segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

O Pugilista Vermelho


Osvaldo Orlando da Costa, o ‘Osvaldão’, nasceu em Passa Quatro (MG) a 27 de Abril de 1938 e faleceu em Araguaia a 4 de Fevereiro de 1974. Foi campeão de boxe pelo Botafogo de Futebol e Regatas e um dos principais guerrilheiros marxistas que integrou a Guerrilha do Araguaia no Norte do Brasil, por volta de 1966-67.

Osvaldão era um negro com 198 centímetros de altura e 100 quilos de peso, sapato 48 e uma barba cerrada. Foi membro do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e viveu na clandestinidade desde o golpe militar de 1964. Antes disso fora campeão de boxe pelo Botafogo e estudante de Engenharia de Minas, em Praga, na Checoslováquia.

Além do estudo em Engenharia de Minas, Osvaldão teve formação militar adquirida como oficial da reserva e frequentou o curso de Máquinas e Motores na Escola Técnica Nacional do Estado da Guanabara.

Osvaldão entrou na região de Araguaia com a missão de implantar uma guerrilha, tendo-se feito passar por garimpeiro e mariscador. À frente do Destacamento B, Osvaldão era um dos guerrilheiros mais temidos pelo Exército e participou com êxito de vários combates contra as tropas do governo.

Contam-se inúmeras lendas a respeito de Osvaldão, que era considerado imortal pela população. Eis uma delas:

“Um grileiro foi ameaçar tirar a terra de Osvaldão e acordou, na sua casa, com o cano de um 38 cutucando seu rosto e a ordem, dada por ‘um negrão de quase dois metros de altura e com dois braços que pareciam duas pernas’, segundo descrição dos que o conheceram:

– Em vez de você ficar com minha terra, você dá a sua a uma família muito necessitada. A família já está aí, esperando. Vou lhe levar até a rodoviária e você não aparece mais aqui, senão morre. E se achar ruim morre agora que fica mais fácil...

O grileiro saiu com a surpresa de encontrar os novos proprietários e mais de 30 pessoas das redondezas que aplaudiam a atitude de seu Osvaldão, homem justo.”

Outra:

“Estando de passagem em casa de uma família camponesa, encontrou a mulher desesperada por que não tinha dinheiro para comprar comida para os filhos. Era uma casa pobre. Não tinham nada. Osvaldo perguntou-lhe se queria vender-lhe o cachorro. A mulher, sem outra alternativa, disse que sim. Tanto ela como Osvaldo sabiam o que significava a perda do cão: mais fome, pois na região, sem cachorro e arma é difícil conseguir caça. Osvaldão pagou-lhe o preço do cão e, a seguir, disse-lhe: guarde-o para mim que eu não poderei levá-lo agora para casa.”

Relatório Arroyo:

“Osvaldão morreu ali no Saranzal. Foi pegar comida e o Piauí deu um tiro nas costas dele. Era preto mesmo. Vi morto lá no São Raimundo, hericópiro levou ele.” [Depoimento de um índio Surui].

“Vi cortar a cabeça do Osvaldão. O sargento pegou a faca, lubrificou a faca e disse: ‘é bandido, tu agora não mia mais (...)’. Ai pegou a faca, pegou a cabeça dele, botou um pau em baixo e foi cortando. Foi cortando, cortando, cortando. E eu não tive coragem de olhar até ele terminar.” [Depoimento de um ex-guia do Exército]

“A Dina – diz que ela era baiana – foi pegada lá em Marabá: ia atravessar pro São Félix, mataram ela. O Osvaldão morreu sozinho – foi ali: nós vimos lá no São Raimundo [uma das pequenas bases de apoio do Exército dentro do mato], morto, pendurado pela corda no hericópire, por corda. Rapaz, ele era fogo mesmo – muito preto. Roupa dele não presta não, tudo rasgado. Enterraram todos no São Raimundo, mas já vieram buscar os ossos." 149 [Depoimento de um índio Surui].

“Levado morto para a base militar de Xambioá. Seu corpo foi mutilado por chutes, pedradas e pauladas dadas pelos militares e finalmente queimado e jogado no ‘buraco do Vietnã’ – depoimento de moradores a Comissão de Familiares que estiveram em Xambioá em 29/04/91.

A popularidade de Osvaldão devia-se ao seu carisma e aparência física. Essa popularidade foi confirmada pela professora do Departamento de Política Científica e Tecnológica da Unicamp, Sandra Negraes Brizolla, que conheceu o guerrilheiro em Praga. Sandra acrescentou que era grande o sucesso do guerrilheiro entre as mulheres.

“Ele era bonito, chegou até a participar de filmes na Tchecoslováquia. Uma vez, foi a uma festa e fez o maior sucesso. Um dos presentes chegou a dizer: Vou embora. As tchecas estão a fim de negros e não de brancos.” [Depoimento de Sandra]

Sandra lembrou que Osvaldão ficou ainda mais famoso ao namorar uma loura que tinha quase a sua altura. O namoro aconteceu quando o guerrilheiro preparava a sua volta ao Brasil e a checa queria acompanhá-lo.

“– Aí ele me disse: - Sandrinha você acha que vou poder passear com uma lourona dessas em Copacabana? Vou ser linchado.”

O último comandante guerrilheiro a ser morto foi Osvaldão, o mais temido e procurado guerrilheiro comunista. Foi abatido à traição com vários tiros de espingarda, numa tarde de chuva fina em Fevereiro de 1974, quando comia um pedaço de milho num milharal de São Domingos, pelo ‘bate-pau’ maranhense que ajudava o Exército.

