por CARLOS
VILARINHO
especialmente
para o Mundo Botafogo
sócio-proprietário
e historiador do Botafogo de Futebol e Regatas
[A narração que se segue
reporta-se ao II Volume da coleção ‘O Futebol do Botafogo’ e ao ano de 1965]
Na
segunda-feira (dia 6 de dezembro), a oposição lançou a chapa
Tradição-Renovação, encabeçada pelo sócio emérito (1935) Althemar Dutra de
Castilho, campeão carioca de 1933. Completavam a chapa – como se previa - o
trio Rivinha, Ferraz e Júlio Azevedo. Seguindo o script, Armando Nogueira
saudou-a com “indisfarçável satisfação”.
No dia
seguinte, o Flamengo encaminhou à CBD o pedido de empréstimo de Garrincha,
alegando: “Recuperação psicológica é o que Mané precisa para voltar à sua
grande forma e ganhar o direito de nova convocação pela CBD”.
A semana
banguense começou tensa por causa das imundícies lançadas pela imprensa, uma
delas, a substituição (imediata) de Daniel Pinto por Paulo Amaral. Era de rir.
Na terça-feira, Garrincha se recusou a participar do individual (puxado),
limitando-se a bater bola. Roberto recuperou-se da contusão no joelho,
assegurando o retorno. Frustrando o técnico, Bianchini ficou de fora do
coletivo (titulares 2x1) de quarta-feira, pois se recusou a treinar entre os
reservas. Mané não apareceu, nem deu satisfação. Felizmente, Zé Carlos renovou.
No julgamento do TJD (sexta-feira), apesar de indiciado por agressão, Jairzinho
foi apenas multado. Manga, atingido, no último jogo, por um pontapé no cotovelo
operado, ficou de fora do apronto, sendo desfalque certo.
A esta
altura, o Flamengo fizera circular o boato de que o Botafogo facilitaria a
vitória do Bangu, encontrando, inclusive, apoio no suplente de João Saldanha
(Última Hora).
Na outra
noite, o Botafogo não repetiu a boa exibição do último jogo (2x1 Vasco da
Gama), atuando sem inspiração. Aos 20 minutos, Cao agarra o chute de Paulo
Borges, mas no momento da reposição, Foguete (ex-Flamengo) vem por trás, enfia
a cabeça, toma a bola das suas mãos e empurra para o barbante. Acintosamente,
Eunápio aponta o centro do campo: 0x1. Se o Botafogo estivesse no páreo, sua
decisão seria outra. A validação do gol irregular desnorteou o Botafogo a ponto
de Sicupira esquecer sua função de apoio ao meio de campo. Bem fechado atrás e
absoluto na meia-cancha (Jaime, Roberto Pinto, Parada e Foguete), o Bangu
controlou bem as ações.
Na fase
final, logo aos 3, Jairzinho, num rush sensacional, finta vários marcadores,
bate Mário Tito, dribla Ubirajara e vai empatar quando o goleiro e o beque o
derrubam. Pênalti! Eunápio faz vista grossa! Até os 10 minutos, o Botafogo
continuou apertando a garganta do Bangu. Depois, houve um equilíbrio. Aos 24,
Foguete ampliou: 0x2. O Botafogo morreu em campo. Aos 29, Paulo Borges fechou o
placar: 0x3.
Na
preliminar, foi o contrário: Botafogo 3x0. Os aspirantes chegaram aos 22
pontos. O título agora só dependeria de um simples empate na última rodada,
contra o Flamengo, que venceu o Fluminense (3x2).
Com a
vitória no Fla-Flu (2x1), o Flamengo chegou aos 22 pontos e começou a comemorar
o título.
Na
segunda-feira, de volta à coluna “Contra-Ataque”, Saldanha comentou
maliciosamente a derrota alvinegra: “Segundo consta, mais tarde, houve uma
festa na sede do Botafogo”. No dia seguinte, a Diretoria protestou contra o que
chamou de “insinuações levianas e grosseiras de que o time tivesse facilitado
intencionalmente a vitória do Bangu”. Euzébio de Andrade, presidente do Bangu,
reagiu: “O Flamengo deve ter amolecido também porque perdeu do Bangu por 3x0 e
jogando menos do que o Botafogo. Neste caso, iríamos insinuar maldosa e
levianamente, como os outros, que o Fluminense entregara o jogo no Fla-Flu”.
Na manhã
desta terça-feira, Daniel Pinto concitou os jogadores a darem um pouco mais de
si, despedindo-se do campeonato com uma vitória. Garrincha era carta fora do
baralho: “O Mané não quer nada. Ontem mesmo, eu pedi ao Garrincha para se
preparar bem e voltar ao time, no último jogo deste campeonato, mas a resposta
foi negativa. Disse que só pretende voltar no próximo campeonato Rio-São
Paulo”. O craque já sabia que Havelange pedira a Palmeiro que o emprestasse à
CBD, que o repassaria ao Flamengo.
Na
quarta-feira, os dois colunistas da Última Hora pediram voto para a oposição.
Saldanha, mais polido, sentenciou: “O marasmo existente não pode continuar”.
