domingo, 15 de junho de 2014

De craque para craque – Parte 1

Do céu para o Brasil
12/junho/2014

[Paulo Marcelo Sampaio é o autor destas crônicas, interpretando os protagonistas pelos quais assina; as crônicas publicadas no Mundo Botafogo são uma gentileza do autor.]

Gil, meu caro!

Nunca fui de escrever. Dar autógrafo até me irritava. Não que eu me achasse o tal. É que, quando entrava em campo, me sentia como se estivesse em Pau Grande. Naquele terreno irregular, no alto de um morro, era pecado mortal deixar a bola escapar pelas laterais. Ali, onde nasci, era o mais mortal dos mortais. Nunca vesti o papel do ídolo. Como você pode notar, andei tendo umas aulas de estilo com o Sandro [Moreyra] e o seu João [Saldanha]. Sempre me dizem pra eu escrever como se estivesse falando. E o seu Armando [Nogueira] revisa o texto. Diz que é o copidesque. Ele me apresentou o Nelson Rodrigues. É dele a frase mais bonita de já disseram de mim. Veja só. “Ele cultiva a bola como uma orquídea de luxo”. Uma contradição eu gostar de uma frase que fala de uma flor que alimenta os colibris. Quando chegou aqui, três anos depois de mim, o Augusto Ruschi me olhou meio de lado. Depois fui descobrir que ele era um estudioso de orquídeas e beija-flores. Ele sabia que lá no pé da serra de Petrópolis, os passarinhos tinham mais medo de mim do que os zagueiros daqueles times de várzea que me enfrentavam. Comigo os bichinhos tinham dois destinos: ou a morte ou a gaiola. Que incoerência, gente boa. Mas isso ficou pra trás. Aqui por cima todo mundo é livre. Há passarinhos de todos os cantos do mundo. O coroa capixaba virou meu chapa. Jogamos conversa fora, numa competição pra ver quem identifica se tal canto é de uma sabiá laranjeira, se aquele acorde é de um pintassilgo, se aquele pousar é de um melro. Sempre fui doido por passarinhos. Por rabos-de-saia. Por branquinhas, que deixava gelar nos açudes de Pau Grande. E gostava muito de criança. Não necessariamente nessa ordem. Na minha época de jogador era raro se ver crianças entrando em campo com o time. Acho que nem existia mascote.

A primeira vez que vi um mascote foi em Belo Horizonte, em 1958, depois da Copa do Mundo. Muitos anos depois, você me disse, Gil, que aquelas duas crianças eram você e seu irmão Marco Antônio. Estavam lá graças ao esforço do Zé Maria que, dono de uma grande ferro-velho, tinha lá seus contatos e conseguiu uma autorização para os filhos entrarem em campo. Passados tantos anos, meu amigo, devo confessar que você foi vítima de uma piada minha. Depois que o time posou para as fotos, corri em direção ao Quarentinha. “Olha lá, Quarenta, aquele menino é seu filho”. Hoje, aqui de cima, me divirto quando você chama todo mundo de cabeçudo. Tenho um carinho especial por você. Por um simples motivo: apesar de ter jogado a Copa de 78 com a camisa 18, você foi o último ponta-direita do Botafogo. E era um touro, difícil de ser derrubado. Pena que você não tenha participado do meu jogo de despedida, em 1973. Aquilo ali me encheu de emoção, eu que andava tão precisado. Soube agora pelo seu João do comentário que ele fez quando eu dava a volta olímpica. Joguei a camisa suada para os geraldinos, minha platéia preferida. Das cabines da TV Globo, Saldanha disse: – É um espetáculo bonito e a simplicidade do Mané jogando a camisa, jogando a chuteira. E agora parece que tá se ajeitando pra tirar as meias e também jogá-las pra torcida da geral, a torcida que mais o viu de perto, que mais o incentivou.

No dia da primeiro jogo do Brasil na Copa, hoje é dia de festa. Churrasco rolando solto, todos à espera do apito daquele japa que não nos trouxe sorte na África do Sul. Eu tô dando uns tragos numa branquinha. Zé Maria, seu pai e Marco Antônio, seu irmão, estão resenhando aqui com o Luis Mendes e Armando Nogueira. Ih, espera!!!! Acaba de chegar aqui o Max Nunes, amigo do Armando e ídolo do Maurício Torres. Todos estão em torno dele. E já discutem se o Neymar vai fazer a festa naquele cantinho de campo que nós gostávamos tanto de estar.

Com o forte abraço do
Mané Garrincha

P.S.: Esse delírio mistura realidade e ficção.

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