Publicarei
uma série de artigos para que os adeptos mais novos do Botafogo entendam o
contexto em que o nosso clube se foi afastando do palco mundial que partilhava
com o Santos. A entrevista que se segue foi feita a Sandro Moreyra, renomado cronista
desportivo adepto do Botafogo, com o título ‘Glória e Agonia da Estrela
Solitária’. Trata-se de excertos e conta a parte ‘boa’ do Botafogo: a ascensão.
GLÓRIA E
AGONIA DA ESTRELA SOLITÁRIA
Nos anos 50, o Botafogo também
estava em péssima situação. Como pôde crescer a partir daí?
Em 1955, o Botafogo viveu uma
situação parecida com essa, quase que fica abaixo do Bonsucesso. Então, João
Saldanha, Renato Estelita, João Azeredo e eu, tradicionais botafoguenses, fomos
até o gabinete do presidente, Paulo Azeredo, um homem muito sério. Chegamos lá
e deflagramos uma revolução, mostrando que era uma vergonha o Botafogo virar o
São Cristóvão da zona sul. Então, Paulo Azeredo alarmou-se e imediatamente
disse: “Não, eu vou providenciar um dinheiro”. O Botafogo comprou Didi, comprou
Paulo Valentim, depois comprou Zagalo, depois Manga. Fez um timaço, ganhou o
campeonato de 1957, chegou na final com o Fluminense, deu de 6x2. Em 1958, na
Copa do Mundo da Suécia, o Botafogo compareceu com esses titulares todos e o
Brasil foi campeão do mundo pela primeira vez. E o Botafogo começou a faturar,
porque a Europa queria ver Didi, queria ver Nilton Santos, queria ver,
principalmente, Garrincha. Então, o Botafogo passou a viajar e a faturar
dinheiro – começou a entrar dólar, entrar dólar. Aí, ele foi bicampeão carioca
em 1961 e 62 e não ganhou mais campeonatos porque não quis – o Botafogo sempre
foi meio malandro. Mas, em 1963, a idade pesou. Aí, todo mundo pensou: bom,
acabou o Botafogo. Mas veio a geração do Jairzinho, do Roberto (Miranda), do
Paulo César (Caju)…
Todos da escolinha do clube?
Sim. E esse time foi bicampeão em
1967 e 1968. De fora, s+o havia Gérson, que tinha vindo do Flamengo. Então, até
1972 o Botafogo foi um grande time. Depois, veio a tal operação meia-três, veio
a crise do país, veio a crise do futebol. Quando Borer saiu, o Botafogo não
tinha jogadores. Caso de Alemão é único, pois é uma cria da casa que deu certo.
Outros juvenis foram promovidos antes do tempo e acabaram. Ou seja, mataram os
jogadores promovendo-os – três, quatro ao mesmo tempo – como salvadores de um
time perdido.
Algum exemplo?
Ah, vários deles. Helinho, o próprio
Petróleo que está agora lá.
Mas o Botafogo tem um passado
muito mais rico do que o que você contou até aqui. Conte mais.
Foi uma grande época do Botafogo
[o entrevistado refere-se aos tempos de glória de Carlito Rocha, em finais da
década de 1940]. Outra foi em 1957, quando o time chegou a final do campeonato
comum ponto a menos que o Fluminense. O tricolor jogava pelo empate, mas o
Botafogo ganhou de 6x2. Foi a melhor atuação de Garrincha no Clube. Paulo
Valentim fez cinco gols, foi uma exibição notável do Botafogo no Maracanã lotado.
E o bicampeonato de 1961-62?
Em 1961, o Botafogo ganhou com
muita folga, só perdendo um único jogo, por 2x1, diante do América. Em 1962,
ele chegou à final com um ponto de desvantagem do Falmengo e ganhou de 3x0. Com
três gols de Garrincha. E depois, veio aquela fase em que Zagalo foi técnico,
em 1967 e 68, quando o Botafogo teve grandes atuações. Organizaram então um
jogo da Seleção, dirigida por Zagalo, contra a Seleção Argentina. Zagalo
escalou quase o time todo do Botafogo, só com um jogador do Flamengo. Houve
protesto, mas o fato é que na hora esse time deu de 4x1 na Seleção Argentina.
Esse mesmo time na final com o Vasco, em 1968, ganhou por 4x0. Foi o último
título de campeão carioca do Botafogo. Na Taça Guanabara, ainda em 1968, ele
jogou contra o Flamengo, que estav com dois pontos à frente, e foi 0x0. Aí, o
Botafogo não tinha mais jogo. E o Flamengo ainda tinha um jogo atrasado, com o
Bonsucesso no Maracanã, na quarta-feira seguinte, e já achava que era campeão:
deu volta olímpica, jogaram camisas para os torcedores e tal. E o Botafogo, na
segunda-feira, tinha ido excursionar pelo interior, porque também achava que o
Flamengo ganharia do Bonsucesso ou, na pior das hipóteses, empataria e seria
campeão. Mas perdeu, e o Botafogo teve de voltar às pressas. Chegou ao Rio de
Janeiro na quinta-feira e, no sábado, em jogo extra deu de 4x1 no Flamengo e
foi campeão.
Mas, para você, qual foi o grande
momento do Botafogo?
Oi a Copa do Chile em 1962,
porque o Brasil lutava pelo bicampeonato e o Botafogo tinha a metade do time
titular: Nilton Santos, Didi, Garrincha, Amarildo (que entrou no lugar de Pelé
no segundo jogo) e Zagalo.
Qual foi a repercussão disso no
clube?
Eu vi, uma vez, na varanda da
sede, uma briga entre dois empresários argentinos que disputavam o direito de levar
o Botafogo à Europa. O Botafogo era uma atracão. O Botafogo e o Santos de ele andavam
pelo mundo inteiro, inclusive se encontravam, às vezes, na Alemanha, na Venezuela,
na Colômbia, no México. Pelo mundo.
Que relação você vê entre a queda
do Botafogo e os tais problemas do futebol brasileiro?
Bem, hoje existem técnicos que
dizem que futebol é 70% de força, como PLACAR até publicou. Quer dizer, não há
lugar para um Garrincha, que era só habilidade. Não há lugar para aquele
Botafogo de arte e glórias.
Fonte:
Placar Magazine, nº 810, de 29.11.1985
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