sábado, 14 de março de 2015

Fragmentos ‘futebol no botafogo 1951-1960’: atribulações de João Saldanha no Botafogo [1]

por CARLOS VILARINHO
especialmente para o Mundo Botafogo
sócio-proprietário e historiador do Botafogo de Futebol e Regatas

Na segunda-feira (20/12/1959), ouvido pela Última Hora, Paulo Azeredo expôs seus planos para os próximos dois anos: “Afora a complementação das obras do Mourisco, é meu pensamento construir nos terrenos do nosso campo de futebol uma praça completa para a prática de esportes amadoristas. Não há mais razão para que terreno tão valorizado fique à mercê de umas poucas partidas de futebol, como sucedeu este ano, quando, nas duas únicas partidas que lá jogamos, houve uma renda de pouco mais de 100 mil e outra de 47 mil cruzeiros. No mais, o nosso campo foi ocupado por terceiros e o gramado, como sabe, em vista disso, está sempre em estado precário”.

O projeto era ambicioso: “Pelos últimos cálculos, todo o terreno ocupado pelo futebol, compreendendo campo propriamente dito e arquibancadas, vai a 700 milhões de cruzeiros. Agora, calculem: um patrimônio desse vulto está sendo muito mal empregado. É um absurdo, não acham? Com o nosso plano, os sócios, que, no momento, são em número superior ao do Fluminense, disporão de quadras de tênis, volibol, basquetebol e piscinas recreativas”.

O Botafogo já estava procurando um novo terreno: “Poderá ser na Avenida Brasil, ou onde encontrarmos algo que nos sirva, inclusive, que possa ser arrendado ao Clube. Mais cedo do que muita gente espera, abandonaremos o nosso tradicional campo. A execução do projeto estará a cargo de um grupo dos mais renomados da engenharia nacional”.

Com estas diretrizes, o futebol profissional seria novamente comandado por Brandão Filho e João Citro, calejados e botafoguenses até a raiz dos cabelos.

Na terça-feira, ouvido pelo Correio da Manhã, João Saldanha pôs em dúvida sua permanência: “Fiz uma espécie de planejamento, impondo algumas condições e estou aguardando por esses dias uma resposta da Diretoria”.

O recado, áspero, tinha endereço certo: “O mal do nosso futebol é que ele é administrado por homens que o detestam. Corra os olhos pelos principais dirigentes de nossos clubes e entidades e veja se não estou com a razão. A grande maioria apenas suporta o futebol. Eu gosto e muito do futebol e quero que o Botafogo tenha a dirigir o seu Departamento Profissional homens que gostem tanto como eu. Quando não se gosta daquilo que se faz, não é possível produzir a contento”.

A forma era genérica, mas o julgamento, severo, era dirigido ao Botafogo, sem nenhuma dúvida: “O nosso futebol, que é tecnicamente o melhor do mundo, continua administrativamente como há vinte e trinta anos atrás”.

Aparentemente, Saldanha não lera ou não dera importância ao depoimento de Paulo Azeredo à Última Hora: “Como já lhe disse, gosto do futebol. Quero fazer mais pela profissão e principalmente pelo Botafogo, mas já estou cansado de trabalhar sem objetivo, apenas por trabalhar”.

Sorte do Botafogo, que havia um Saldanha para tirá-lo do atraso: “Estou certo que os nossos dirigentes vão acabar se convencendo de que o futebol precisa e deve ser encarado cada vez com mais seriedade. Se conseguir convencer meus amigos dessa necessidade, então não terei dúvidas em redobrar meus esforços e continuar”.

Passagem autorizada pelo autor, extraída de: VILARINHO, C. F. (2013). O Futebol do Botafogo 1951-60. Rio de Janeiro: Edição do Autor, p. 314.

[O livro pode ser adquirido nas melhores livrarias do Rio de Janeiro e a partir do sítio www.ofuteboldobotafogo.com]

Sem comentários:

John Textor, a figura-chave: variações em análise

Crédito: Jorge Rodrigues. [Nota preliminar: o Mundo Botafogo publica hoje a reflexão prometida aos leitores após a participação do nosso Clu...