por LÚCIA
SENNA | Escritora e Cantora | Cronista do Mundo Botafogo
Eu não sei como é com você, mas eu gosto do
imprevisível. E, agora, te provoco com uma pergunta: pode haver coisa mais sem sal
do que uma viagem toda programada?! Pense bem antes de me responder, enquanto
vou daqui te contando sobre as experiências que vivi na companhia de Tereza,
por ocasião de uma viagem à Europa.
Conheci Tereza numa das raras aulas de Yoga
que frequentei. Simpática e boa de papo, logo descobrimos que éramos quase
vizinhas e, portanto, conhecíamos todas as fofocas do bairro, o que nos
aproximou ainda mais. Não tardou para que me convidasse a fazer uma viagem à
Europa, que aconteceria dentro de poucos dias. Topei na hora. Tudo que acontece
de repente pode ser muito mais divertido!
Em meio ao caos e à correria da preparação
para a viagem, recebo um e-mail marcado como “IMPORTANTE; manual de como
arrumar sua mala corretamente “. Era da Tereza. Abro o anexo, esperando encontrar uma simples
lista de itens essenciais para uma viagem. No entanto, o que vejo é uma
verdadeira enciclopédia interminável de instruções detalhadas, divididas por
categorias, subcategorias, subsubcategorias, sobre como organizar cada peça de
roupa, sapatos, acessórios, blá, blá, blá...
A sensação que tive era a de estar montando
um quebra-cabeça de precisão suíça. Cada passo era minuciosamente detalhado,
como se a mala fosse um cubo mágico a ser decifrado. As instruções eram tão
precisas que temi pelo destino de uma meia solitária que ousasse escapar da
sequência pré-estabelecida.
Enquanto eu tentava absorver essa quantidade
absurda de informações, minha mente divagava para o momento em que Tereza
descobriria que meu método de arrumação se resumia a “jogar tudo dentro da mala
e torcer para não esquecer nada”. Percebi claramente que, pra ela, seguir o
manual era a chave para uma viagem bem sucedida.
A obsessão de Tereza por organização mexeu com
meu emocional. Comecei a ficar ainda mais assustada quando li o roteiro
programado por ela. Tudo estava meticulosamente esquematizado. Não haveria
espaço para um erro, uma indecisão, um imprevisto. NADA! Até um espirro meu,
não tenha dúvida, seria cronometrado!
E, então, em meio a malas sistematicamente arrumadas
e roteiros milimetricamente planejados, rumamos para o Galeão. Apesar desse
início de viagem ameaçador, eu estava firme no meu propósito de voar nas asas
do imponderável, de viajar na maionese, de beber o mundo e lambuzar-me com ele,
de perder-me em terras desconhecidas e de sentir o coração pulsar forte diante
do imprevisível. Não, eu não iria admitir que a espontaneidade de uma viagem
fosse domesticada pela “fera da previsibilidade”, no caso atendendo pelo nome
de Tereza.
Estamos em pleno voo e Tereza resolve fazer
um pequeno tour de inspeção ao redor do avião. Sim, ela parece ter entrado num
estado de alerta máximo, verificando todas as informações do cartão de
segurança, contando as poltronas de emergência e estudando os procedimentos de
evacuação, tudo isso ao mesmo tempo em que tentava manter um sorriso radiante
no rosto, como se fosse ela a aeromoça-chefe do voo.
Enfim... Paris! Enquanto eu me perdia entre
as ruas tortuosas de Montmartre, Tereza já tinha mapeado cada passo com uma
precisão que faria um GPS sentir-se desnecessário. Enquanto eu me deixava levar
pelas artes das pequenas galerias, ela insistia em seguirmos para às atrações
turísticas “obrigatórias”.
Na encantadora Veneza, Tereza perdeu seu
tempo a estudar os horários das gôndolas, enquanto eu me jogava na
imprevisibilidade das ruas labirínticas e dos canais. Ficava desesperada quando
algum passeio previamente agendado era cancelado e ela – QUE HORROR!!! – não
havia pensado num plano B.
E, já no Charles de Gaulle, no momento do
embarque, enquanto eu tranquilamente aproveitava um cappuccino na cafeteria do
aeroporto, Tereza já estava na fila do check-in, passaporte e bilhetes na mão,
pronta pra decolar – três horas antes do horário!
Digno de nota eram as expressões super
preocupadas da amiga, quando a minha abordagem mais relaxada não se encaixava
no seu esquema inflexível. Se eu tivesse me sujeitado as suas regras, não teria
trazido na bagagem nada que desse um sabor diferente à viagem. Tereza,
infelizmente, não conhece o prazer do acaso, da surpresa e daquele delicioso e
divertido “vamos ver no que dá”.
Chegada no Galeão. Hora da despedida. Tereza
olha pra mim e, dessa vez, com uma certa ternura no olhar, me diz: “Você e
seu jeito desprogramado de ser, minha querida, é como tentar organizar um flash
mob no meio de uma feira livre de domingo: uma confusão animada,
imprevisível e cheia de surpresas!!!”
