quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Nasceu a Estrela Solitária...


Estácio de Sá (1542-1567) fundou a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro a 1 de Março de 1565, na base do Morro Cara de Cão, na Urca, após expulsar a colónia francesa ‘França Antártica”.

A cidade de São Sebastião contorna graciosamente a Baía de Guanabara e, numa das suas enseadas, quiçá a mais famosa, situa-se o bairro de Botafogo, que empresta o seu nome à enseada e é um dos bairros mais antigos da zona sul da cidade do Rio de Janeiro.

O bairro era um arrabalde distante que, no século XVIII, fazia parte de uma freguesia rural denominada São João Batista da Lagoa. O seu desenvolvimento é posterior à chegada da Corte portuguesa ao Brasil em 1808 e deve-se ao facto de as pessoas mais abastadas procurarem instalar-se em zonas atraentes, climaticamente favoráveis e afastadas dos centros mais populosos. Muitos nobres da corte, membros do corpo diplomático e florescentes empresários começam a povoar Botafogo, que acaba por ser um bairro projectado para a ribalta quando D. Carlota Joaquina, esposa de D. João IV, decide construir um palacete na praia de Botafogo no século XIX.

Desde então o progresso foi rápido e, em 1838, a freguesia de São João Batista da Lagoa é declarada freguesia urbana, mesmo antes do bairro se integrar na malha urbana mais ampla da cidade em meados do século XIX. Desde essa época o crescimento do bairro de Botafogo foi imparável e, em 1843, são inauguradas as carreiras de barcos a vapor, principal meio de deslocação da população durante bastante tempo. O abastecimento regular de água é estabelecido em 1854 e a iluminação a gás surge a partir de 1860. Sete anos após, o bairro dispõe do serviço da empresa de barcas Ferry e, em 1871, surge um serviço regular de bondes movidos a tracção animal.

Os transportes colectivos permitem a atracção de novas populações ao bairro, que, devido à crescente densidade populacional, começa a sua expansão para o interior, seguindo a linha do bonde e consolidando o processo de urbanização iniciado no limiar do século. Entre 1892 e 1906 são abertos os túneis que comunicam com Copacabana e o bairro de Botafogo torna-se um espaço integrado na restante malha urbana da cidade.

Mas de onde vem o nome de 'Botafogo'?...

Izzo Rocha e Vilson Santos, autores do Hino do Centenário do Botafogo de Futebol e Regatas, famoso clube multi-esportivo do bairro de Botafogo, registam no hino o início de tudo:

"Há muito tempo atrás, no Continente Europeu "
" Um grande poder de fogo, muitas batalhas venceu "
" O Galeão Português barco formoso, poderoso de além mar "
" de Botafogo foi baptizado por tudo conquistar "

Originalmente 'botafogo' era um instrumento militar, uma haste com um pavio, com a qual o artilheiro detonava os canhões. 'Botar Fogo' era sinónimo de detonação naquela época e essa designação iria baptizar um bairro e os clubes desportivos que deram origem ao Botafogo de Futebol e Regatas.

A história começa em 1519, durante o século XVI, quando o rei D. João II de Portugal ordenou a construção do maior navio de guerra da Europa, o Galeão São João Batista, de 1000 toneladas, que em virtude do fantástico poder de fogo das suas 200 peças de artilharia pesada, bem como devido às suas afamadas conquistas, ficou conhecido pelo apelido de 'Botafogo'.

Os feitos do galeão foram tantos que os nobres portugueses tiraram carta de brasão e armas com o título de Botafogo. O fidalgo português João de Souza Pereira, famoso oficial de artilharia natural de Elvas, ganhou o apelido de 'Botafogo' e incorporou-o ao seu sobrenome.

O sucedido deveu-se ao facto de João de Souza Pereira ter-se tornado, após chegar ao Rio de Janeiro, lugar-tenente do governador-geral Antônio Salema e destacar-se em combates vitoriosos contra franceses e tamoios. A Coroa Portuguesa recompensou-o com duas sesmarias, a de Francisco Velho e a de Inhaúma, terras que partiam do Rio Carioca, contornavam o morro da Viúva e estendiam-se praia adiante, cuja beleza inserida na enseada a fez ser conhecida como a praia 'do Botafogo'.

Mais tarde, durante o processo de urbanização que se desenrolou no século XIX, o bairro de Botafogo inaugura a era dos desportos através da promoção da primeira corrida de cavalos, que ocorreu em 1825 na praia de Botafogo. O turfe foi o primeiro desporto moderno a ser praticado em Botafogo, ao qual se seguiu a prática das regatas.