As principais homenagens a Osvaldão foram as seguintes:

· Nome da antiga Rua R, no Bairro Braúnas em Belo Horizonte – Dec. N.º 6392 – 16/09/93 (Rua Viva – Homenagem aos mortos e desaparecidos políticos mineiros – pag. 54).
· Nome da antiga Rua 01, no Residencial Cosmo, em Campinas, com início na antiga Avenida 03 Cid. Sat. Íris e término na Divisa Equip. Púb. Urbano SANASA – Lei nº 9497, de 20/11/97.

Após a publicação deste artigo o meu amigo Danilo fez um comentário revelando que quando estudou no CEFET, antiga Escola Técnica Nacional, fez parte do Grêmio Estudantil, o qual foi denominado pelos estudantes do tempo de Danilo como “Grêmio Estudantil Osvaldo Orlando da Costa", em homenagem ao ex-aluno que dedicou sua vida à luta e à causa que defendia.

Fontes principais:
Acervo e pesquisa de Rui Moura
Acervo de Danilo Rosa Paiva
http://fomerlatdepefyrecodnanref-dmvyj.blogspot.com/
http://www.vermelho.org.br/

10 comentários:

DRP disse...

Rui, sei também de outra homenagem ao Osvaldão: estudei no CEFET (a antiga Escola Técnica Nacional)no meu segundo grau e fiz parte do Grêmio Estudantil de lá. Nessa época, o batizamos de "Grêmio Estudantil Osvaldo Orlando da Costa", em homenagem ao ex-aluno que dedicou sua vida à luta e à causa que defendia.

Grande abraço!
Danilo

Gil disse...

Amigo Rui!

Vivi a ditadura da minha infância até a adolescência. Os anos mais duros de repressão tinha entre 9 a 15 anos. Servi o exército no ano de 1975 e o comandante do quartel era um Coronel que só vivia a enaltecer o regime e queria nos convencer disso. Tanto que todos os dias, pela manhã, as 08h00min, a tropa perfilava para o seu discurso. Um autêntico ditador.
Até hoje tenho aversão pelos militares, e pelo momento que vivo na cidade do Rio de Janeiro com tanta violência tenho o mesmo sentimento pela Policia Militar do estado.
Ao mesmo tempo tenho uma simpatia muito grande por aqueles que lutaram contra a ditadura e a cada livro lido, sobre esse momento histórico vivido pelo Brasil, tenho a certeza que qualquer ditadura é maléfica para o desenvolvimento de uma nação. Saiba que a simpatia pelo Osvaldão era grande e ficou ainda maior por saber da sua ligação com o nosso BOTAFOGO.

Rui, a cada dia tenho convicção que ao ligar o micro não posso deixar de passar pelo MUNDO BOTAFOGO, pois a cada acesso adquiro cultura seja pelo nosso querido GLORIOSO ou sobre tudo que acontece ou aconteceu no Mundo.

Volto a repetir é SALUTAR passar por esse espaço, pois sempre aprendo mais um pouco.

Abs e Sds, BOTAFOGUENSES!!!

Leonel Ventorim disse...

Fazia falta hoje em dia um Osvaldão
no banco do Botafogo. Queria ver se seriamos tão roubados...

Leonel de Jesus

Ruy Moura disse...

Bela informação, Danilo. Vou acrescentar.

Saudações Gloriosas.

Ruy Moura disse...

Gil, vivi a ditadura brasileira desde o início até 1969. Cheguei a Portugal e vivi o fim de outra até 1974. Em 1973 entrei para o exército. Era um exército fascista que sustentava uma ditadura de 48 anos e mantinha uma guerra colonial já há 12 anos. Por isso, bainda em pior do que o que se passou no Brasil. Sei bem avaliar os seus sentimentos porque conheci e enfrentei os militares fascistas - porque eu sou militar de Abril. Participei na Revolução dos Cravos em 1974 e só saí do exército em 1975. O 25 de Abril de 1974 foi o acontecimento público mais importante da minha vida.

Creio que futebol e desporto também podem veicular cultura associada aos acontecimentos. Como dizia Gandhi, quem não perceber que a religião também é política, não sabe nada de religião. Eu direi que quem não perceber que desporto pode gerar cultura, não sabe nada de desporto.

Abraço, Gil!

Ruy Moura disse...

Amigo Leonel, se o Osvaldão andasse por aí não só acabava com as roubos mas também com a Federação de Futebol do Rio de Janeiro e a Confederação Brasileira de Futebol , com a Comissão de Arbitragem lá dentro!... rsrsrs...

Saudações Gloriosas!

Vitor disse...

Que história linda do Osvaldão! Os comentários, então, são igualamente extraordinários. li com muita atenção.

Ruy Moura disse...

É uma história fascinante de doação, solidariedade e luta. E entre a lenda e a realidade a figura de Osvaldão é verdadeiramente mítica. Hoje o que se observa principalmente, destruídos que foram muitos dos sonhos da década de 1960, é o crescimento do egoísmo e da ganância, o desprezo pelo Outro e a procura da vantagem pessoal a todo o custo. E a pandemia, ao contrário do que se poderia esperar, veio globalmente pôr a nu essa faceta egocêntrica.

Abraços Gloriosos.

Vitor disse...

Valeu, pelo Osvaldão! Pela lembrança do Guerrilheiro. Pelo espírito da 'utopia, que eu também faço parte.

Ruy Moura disse...

Grande e Glorioso abraço, Vitor!

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