Tereza, querida! Sua surpreendente observação
sobre o meu jeito imprevisível, encerrou nossa viagem com uma nota
inesperadamente doce. Quem diria que até mesmo você, Tetê, se renderia ao lado
imprevisível da vida.
39 comentários:
Lucia sempre trazendo alegria e textos bem humorados para o nosso mundo. Obrigado por mais essa divertida crônica.
Celso.
Um texto para amenizar a entrada de ano... rsrs
Depois da gotinha , símbolo da liberdade, agora nossa cronista nos traz Tereza , " a fera da previsibilidade", criatura presa em si mesmo e, portanto, péssima companhia para uma viagem, onde tudo o que se quer é viver sem amarras. Lúcia conta essa história com muita graça e tira proveito de tudo, transformando a chatice de Tereza, num texto delicioso.
Joaquim Alves
Oi, Lúcia
Admiro pessoas que fazem do limão uma gostosa limonada e você é assim. Seus escritos demonstram isso.A crônica de hoje é um ótimo exemplo. Sou o oposto e não tenho a menor paciência para Terezas. Parabéns pela limonada suculenta e refrescante que você foi capaz de fazer. JOÃO MARTINI
Mimha querida,
Eu amei essa crônica. Se essa tal de Tereza não existisse, você não teria feito um texto tão hilário. Viva a Tereza!!!!kkkkkkk Valeu, amiga. Você é ótima!!!!
SANDRA!
Oi, Lúcia
Nossa amiga Sandra foi direto ao ponto: Tereza tinha que existir na sua vida para que você pudesse se inspirar e escrever essa delícia de texto. Só faltei morrer de rir quando vc. descreve o MANUAL DE ARRUMAR MALAS enviado pela TETE KKKKKKK
Você também é uma figura pois só sendo uma figura para escrever de forma tão hilária assim. Beijão da Letícia.
Lúcia Senna faz umas associações muito interessantes. Dizer que a arrumação da mala , segundo o manual enviado pela amiga, fazia-a sentir como se estivesse montando um quebra cabeça de precisão suiça ou ainda, devido ao excesso de zelo, inquietava-se como se a mala fosse um cubo mágico a ser decifrado...kkkkkk é muito bom!!!!
Lúcia sai do ramerrame e nos entrega uma escrita diferenciada, inteligentee, sobretudo, engraçada. Parabéns ao blog e a ela. COSTA NETO.
Querida amiga!
Mais uma delícia em forma de crônica! Nunca soube dessa tua viagem à Europa com essa tal de Tereza.Aconteceu de verdade ou é mais uma das tuas invencionices?
ADOREI, pois rir é a melhor coisa do mundo!
CLARA.
Boa noite, Lúcia!
Não é de hoje que sou seu fã. Faz tempo... e ainda assim, você continua me surpreendendo a cada leitura, trazendo personagens encantadores durante todo esse período que escreves aqui no nosso blogue. Abrir o jornal e ler uma crônica sua é festa! Esqueço por algum tempo o mundo lá fora e me fixo no nosso MUNDO, o mundo das crônicas comicas, da alegria, das risadas descontraídas etc...
Parabéns, cronista! Já estou aqui esperando pela próxima. kkk
EDSON
Oi, prima!
Mais uma pra sua coleção de crônicas nota 10.
Beijoca da SYLVIA
Lúcia sempre trazendo finais imprevisiveis o que torna o texto ainda mais saboroso.
Quem poderia adivinhar que a tal TEREZA, de uma certa forma, acabaria por se render ao fascínio da imprevisibilidade, logo ela a FERA DA PREVISIBILIDADE?
Parabéns pelo desfecho sensacional!
Guilherme
Deus me livre viajar com uma Tereza ,pessoa desinteressante, desagradável, uma estraga prazer. Só valeu pela crônica que ela acabou por te inspirar até porque inspiração é artigo que não te falta kkkk
Leda da academia
Oi, Lu
Vou responder a sua pergunta inicial do texto : não, não pode haver coisa mais insossa do que uma viagem toda programadinha, sem espaço para a imprevisibilidade. Mas, pode piorar e muito se tivermos como companhia a TEREZA ( cá cá cá).
Enfim, você se saiu muito bem e ainda " cronicou" o fato.
Beijão da DECA
Adorei a crônica! Aproveito pra te perguntar, já confessando a minha ignorância, o que significa flash mob?
Leila da SMART
Obrigada,Celso, pelo comentário gentil. Abraço!
Interessante comentário! Se consegui com a crônica amenizar a entrada do ano, então, fico bem feliz !
Abraço
Oi, Joaquim
Alguma coisa eu teria que aproveitar dessa viagem ,não e mesmo? Transformar uma chatice em uma crônica divertida, é uma vantagem e tanto! Kkk
Abração e obrigada pelo retorno.
Oi,João!