Os primeiros clubes de regatas surgiram também na enseada de Botafogo, na qual foi disputada a primeira regata, dividida em quatro páreos e promovida pelo clube de regatas do bairro. O sucesso da primeira regata originou a segunda regata no ano seguinte, a qual contou não apenas com a presença de uma imensa multidão, mas também com o próprio imperador D. Pedro II.

As regatas tomaram conta da cidade e, em 1874, foi fundado o clube Guanabarense. Porém, houve uma dissidência de seis remadores que, encabeçados por Luiz Caldas, o 'Almirante', criticavam a supervalorização das apostas no remo, as quais denegriam o desporto. Na sequência, esta plêiade de remadores funda o 'Grupo de Regatas Botafogo', em 1891, o qual assumiu a ardorosa posição de “guardião das tradições” na luta contra os apostadores.

No entanto, com o advento da Revolta da Marinha, o Grupo recém-organizado tornou-se suspeito para o Governo vigente. Efectivamente, João Carlos de Melo (John) e Frederico Lorena (Fritz), sócios do clube e amigos íntimos de Luiz Caldas, eram filhos, respectivamente, dos revolucionários Almirante Custódio de Melo e Comandante Guilherme Frederico de Lorena, sendo este o chefe da Revolução. Além disso, Caldas era monárquico e acabou por ser preso na Revolta da Armada, em 1893.

Em consequência, houve um período em que o Botafogo foi forçado a paralisar as suas actividades, tendo John e Fritz fugido para fora do Rio, Mario LeBlon, também botafoguense, falece pouco depois e, finalmente, foi a vez de o 'Almirante' também morrer.

Imediatamente após a morte trágica de Luiz Caldas a 25 de Junho de 1894, os sócios do Grupo de Regatas Botafogo reuniram-se para formalizar o clube e a 1 de Julho de 1894 fundaram o Club de Regatas Botafogo. A designação do clube está ligada ao facto de ser na enseada de Botafogo que os barcos do clube competiam e onde foram vividas muitas glórias na prática desse notável remo amador.
Os seus fundadores foram Alberto Lisboa da Cunha, Arnaldo Pereira Braga, Arthur Galvão, Augusto Martins, Carlos de Souza Freire, Eduardo Fonseca, Frederico Lorena, Henrique Jacutinga, João Pennaforte, João Teixeira, José Maria Dias Braga, Júlio Kreisler, Júlio Ribas Júnior, Luiz Fonseca Quintanilha Jordão, Oscar Lisboa da Cunha e Paulo Ernesto de Azevedo.

Anteriormente fundara-se o Club de Regatas Guanabarense (1874), seguindo-se o Club Náutico Saldanha da Gama (1876), em Niterói, o Grupo de Botafogo (1878), o Club de Regatas Paquetaense (1884), o Club de Regatas Cajuense (1885) e o Club de Regatas Internacional (1887), mas foi a agregação de remadores defensores da ética do remo em torno do Grupo de Botafogo (1891) que levou à fundação do Botafogo em 1894. Este acontecimento tornou o Club de Regatas Botafogo o verdadeiro pioneiro dos clubes de regatas do Rio de Janeiro, tendo-se seguido a fundação do Grupo de Regatas Gragoatá (1895), o Club de Regatas Icarahy (1895), o Club de Regatas Flamengo (1895), o Club de Natação e Regatas (1896), o Club de Regatas Boqueirão do Passeio (1897), o Club de Regatas Vasco da Gama (1898), o Club de Regatas Guanabara (1899), o Club de Regatas São Christovão (1899), o Club Internacional de Regatas (1900), o Club de Regatas Piraquê (1906), o Club de Regatas Lage (1908) e o Sport Club Fluminense (1916).

O Club de Regatas Botafogo ficou conhecido como o clube da Estrela Solitária, a Estrela d'Alva que servia de guia matinal aos remadores, em virtude da sua bandeira branca ostentar, no rectângulo negro do canto superior, a gloriosa Estrela Solitária que ainda hoje continua a conduzir o Botafogo de Futebol e Regatas, clube nascido da fusão, em 1942, do Club de Regatas Botafogo, fundado em 1894, com o Botafogo Football Club, fundado em 1904.

A Estrela Solitária orienta o Botafogo de Futebol e Regatas para jamais se afastar do espírito associativo que fundou o centenário clube, nem desviar-se das normas de lealdade e distinção que foram traçadas pelos seus fundadores em defesa dos sãos princípios do remo.

Um facho de luz tua estrela solitária te conduz…

Foto: Arquivo Botafogo de Futebol e Regatas

1 comentário:

Chico da Kombi disse...

Parabéns pelo blog, caro Rui Moura!
Gloriosas saudações alvinegras.

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