Maneco, com a habitual truculência, culpou a Diretoria “infeliz e desastrada”
pelo “desastre” de 1965. No JB, Armando acusou a Diretoria de ter dado “ampla
cobertura” à indisciplina de Bianchini. Não mencionou a de Garrincha (“ingênuo
pecador”). Acusou Brandão Filho de ter transformado o futebol do Botafogo num
“saco de gatos”. Ao longo de um ano, o JB mentiu e atacou a Diretoria, num
esforço idêntico ao empregado na campanha (igualmente sórdida) em favor de
Flexa Ribeiro.
À noite,
Ney Palmeiro (104 votos) foi reeleito para o biênio 1966-1967, juntamente com
Octávio (117 votos), Mufarrej (97 votos) e Brandão Filho (92 votos). A oposição
obteve este resultado: Althemar (65 votos), Rivinha (70 votos), Ferraz (65
votos) e Júlio Azevedo (59 votos).
Na manhã
seguinte, houve coletivo (titulares 3x1). Bianchini voltou ao time titular,
saindo Arthur (com casamento marcado para o sábado). Jairzinho e Roberto
jogariam nas pontas. Garrincha foi deixado de lado.
Na
quinta-feira, Negrão de Lima atendeu ao pedido dos clubes para que as
arquibancadas fossem vendidas a mil cruzeiros nos jogos do Bangu e do Flamengo.
Garrincha
faltou ao individual, mesmo tendo dito ao JB, na véspera, que pretendia
enfrentar o Flamengo. Daniel Pinto não engoliu: “Mané é jogador do Botafogo,
mas só joga quando quer e eu não posso depender da vontade dele”. Na
sexta-feira, Garrincha apareceu à tarde, quando o apronto (titulares 2x0) havia
terminado há várias horas. O técnico declarou: “O Botafogo vai pra cabeça
contra o Flamengo”. Ainda de mau-humor, Armando Nogueira previu o contrário: “O
time do Botafogo não tem condições físicas e psicológicas para derrotar o
Flamengo”.
No
sábado, o Fluminense venceu o Bangu (20 pg) por 1x0, chegou aos 17 pontos e deu
o título ao Flamengo (22 pg). Mas estourou a bomba! Tim disse à imprensa que,
pela manhã, recebera um telefonema do vice-presidente do Bangu, Castor de
Andrade (filho de Euzébio), garantindo-lhe as “castanhas de Natal”, caso
Denílson não fosse escalado. Ainda segundo Tim, à noite, Castor anunciara nas
tribunas do Maracanã que “o jogo estava ganho, porque Tim estava conversado”. O
caso irá parar na 4ª Vara Criminal com recuo de Tim.
Na
preliminar de domingo, o Botafogo decidiu o título contra o Flamengo e sua
torcida (98% do estádio). O Botafogo jogou com raça, não se intimidando com
vaias e bandeiras. Conquistou o resultado necessário (0x0) e levou para General
Severiano o troféu de campeão carioca de aspirantes. Foi este o time: Hélio,
Mura, Chiquinho, Adevaldo e Dimas, Élton, Ayrton e Afonsinho, Zélio, Humberto e
Roberto II. A campanha foi excelente: 10 vitórias, 3 empates, 1 derrota, 28
gols a favor, contra 10 sofridos.
A
torcida flamenguista perdeu o humor. Quando os microfones anunciaram o nome de
Gérson, ouviu-se uma vaia ensurdecedora. Quando o Botafogo entrou em campo,
houve bis. Durante os 90 minutos, Gérson foi implacavelmente perseguido com os
gritos de “É esse”. Na prática, o Flamengo armou-se num 4-4-2, pois Almir e
Silva recuavam para apoiar Carlinhos e Nelsinho. Desta vez, Roberto procurou
prender Murilo, jogando aberto. Jairzinho, na outra ponta, jogando com fome de
vitória, infernizou a vida de Paulo Henrique. Ao contrário do turno, Bianchini
e Sicupira voltavam para formar um quadrado com Marcos (um monstro) e Gérson.
Na defesa, todos jogaram bem. Manga não teve trabalho. O primeiro tempo,
debaixo de um sol abrasador (40 graus), não apresentou grande movimentação e
passou em branco.
Na fase
final, pouco a pouco, o Flamengo foi apagando e perdendo a meia-cancha.
Sicupira recuou um pouco mais. Gérson subiu. Aos 35, na linha divisória do
campo, Joel domina e toca para Sicupira, que passa por Nelsinho e serve a
Bianchini, na entrada da área. Bianchini finge que vai chutar e enfia na medida
para Gérson, entre Jaime e Ditão. Com um leve toque (de bico), Gérson desvia o
couro do alcance de Valdomiro: 1x0. Depois do gol, o Botafogo levou o jogo no
fogo baixo e garantiu a grande vitória. Radiante, Gérson apanhou a bola e exibiu-a
para a torcida adversária.
Na
terça-feira, Armando não escondeu sua contrariedade: “O jogo foi disputado com
seriedade e o time do Flamengo só não ganhou porque não pôde; o outro, que foi
tão irregular o ano inteiro, jogou melhor”.
11/12/1965
– 0x3 Bangu. Time: Cao, Joel, Zé Carlos, Paulistinha e Rildo, Marcos e Gérson,
Roberto, Jairzinho, Sicupira e Arthur.
19/12/1965
– 1x0 Flamengo, gol de Gérson. Time: Manga, Joel, Zé Carlos, Paulistinha e
Rildo, Marcos e Gérson, Jairzinho, Bianchini, Sicupira e Roberto.
A Obra pode ser adquirida através do endereço: https://www.mauad.com.br