Delicioso seu comentário, também suculento e altamente refrescante... kkk
Grande abraço!
Bem , Sandrinha...tens razão.
Sem Tereza, neca de crônica.
Viva Tereza !!!!!!
Beijocas
Pois é, Le....como disse João Martini, no seu comentário, o legal é transformar o limão em uma boa limonada. Foi o que tentei fazer e pelo jeito deu certo..kkkkk
Beijão!
Boa noite , Costa Neto!
Teu comentário é altamente inspirador. Muito obrigada por tantos elogios.Confesso que me deixaste muito sensibilizada!
Grande e afetuoso abraço!
Não vou te dizer nada sobre isso ,menina curiosa. Ao invés de te responder, faço- te uma pergunta: achas que foi verdade ou apenas uma invencionice ( adoro essa palavra kkkkk) minha?
Aguardo resposta.
💋
Ah, Edson...você e seus comentários tão especiais! Sim, meu caro leitor, estamos juntos há anos e muito me orgulho de lhe ter como meu fã. Não sei nem o que dizer... apenas agradecer muito por esse convívio bacana de cronista/ leitor que já perdura desde a minha entrada como colaboradora do blogue.
Também eu lhe espero desde já para a próxima crônica kkkk
Grande abraço!
Oi,prima !
Que bela surpresa te encontrar aqui. Eu sei que curtes as crônicas, mas não és muito de escrever comentários aqui no blogue. Gostei da surpresa e adoraria ser surpreendida mais vezes. Beijo, queridona!
Boa noite, Lúcia Senna!
Como você escreve gostoso! É um prazer ler seus escritos.
Concordo com todos os comentários dos leitores e ,portanto, só quero lhe parabenizar pelo talento.
Álvaro Montez
Oi, Leda
Gostei muito de te ver por aqui.
Venha sempre, amiga !
Tereza foi uma grande inspiração, sem dúvida alguma.
Ensinou- me ,na prática, que ser controladora é péssimo e faz um mal danado, pois causa estresse, não é mesmo?
Beijão!
Oi, Deca
Gostei de teres transformado o ato de escrever crônicas em verbo : crônicar. Se já existia, não tinha conhecimento e,portanto, te dou o crédito kkkkk.
💋
Oi, Leila
Flash mob ? Vou tentar te explicar : trata- se de uma aglomeração repentina de pessoas em um lugar público para realizar uma ação previamente organizada.
Algo assim como uma súbita tempestade num céu límpido e sem a menor possibilidade de chuva.
Pois é, Tereza me comparou com uma tempestade de emoções desenfreadas.kkkkkkj.
Deu pra entender,amiga?
💋
Bom dia, Álvaro!
Agradeço tuas palavras tão animadoras e gentis.
Grande abraço!
Depois da "gordura" que o Botafogo deixou escapar pelo ralo somente a literatura para amenizar meus "recalques" botafoguenses... rsrs
Gostei do seu comentário!
Que a literatura possa sempre aliviar algum sofrimento causado pelo nosso Glorioso. Kkk
A tal filosofia de fazer do limão uma boa limonada , é a que procuro seguir. Você, Le, que me conhece muito bem, sabe disso direitinho. Vida que segue, amiga ! Beijocas.
Mas que moça curiosa és tu, hein...kkkk
Não vou te responder .
Saiba, Clarinha , que vou te deixar no escuro. Kkkk
Afinal, o que é que o teu coração te diz ? O fato é real ou invencionice ( adoro essa palavra!) minha? Rsrsrs
Beijão!
Oi, prima!
Que surpresa te encontrar por aqui. Sim, sei que curtes as minhas crônicas mas deixar comentário no blogue, não é a tua praia. Mudanças para 2024?
Obaaaa! Kkkk
💋
Olá, Lúcia
Olha só: a obsessão da tal TEREZA por organização, não mexeu só com o teu emocional; mexeu com o meu também.
Agora, como conseguiste tirar proveito da situação e escrever algo divertido,só mesmo a tua criatividade pra explicar.
Macedo.
Boa noite, Guilherme!
É que eu queria de uma certa forma " humanizar" a tal Tereza.
Acho que no final da viagem, consegui. Afinal, com olhar quase doce, teceu- me um belo elogio , comparando- me a um flash mod. Kkkkk
Obrigada pelo retorno!
Grande abraço!
Boa noite, Macedo!
Acho que posso te responder dizendo que são ossos do ofício.
Meu olhar, talvez , já esteja treinado para extrair o lado divertido, de qualquer situação, por mais esdrúxula que possa parecer a olhos alheios kkkkk. É isso, caro leitor! Só sendo cronista pra entender melhor.
Grande abraço!
Delícia de texto - escrito de forma fluida q nos faz viajar junto. Essa é a sua marca registrada, Lúcia! Obrigada por nos proporcionar esse momento especial! Bjus da Sol de Anlarec
Olá, Sol!
Delícia de comentário que me deixa altamente animada pra seguir nessa toada. Obrigada, amiga!
💋
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