quinta-feira, 6 de outubro de 2016

António Guterres, um português no topo do mundo

Imagem: jornal Notícias

"As pessoas queriam unir-se em volta de uma pessoa que impressionou ao longo de todo o processo e impressionou a vários níveis de serviço." – Samantha Powell, embaixadora norte-americana junto das Nações Unidas, sobre a eleição de António Guterres para Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas.

O mundo está de parabéns porque António Guterres era, de longe, o candidato mais bem preparado para o exercício do cargo, tal como vem sendo reconhecido em todo o mundo desde o início das rondas para escolha do Secretário-Geral da ONU, assim como a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) também está particularmente de parabéns por esta vitória que, certamente, será decisiva para o crescimento vigoroso da língua portuguesa em todo o mundo e dos países que a falam.

Na qualidade de chefe do governo português a sua primeira visita internacional foi significativamente ao Brasil, em 1995, e recentemente sinalizou ser favorável a que o Brasil passe a membro permanente do Conselho de Segurança da ONU. Em 2001, Guterres assinou o Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre Portugal e o Brasil que estabeleceu a igualdade de direitos políticos entre cidadãos dos dois países.

Eu tive a honrar de desempenhar o cargo de Assessor do Gabinete do Primeiro-Ministro Português António Guterres, que liderou o Governo entre 1995 e 2002, no âmbito dos assuntos económicos e sociais da Presidência Portuguesa da União Europeia e do Programa Nacional Integrado de Apoio à Inovação, tendo sido agraciado com louvor público em ambas as ocasiões.

Guterres na qualidade de Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados
Imagem: Rebecca Blackwell / AP

António Guterres, cuja campanha eleitoral, quando venceu as eleições pela primeira vez para chefiar o Governo, se baseou no lema ‘razão e coração’, manteve sempre, ao longo dos anos, a razão e o coração lado a lado, sempre ligado à causa pública, social e política. Brilhante orador e homem de ação, possui uma mente rara, sendo a pessoa mais inteligente que conheci e que acaba de ser indigitado e aclamado Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas, no dia em que os portugueses comemoram 106 anos da Implantação da República, após vencer seis rondas informais e obter finalmente o apoio dos cinco membros do Conselho de Segurança [América (EU), China, França, Reino Unido e Rússia], registrando 13 votos a favor, 2 abstenções e nenhum voto contra.

Mónica Ferro, especialista em organizações internacionais lembra que "esta vitória significa uma vitória dos valores e ideais sobre as teorias mais realistas", conseguindo assim a ONU "o objetivo de reabilitar as Nações Unidas aos olhos do mundo".

Vitaly Churkin, embaixador russo presidente da Assembleia Geral da ONU: "Senhoras e senhores, estão a testemunhar uma cena histórica. Nunca foi feito desta forma. Este foi um processo de seleção muito importante. Temos um favorito claro e o seu nome é António Guterres. Decidimos avançar para um voto formal amanhã de manhã e esperamos fazê-lo por aclamação."

Pela primeira vez a ONU nomeia um Secretário-Geral com transparência de uma consulta pública e democrática que permitiu a vitória de uma candidatura exemplarmente conduzida, independente de hipotecas políticas, um homem com autonomia de pensamento, defensor dos direitos humanos e dos direitos dos refugiados, e que, segundo Raul Vaz (in Negócios), “num mundo formatado pela ganância, trava e trama essa lógica que desfaz a lógica do que tem de ser, vencendo por mérito próprio contra lógicas de muros que caíram mas dividem, contragolpes de lobbies que alimentam uma ganância qualificada.”

Imagem: jornal Folha de São Paulo

O Presidente da República Portuguesa, membro de um partido de centro-direita, nomeou recentemente o socialista António Guterres para seu Conselheiro de Estado e considera-o como “o mais brilhante da minha geração”.

António Guterres nasceu em Lisboa há 67 anos, formou-se em engenharia com 19 valores (equivalente a 9,5 na escala brasileira), desenvolveu uma liderança democrática e de busca de consensos e compromissos, em forte defesa dos direitos humanos, tendo sido capaz de manter a coerência socialista numa matriz de inspiração social-democrata europeia, equilibrada com um catolicismo de grandes causas sociais que venceu o tabu religioso do seu partido e que, na qualidade de Alto Comissário da ONU para os Refugiados, conhece o lado mais difícil do mundo vivido por milhões de refugiados. Em simultâneo, Guterres, humanista genuíno, pôs o ‘coração’ ao lado dos mais sofredores e a ‘razão’ ao serviço da gestão eficaz mais de 7 mil colaboradores em 126 países e potencializou a Agência de apoio aos refugiados fazendo mais com menos recursos durante dez anos.

Foi António Guterres, enquanto primeiro-ministro, em 1999, que conduziu o processo diplomático de libertação de Timor-Leste do jugo da Indonésia e da guerra civil que durou 24 anos, conseguindo mudar o posicionamento de Bill Clinton e, em duas semanas, o novo país, antiga colônia portuguesa, seguiu o caminho da paz e da independência. Ontem como hoje, Guterres coloca-se ao serviço do bem comum, disposto “a servir os mais vulneráveis”, evitar a guerra e buscar a paz segundo princípios, valores e convicções guiados pela utopia de vivermos num mundo melhor.

Imagem: jornal O Globo

Guterres foi, entre outros cargos, Presidente da Comissão Parlamentar de Demografia, Migrações e Refugiados da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (1983), fundou o Conselho Português para os Refugiados (1991), dirigiu o Partido Socialista entre 1992 e 2002, presidiu à Internacional Socialista entre 1995 e 2000, foi Primeiro-Ministro entre 1995 e 2002 (XIII e XIV Governos Constitucionais), exerceu o cargo de Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados entre 2005 e 2015 e agora foi eleito Secretário-Geral das Nações Unidas, o cargo mais ambicionado pelos políticos de todo o mundo.

Sucedendo a um desastroso Secretário-Geral para o qual só existiam problemas insolúveis e problemas resolvidos pelo tempo, e de outros que quiseram mandar na América e na Rússia, obviamente não o conseguindo porque não se manda nos países, Guterres tem pela frente a missão de gerir a ‘missão mais impossível do planeta’ com uma agenda dramática num mundo à deriva: conflito na Ucrânia e beligerância russa; Israel, Palestina e mundo árabe; guerra civil na Síria; acordo do Clima, biodiversidade e pobreza; metade dos 21 milhões de refugiados em dez países; manter imparcialidade e gerir antagonismos; a igualdade e o ‘argumento mulher’; conflitos congelados e o papel da ONU; reformar a ONU; a desnuclearização e a volátil Coreia do Norte.

António Guterres possui 16 condecorações de 14 países: Portugal (2), Brasil (2), Bélgica, Cabo Verde, Chile, França, Grécia, Itália, Japão, México, Polônia, Tunísia, Ucrânia e Uruguai.

No Brasil foi condecorado com o Grande-Colar da Ordem de Mérito do Grão-Pará (2002) e com a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul (1996). A Ordem do Cruzeiro do Sul é a mais alta condecoração brasileira atribuída a cidadãos estrangeiros.

Pesquisa de Rui Moura (editor do blogue Mundo Botafogo)

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