“Deixe eu lhe
contar minhas relações com futebol, que justificam o coitada do título.
Sou Botafogo, o que já começa por ser um pequeno drama que não torno maior
porque sempre procuro reter, como as rédeas de um cavalo, minha tendência ao
excessivo.
É o seguinte: não me é fácil tomar partido em futebol –
mas como poderia eu me isentar a tal ponto da vida do Brasil? – porque tenho um
filho Botafogo e outro Flamengo. E sinto que estou traindo o filho Flamengo. Embora
a culpa não seja toda minha, e aí vem uma queixa contra meu filho: ele também
era Botafogo, e sem mais nem menos, talvez só para agradar o pai, resolveu um
dia passar para o Flamengo.
Já então era tarde demais para eu resolver, mesmo com
esforço, não ser de nenhum partido: eu tinha me dado toda ao Botafogo,
inclusive dado a ele minha ignorância apaixonada por futebol. Digo “ignorância
apaixonada” porque sinto que eu poderia vir um dia apaixonadamente a entender
de futebol.”
– Clarisse
Lispector, escritora.
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