por PEDRO ARÊAS, 25/08/2014
Uma pirueta, duas piruetas, bravo, bravo! Uma cambalhota, duas
cambalhotas, bravo, bravo! Salta sobre a arquibancada e cai onde cair, que a
galera morre de rir, que a galera morre de rir...
O anel gigantesco deste magnífico circo, que em latim quer dizer
circunferência, não possuía divisórias ou separações, era um só monumento para a população
unida reverenciar os palhaços em campo. E o campo? Quando chegávamos ao fim da estreita rampa
que dava acesso às arquibancadas, lá estava
ele, que picadeiro fantástico, palco de um verde inigualável, um verde natural que os padrões FIFA jamais alcançarão, picadeiro
para gênios em preto e branco nos surpreenderem. Vinha gente de todos os times
adversários e até de outros países ver esses espetáculos, meu Neto, sem
pudores, aplaudiam e riam sem regionalismo, sem ignorância, apenas pela arte.
Arte esta resgatada depois de um rasgo profundo deixar volumosas
cicatrizes no peito do respeitável público. A
derrota de 1950 em nosso gigantesco quintal. Nos faltou censo de humor contra o
Uruguai. Choramos em vez de sorrir, lamentamos em vez de vibrar, sentenciamos
um negro em vez de
libertá-lo. Coitado do Barbosa! Porém, antes das cortinas se fecharem em definitivo, essa cômica turma das antigas em preto e
branco veio mudar o cenário para sempre e eternizar nossa arte nas galerias mais clássicas imagináveis.
Colocaram uma estrela no peito e vieram ensinar o amor pela brincadeira. Elevaram o Brasil ao topo
dos espetáculos mais concorridos. Junto com um
outro time descolorido lá do litoral de São Paulo, outra trupe de mágicos, equilibristas, malabaristas, cuspidores de fogo,
homens bala, domadores, trapezistas e palhaços irretocáveis. Botafogo e Santos. O futebol mudou, o circo
mudou, o Brasil mudou e o caloroso espetáculo jamais foi o mesmo depois desta lona armada em
preto e branco. E o narrador dizia assim, meu Neto:
Boa noite, boa noite, boa noite!!!! Hoje tem marmelada? Tem sim
senhor! Hoje tem goiabada? Tem sim senhor! E o palhaço o que é? É ladrão de
mulher! Respeitável público, sobe ao picadeiro do estádio Mário Filho neste
momento um elenco estrelar! Mágicos encantadores que enfeitiçam adultos e
crianças, equilibristas que fazem o céu parecer pertinho, malabaristas que
fazem da bola um membro de seu próprio corpo, cuspidores de fogo que botam fogo
em qualquer espetáculo, homens bala que em segundos param dentro da rede com
bola e tudo, domadores que transformam leões em gatinhos, trapezistas que dão
estonteantes piruetas com assustadora precisão e palhaços que adoram fazer...
Palhaçadas... Somente palhaçadas! Com vocês, os talentosos artistas mambembes,
com vocês o Glorioso Botafogo de Futebol e Regatas!!!!
APLAUSOS... Meu Neto, à cronologia neste caso não importa, o tempo
é detalhe, nosso esplêndido elenco é atemporal:
Número 1: Haílton Correia de Arruda, ou Manga, arqueiro
trabalhador. Frio e seguro. Suas pontes encantavam espectadores infantis e
adultos. Saltava alto como quem pula na cama elástica e mergulhava em solo
rígido como quem mergulha em um colchão de proteção. Debochado, gastava antes
mesmo de receber a renda extra oriunda das vitórias sobre um adversário carioca
preto e vermelho, que, aliás, sempre foi ótimo coadjuvante para compor elencos
em nossos espetáculos. Dispensava às luvas repletas de tecnologia para sua
palma aderir com mais qualidade ao couro da pelota. Comprido e ágil. Uma
espécie de palhaço da perna de pau. Fantástico!
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