por
PEDRO ARÊAS, 25/08/2014
O
pior é que nossos antigos palhaços passaram a levar a sério essas ordens de
lunáticos generais, tornaram-se soldados rasos, perigosamente bem armados, mudaram de
profissão, abandonaram o improviso, a sensibilidade e por preguiça, tornaram-se o
anti-espetáculo. Nossos jovens estão sendo ordenados a lutar em vez de jogar. Por consequência, nosso jeito moleque de
desfilar habilidades e fazer palhaçada foi se esvaindo.
No
lugar do picadeiro, praças de guerra. No lugar dos artistas, guerreiros. No lugar do apresentador, incitador. No lugar do
narrador, patrocinador. No lugar da felicidade, lucro. No lugar do encantamento, dourados
troféus. No lugar de gargalhadas, palavrões. No
lugar do Bravo!, vaias. No lugar de alegria, cobrança. No lugar de festa,
ofensas. No lugar da satisfação, alívio. No lugar de respeito, recalque. No
lugar de abraços, cotoveladas. No lugar de comemorações, desabafos. No lugar de
famílias, quadrilhas. No lugar de músicas, xingamentos de guerra. No lugar das
artes, ciências exatas... Ciências exatas? Exatamente, infelizmente! Nossos
circos repletos de inocência, imperfeições e desajeitados palhaços foram
transformando-se em desqualificadas réplicas do Cirque du Soleil, padrão shopping
center, com atletas e competidores em plena forma física, aparentemente
esteticamente sem defeitos, e sem talento algum, apenas muito treinamento,
muita repetição, muito suor, muitas marteladas e broncas até a inatingível e
inexistente perfeição. Que coisinha mais sem graça, né? Tão limpinho e tão
bonitinho que soa falso. Cadê os tombos, as piruetas, as falcatruas, as
risadas, as falhas, as tentações, as estripulias e as mágicas? No passado.
Roupas
desformes e elegantes perderam espaço para uniformes de mau gosto idênticos,
que mais se assemelham a abadás de horrorosas comemorações baianas, nos quais
lutamos para encontrar o escudo de nosso time em meio a tantas logomarcas
maquiavélicas. As ferraduras são coloridas, ou melhor, as chuteiras, difícil é
encontrar uma preta e branca. Colocam ferramentas de prevenções por dentro dos
meiões que tornam os jogadores, soldados recém-operados, em uma enfermaria pós
batalha sangrenta. Ataduras, esparadrapo, tornozeleira, algodão, gaze,
neoprene. E pasme, meu Neto, virou instrumento obrigatório o uso da caneleira.
As caneladas e as bicudas estão mais frequentes que os dribles. Hoje os
pseudomodelos e pseudoatores perdem horas ajeitando os cabelos e sobrancelhas
em salões de beleza antes do jogo para admirarem-se nos telões espalhados, sim,
sim, como os palhaços se maquiavam antes da cena, mas o porém é que o intuito
era fazer rir, era inserir um colorido personagem em seu corpo e divertir
crianças, e os de hoje, nos fazem rir do ridículo, de vergonha alheia, pois são
os próprios encarnados pateticamente, assustando crianças, narcisistas ao
extremo. Com W iniciando seus nomes e mal resolvidos cabelos de Calopsita.
Outro tipo de palhaço, infelizmente.
Dirigentes
viajam constantemente para Europa atrás de mágicas soluções, atrás de ilusões,
ouro de tolo, dinheiro. Lá não há preocupação com o talento, só com
estatísticas, e que porre são as estatísticas! E que porre são os estatísticos!
Europeus
possuem o vil metal, compram nossos palhaços novinhos, separam de suas famílias,
adestram com aval do medo, arrancam às habilidades naturais oriundas de
africanos e índios, exterminam o deboche, despenteiam suas perucas, operam seus
vermelhos narizes, limpam pintados rostos, expulsam o bom humor e os
transformam através de anabolizantes em fortes super-heróis, duros toda a vida.
Transcendentes. Aprendem a castigar a bola, maltratam o espetáculo e fazem
crianças chorarem mais que rirem. Outro tipo de palhaço, infelizmente. Receitas
por aqui entram em boa quantidade, mas as dívidas dos circos aumentam junto com
as contas bancárias de alguns poucos empresários. As principais decisões
desportivas estão sendo realizadas em salas fechadas com ar-condicionado,
assinadas com pomposas Montblancs em
prédios luxuosos e tribunais indecentes.
Hoje tem marmelada? Tem sim senhor!
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