por
ANDRÉ BARROS
5
de janeiro de 2011
blogue
Movimento Carlito Rocha
O
Brasil estava sob a ditadura militar e o presidente do Botafogo, entre 1976 e
1981, Charles Borer, apoiava aquele regime. Em 1977, o Botafogo perdeu sua sede
em General Severiano, tomada pela então forte estatal militar Vale do Rio Doce.
Às custas de sua sede histórica, tendo sido o único clube brasileiro a quitar
suas dívidas previdenciárias, o Botafogo, paradoxalmente, tem hoje um enorme
débito com a Previdência Social.
Abandonada,
nossa até então famosa divisão de base não estava revelando ninguém. O time
principal andava mal e amargávamos mais de uma década sem um título. A cada
derrota, a torcida, liderada por Russão, encostava nas grades da cadeira
especial e puxava dois gritos: “fora Borer!” e “êêêê, sou Botafogo, estou
cansado de sofrer”.
Nesta
época, eu participava de duas lutas: pela liberdade do Botafogo e pela
liberdade do Brasil. Minha família ansiava pela volta de tia Verinha, banida do
país, que havia saído daqui em cadeira de rodas, de tanto que sofreu no
pau-de-arara e outras terríveis torturas.
Minha
avó, que também havia sido presa pela ditadura, queria me presentear com uma
bateria. Porém, além de meu negócio não ser exatamente rock, e sim,
samba, meu pai não permitiria a entrada daquela “barulheira” em nosso
apartamento. Com os instrumentos da bateria de samba doados por minha avó, com
apenas 13 anos, decidi fundar uma torcida organizada. Assim surgia a FOGO
LIVRE, nome que caracterizava tanto a luta pela liberdade do Botafogo e quanto
do Brasil. Com apenas 10 componentes, eu era o presidente dessa “imensa”
organizada.
Mas
o controle no clube era tamanho que, para se fundar uma torcida, era necessário
solicitar permissão à diretoria de Charles Borer, através da ASTOB – Associação
das Torcidas Organizadas do Botafogo –, presidida por Pedro Memória, um cara
simpático, mas que não tinha qualquer vínculo com as organizadas. Acho que não
entenderam a crítica presente no nome, daí a torcida ter sido autorizada.
Começamos,
então, um movimento da torcida contra Borer. Pichávamos o muro do clube e
saíamos correndo, com as mãos cheias de fichas, direto para um orelhão, de onde
ligávamos para vários jornais, e o primeiro deles era sempre o ‘Jornal dos
Sports’. Por essas ações, combinadas aos gritos nas arquibancadas, a torcida do
Botafogo mobilizava a cidade em sua luta pela liberdade. Borer começou a se
movimentar e criou os chamados “boreméritos”, conselheiros beneméritos biônicos
e vitalícios, nomeados por ele, a fim de obter maioria no Consellho
Deliberativo e se perpetuar na presidência.
João
Saldanha, um verdadeiro Benemérito, era contra Borer. A cada vez que a bandeira
do fogão estava hasteada a meio pau, ele comemorava dizendo que aquilo deveria
ser sinal da morte de algum conselheiro daquela ditadura no Botafogo.
Foi
daí que nasceu o movimento pelo impeachment de Charles Borer.
Precisávamos de 200 assinaturas de sócios para pedir sua desitituição.
Colocamos várias mesas de assinatura pela cidade, nas ruas Miguel Lemos,
General Severiano, Sete de Setembro, dentre outras, e conseguimos coletar um
número bem superior ao necessário, além de milhares de assinaturas de apoio dos
torcedores. Conseguimos entrar com o pedido e, apesar do Conselho, dominado
pelos “boreméritos”, não haver aprovado oimpeachment, saímos mais fortes
daquela luta.
Surgiu
então o movimento BFR – Botafogo Força e Renovação -, cuja chapa disputou e
venceu as eleições em 1981, levando à presidência Juca Mello Machado. Até hoje,
não entendo a razão de terem lançado alguém pouco conhecido, ao invés do
advogado Luiz Fernando Maia, candidato natural a presidente do movimento. São
curiosas as semelhanças entre a história do Botafogo e a do Brasil, tanto
durante a ditadura quanto na abertura, pois o país foi dormir com Tancredo e
acordou com Sarney na presidência da República.
De
fato, a relação da história do Botafogo com a do Brasil é mais que umbilical.
Nosso jejum começou exatamente quando entramos no pior período da ditadura
militar, em 1969, já que o último título havia sido no ano anterior.
Assim
como o país sofreu durante vinte anos uma ditadura militar, o Botafogo sofreu
vinte anos sem um título. Em 1989, enquanto os brasileiros começavam a viver os
ares da democracia, pois elegeriam um Presidente da República por voto direto,
na memorável noite de 21 de junho, solstício de inverno, após duas décadas de
jejum, o grito de liberdade dos botafoguenses ecoava por todo Rio de Janeiro e
Brasil: É CAMPEÃO!
Dois
comentários de leitores do Movimento Carlito Rocha:
(1) “Acho que você está mal informado. Não foi a
estatal Vale do Rio Doce que tomou o Botafogo na mão grande. O picareta Charles
Borer vendeu o clube com mirabolantes promessas aos sócios e torcedores, as
quais não cumpriu. Logo comprou o iate Cristina, que ficava ancorado em
Itacurussá, se não me falha a memória, e montou uma empresa de segurança com
sede em jacarepaguá. Eu era sócio proprietário na época e fiquei indignado. Não
gosto de política em clube ou qualquer lugar, pois para mim são quase todos
safados e vigaristas. Se você teve problemas com os governos militares, eu
respeito, mas eles não forçaram o Borer a nada.” – JGR.
(2) “A decadência do Botafogo e ascenção do flamengo
tem tudo a ver com a ditadura. Foi a partir do momento em que a família
rubro-negra Marinho assumiu o controle da comunicação do regime militar. O
trauma do Botafogo era muito grande e era preciso acabar com aquele clube de
tantos craques e que tanto batia no inexpressivo (até então) flamengo. No
momento em que a Globo passou a controlar o futebol, o flamengo começou a
crescer e o Botafogo decrescer. Era preciso destruir aquela "maldita
sede" que gerava anjos que insistiam em bater no mal. Um desses anjos
tinha pernas tortas.” – Anônimo.
1 comentário:
Outrora o Glorioso hoje é uma caricatura, dívidas, penhoras, jogadores vendidos por valores pífios. Entramos em campo não para disputar títulos e sim para não sermos rebaixados. Reaje meu Botafogo, acorda Ó Glorioso.
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