segunda-feira, 26 de maio de 2014

Memória - Eterno polemista

por Carlos Herculano Lopes
EM Cultura
07.02.2008

Logo depois de classificar a Seleção Brasileira para a Copa do Mundo de 1970, no México, o treinador João Saldanha teria dado uma resposta à altura quando o presidente Médici manifestou o desejo de ver no time o atacante Dario: “O senhor organiza o seu ministério e eu organizo o meu time”. Esta frase corajosa, dita ao chefe do país, no período mais negro da ditadura militar, teria sido a gota d’água para a demissão do técnico, que além do mais era comunista convicto. Zagalo assumiu o comando do time e acabou levando o jogador do Atlético Mineiro, mas Dadá Maravilha nem entrou em campo. O time, até então chamado de “as feras de Saldanha”, foi campeão, e toda essa história, e muitas outras, está contada no livro João Saldanha, uma vida em jogo (Companhia Editora Nacional, 552 páginas, R$ 64), que o jornalista André Iki Siqueira acaba de lançar.

O autor conta em detalhes a vida desse que, além de técnico e jogador de futebol e ativista político, foi repórter de vários jornais e comentarista esportivo consagrado, uma das personagens mais fascinantes do Brasil no século 20. “Entre o início das pesquisas e a conclusão, entrevistei dezenas de pessoas ao longo de quatro anos”, conta André Siqueira. Seu relato segue uma ordem cronológica, para facilitar a leitura, começando com o nascimento de Saldanha no interior do Rio Grande do Sul, em 1917, em plena luta entre chimangos e maragatos, até sua morte, na Itália, em 12 de julho de 1990, durante a Copa do Mundo, trabalhando como cronista esportivo para o Jornal do Brasil e comentarista da TV Manchete .

Um dos aspectos mais interessantes do livro é que, muito mais do que se deter na vida pura e simplesmente do biografado, André Siqueira recheia a narrativa com os principais acontecimentos de vários períodos da história. Por exemplo: na década de 1930, quando o então adolescente João Saldanha chegou com a família ao Rio, indo morar em Botafogo, o país também seria sacudido por importantes movimentos políticos, como a revolução que levaria Getúlio Vargas ao poder e o levante comunista de 1935. De muitos deles Saldanha participaria, sempre exaltando sua paixão pelo futebol. “Em algumas entrevistas, Saldanha dizia que havia entrado para o Partido Comunista em 1942; em outras, que seu ingresso havia se dado em 1935… Seja como for, João passou os primeiros anos da década de 1940 entre a família, o PCB e o Botafogo”, relata André Siqueira.

Mitos e realidade

Ainda de acordo com a biografia, Saldanha teria estado também na Europa durante a 2ª Guerra Mundial, como repórter. Documentado com dezenas de fotos, em 6 de junho de 1944, o histórico Dia D, Saldanha desembarcou ao lado do marechal Montgomery, quando os aliados chegaram à Normandia. “Tanto amigos quanto críticos debocham da história, afirmando ser outra mentira do João”, diz o autor. Nada de mais em se tratando de um personagem tão polêmico que, por muito menos, no Rio de Janeiro, de revólver em punho, enfrentou o dono de uma farmácia que teria desfeiteado sua empregada. Ou outra vez, quando deu um tiro no goleiro Manga, do Botafogo, que teria se vendido para o Bangu do bicheiro Castor de Andrade, na decisão de um campeonato carioca. Ou ainda no início da década de 1950, participando da luta pela posse da terra, no Norte do Paraná. Segundo o jornal A Folha de Londrina, “Saldanha esteve de corpo e alma no auge do conflito, vivendo em Londrina e dando apoio aos posseiros”.

Essas foram apenas algumas brigas em que Saldanha se meteu. Esteve também envolvido na famosa greve dos 300 mil, em 1953, que literalmente parou São Paulo. Quatro anos mais tarde, seria campeão carioca dirigindo o Botafogo de Didi, Garrincha e Nilton Santos, num memorável jogo contra o Fluminense. “Nosso time era uma máquina de jogar”, diria três anos mais tarde, já como cronista esportivo da Última Hora, para onde foi, a convite de Samuel Wainer, ao mesmo tempo em que também trabalhava na Rádio Guanabara. Em 1964, como não poderia deixar de ser, esteve contra os militares golpistas, que tomaram o poder com a deposição do presidente João Goulart. Já em 1969, no auge do autoritarismo, aceitou comandar a Seleção Brasileira, da qual acabou demitido em 17 de março de 1970, pouco mais de dois meses antes da Copa do México.

Casado quatro vezes, pai e avô extremado, a partir de então, seja como comentarista esportivo de jornais e televisão ou como ativista político, João Saldanha sempre foi coerente com seus princípios, dos quais nunca abriu mão. Seria assim até sua morte, aos 73 anos, aclamado como uma das mais importantes personalidades públicas do Brasil. Como disse Thereza Bulhões, em depoimento sobre ele: “O João era um grande Dom Quixote, mas também um Sancho Pança. Ele era uma mistura dos dois”.

Fonte: http://www.divirta-se2.uai.com.br/agitos/interna_noticias.asp?codigo=2984

2 comentários:

Gil disse...

Rui,

Dê uma lida nessa matéria sobre o João Sem Medo Saldanha.
Principalmente o último paragrafo, é para rir muito!

http://terceirotempo.bol.uol.com.br/que-fim-levou/joao-saldanha-1941

Abs e Sds, Botafoguenses!!!

Ruy Moura disse...

Obrigado, Gil.

Abraços Gloriosos.

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