segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Garrincha no Santa Quitéria

por JOSÉ CARLOS FERNANDES
JCFERNANDES@GAZETADOPOVO.COM.BR
08/julho/2014

Essa pequena história começa em 17 de setembro de 2006 – na redação da Gazeta do Povo. Como tinha por hábito, o cientista social Walmir Brandão me chamou à portaria e entregou mais um capítulo do livro que estava escrevendo – Santa convivência, um ensaio sobre o bairro de Santa Quitéria, no qual morava.

Além da papelada, deixou uma fotografia que acabara de receber, no portão de sua casa. Desde que começara a fuçar as origens do bairro, os vizinhos deram de bater palmas no muro para lhe contar episódios e entregar documentos. Temia não acabar nunca. Estava perto de mil laudas datilografadas – mas não poderia deixar de lado aquela informação: o retrato era do Garrincha, num campinho da região. Que diabos? Prometeu descobrir e me contar. Depois se foi.

Morreu dali a um ano e meio, sem dar o ponto final à obra. A viúva, Alina, diz que está tudo num armário, tal e qual ele deixou, incluindo, desconfio, a explicação para a visita do craque àqueles rincões. Dia desses, encontrei a foto nos meus guardados. Traz poucas pistas. Garrincha já não está tão novo. Há três guris a seu lado, em trajes de futebol. À caneta, uma anotação identifica um deles: “Filho do Amauri (CAP)”. Boiei. Foi preciso pagar uma via-sacra para descobrir do que se tratava.

Aos fatos. Já derrubado pelo alcoolismo, Garrincha ganhou um posto simbólico na Legião Brasileira de Assistência (LBA). Em 1974, quando uma associação local da LBA decidiu abrir um centro comunitário na Rua Curupaitis, não encontrou dificuldade em trazer o jogador para a inauguração. Festa. Para a ocasião, dois times de crianças foram formados – o convidado ilustre deu início à partida.

Quanto ao menino da foto, ele se chama Ewerton e é um dos filhos do veterano Amauri dos Santos, ex-Atlético Paranaense. Pimpão ao lado da “Estrela Solitária”, o menino fez carreira no basquete. A comemoração acabou com um jantar em outra Santa, a Santa Felicidade. A foto ficou em alguma gaveta, por décadas, até cair nas mãos de Walmir.

Na medida em que os caquinhos desse episódio quase trivial iam sendo juntados, vieram à tona outros – bem mais emocionantes – sobre as passagens do “pernas tortas” pelo estado. Sua primeira vez na capital teria sido em julho de 1960, num amistoso entre o Botafogo e o Ferroviário, no “Durival de Britto”.

Além de Garrincha, vieram cobras da Copa de 58, como Nilton Santos e Zagallo. Tensão. A legião que foi ao Afonso Pena recebê-los ficou amuada ao saber que a “vedete” da delegação perdera o voo,  ahã. Garrincha chegou depois, com Amarildo. No domingo da partida, choveu – 4 a 1 para o Botafogo. Garrincha logo se mandou, mas não sem antes fazer, a pedidos, uma visita à fábrica de cachaça Predileta. Saiu cheio de amostras grátis. Virou freguês, da cidade. Voltou em novembro, para outro amistoso com o Ferroviário, desta vez marcando um gol. Mais três anos e participa de uma exibição, a convite do Coritiba.

Num dos episódios mais divertidos dentre tantos, o jogador vai a Ubiratã, na Região Central, no elenco da versão tupi do time Milionários – uma invenção colombiana. Era 1977. Fuzuê no sertão. Os craques um pouco barrigudos chegam de ônibus, verdadeiros extraterrestres. O hoje advogado Áureo Zampronio Filho, então menino calçudo, “deu branco” na entrevista que lhe arrumaram com o craque. “Caí no choro”, admite. Hoje ri – com motivos a rodo: teve a vida marcada por um cara que é de Santa Quitéria, de Ubiratã, de todo mundo.

Grato às lembranças contadas por Levi Mulford, Amauri dos Santos, Carneiro Neto, Nego Pessoa, Áureo Zampronio Filho, Moisés Nascimento e Arlindo Ventura.

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