por LEONEL DE JESUS (*)
poeta luso-carioca, Lisboa, agosto de 2016
Pede
uma imperial ao balcão. Senta-se e, em vez de começar bebendo, posiciona o celular
para tirar uma foto ao copo. Plano apertado a ver-se aquele dourado único da
cerveja e o frio a escorrer pelo vidro. Mas não bebe logo, fica digitando algo,
o texto que enviou junto com a foto, provavelmente.
Em pé ao balcão, e com a imperial na mão, tenho o instintivo pensamento da facilidade/futilidade contemporânea de tirar fotografias e de partilhar futilidades a torto e a direito. E da fácil falsificação, pois quem tiver visto a foto vai pensar em algo glamoroso, quando estávamos ambos num café fuleiro de uma estação de trens.
Porém, um segundo pensamento me assola. O rapaz, que já o tinha visto umas duas vezes por ali, tem um ar sempre triste, cansado. Provavelmente saiu do trabalho ali perto, onde deve ser mal pago. Este é provavelmente o seu momento alto do dia, aquele em que sai do trabalho e repousa bebendo uma cerveja num café fuleiro de uma estação de trens antes de ir para casa. Talvez lhe tenha apetecido partilhar isso na verdade, no inconsciente, não a futilidade.
E quem diabos sou eu para criticar alguém?
Depois
fui-me embora do café fuleiro e fiquei a pensar nisso durante a viagem de trem
para Santa Apolónia, meu antigo bairro, onde ontem fui jantar com um amigo.
Cada pessoa é um universo, e nós não fazemos ideia do que lá vive.
Da próxima vez faço questão de lhe oferecer a cerveja.
(*) Leonel de Jesus nasceu no Rio de Janeiro, vive em Lisboa, é Botafoguense e meu amigo há muitos anos.
(*) Leonel de Jesus nasceu no Rio de Janeiro, vive em Lisboa, é Botafoguense e meu amigo há muitos anos.
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