sexta-feira, 20 de março de 2015

Fragmentos ‘futebol no botafogo 1966-1970’: atribulações de João Saldanha no Botafogo [4]


por CARLOS VILARINHO
especialmente para o Mundo Botafogo
sócio-proprietário e historiador do Botafogo de Futebol e Regatas

A situação do Botafogo no campeonato assanhou a oposição. Na quarta-feira (23/11/1966), Saldanha fez o seu balanço do ano: “O Botafogo foi vítima de sua atual pobreza financeira. Em vez de poder preparar-se para a disputa, foi obrigado a sair em busca do ouro”.

Ele devia dizer que a raiz de tal “pobreza” estava na cessão de cinco titulares à CBD. O Botafogo tinha mesmo que correr, porém, disputou apenas dois amistosos durante o campeonato. Gérson se contundiu num deles (Racing), mas só desfalcou o time num jogo (Flamengo).

Saldanha insistiu no projeto messiânico de eliminar do Clube os esportes olímpicos, pilares de uma unidade que ele jamais aceitou: “Na luta inglória por campeonatos inexpressivos de um falso esporte amador, na insistência de uma política de só arranjar jogadores vindos do juvenil, o Botafogo está a pique de voltar àquela triste época dos Gato, Casnoks e outros pernas de pau”.

No ano de 1966, que clube brasileiro contratou um craque de seleção? Apenas o Botafogo (Garrincha não conta). E não foi um só, foram dois: Leônidas e Parada. A penúria dos clubes era tal – reflexo da situação criada pelo regime militar – que praticamente todos estavam promovendo os juvenis.

Saldanha concluiu: “Os homens do Botafogo já sabem, por experiência própria, que pouco adianta ganhar dez ou onze títulos amadores e demorar muito a ganhar um campeonato de primeira divisão. O Botafogo que tome muito cuidado. Está trilhando terreno muito perigoso”.

Saldanha deixou o Botafogo (janeiro de 1960) exatamente porque não encontrou apoio para sua tese de exclusividade do futebol. Ele não tolerava que os atletas das modalidades olímpicas recebessem salário. Por isso, sempre colocava a palavra amador entre aspas. Mas o Flamengo fazia isso no remo. O Vasco fazia a mesma coisa no basquete. O Fluminense, no pólo aquático, também pagava salário. AABB, CIB e Guanabara, idem. Na verdade, a catequese ocultava uma finalidade política: em 12 de dezembro, haveria eleições para o Conselho Deliberativo, que elegeria o presidente do Clube em dezembro de 1967.

Quem sustentava realmente os esportes olímpicos eram as Forças Armadas (cada vez menos) e os clubes de futebol. Os esportes olímpicos poderiam facilmente cair no gosto popular, como no Japão, na Europa e nos EUA, mas aqui lhes faltava o necessário apoio dos governos (União e Estados) e por tabela, do CND, da CBD e do COB.

O quadro era assustador. Basta dizer que três tradicionais clubes de remo agonizavam: Santa Luiza (1896), Boqueirão do Passeio (1897) e Internacional (1900). E mais. Em fevereiro de 1967, o CND e as federações cariocas de voleibol, tênis e tênis de mesa serão despejados por falta de dinheiro para pagar o aluguel das salas que ocupavam no Edifício Martinelli, na Avenida Rio Branco, 108. O Clube Municipal cedeu uma sala para a Federação de Arco e Flexa. A Federação de Halterofilismo abrigou-se no Botafogo, embaixo das Sociais.

O Botafogo cumpria, com crescente sacrifício, a sua obrigação de ajudar na formação da juventude (artigo 2º do decreto-lei nº 3.130, de 21/03/1941). Mas nem tudo era possível. Sem apoio, o Botafogo se retirou da modalidade de levantamento de peso, na qual fora campeão por 11 anos consecutivos (1953-1963).

Saldanha alimentava então o sonho de reduzir o Botafogo ao time de futebol, tendo como apêndice um clube social (modesto), recreativo. Era o próprio anti-Botafogo.

Passagem autorizada pelo autor, extraída de: VILARINHO, C. F. O Futebol do Botafogo 1966-70. Rio de Janeiro: Edição do Autor, no prelo.

[O primeiro volume, O Futebol do Botafogo 1951-1960, pode ser adquirido nas melhores livrarias do Rio de Janeiro e a partir do sítio www.ofuteboldobotafogo.com]

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