública e era autoridade ." Por outro lado, sou grata a DEUS, pois foi com o meu trabalho na Previdência Social que consegui e, com muito orgulho, criar meus filhos, em um momento difícil da minha vida. Venci, Vencemos, amiga.
Obrigada por estar sempre aqui no blogue incentivando-me com os teus fartos elogios.
Beijos, amiga

Lúcia Costa disse...

Caro(a) amigo(a),

Tens razão. Mas ainda há muita coisa que podemos fazer gastando praticamente nada, como por exemplo, dar uma boa caminhada na orla da praia, vento no rosto acariciando a nossa pele ou quem sabe, visitar museus da cidade ( adoro museus !)
ou ainda entrar em uma boa livraria e ficar horas pesquisando as novas publicações, sei lá, tantas coisas... Só não te aconselho a "caçar pokemóns " (kkkkkkkkk)

Obrigada pela participação. Estou sempre te esperando aqui no blogue. Bom final de semana.

Lúcia Costa disse...

Minha amiga, muito, muito especial

Estou mesmo de parabéns e sabes por quê? É simples. Ter a tua amizade é motivo de muita alegria e orgulho. Adoro teu jeito de dizer as coisas - deliciosa a expressão" auditora do cotidiano". Coisa de gênio! Encontras sempre uma maneira diferente, interessante para expressar as tuas brilhantes ideias. Te admiro demais.
Beijos

Lúcia Costa disse...

Sérgio,

Ah, poeta, sou eu que tenho que recorrer a todos os guias espirituais, além dos orixás, na tentativa de descobrir de que fonte retiras tanta inspiração. Quero que eles me ensinem o caminho das pedras, ou melhor, das fontes.
Mais uma vez, encantada, te agradeço e peço o endereço acima solicitado.
Um grande abraço.

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