por André Barros
blogue Movimento Carlito Rocha
O
Brasil estava sob a ditadura militar e o presidente do Botafogo, entre 1976 e
1981, Charles Borer, apoiava aquele regime. Em 1977, o Botafogo perdeu sua sede
em General Severiano, tomada pela então forte estatal militar Vale do Rio Doce.
Às custas de sua sede histórica, tendo sido o único clube brasileiro a quitar
suas dívidas previdenciárias, o Botafogo, paradoxalmente, tem hoje um enorme débito
com a Previdência Social.
Abandonada,
nossa até então famosa divisão de base não estava revelando ninguém. O time
principal andava mal e amargávamos mais de uma década sem um título. A cada
derrota, a torcida, liderada por Russão, encostava nas grades da cadeira
especial e puxava dois gritos: “fora Borer!” e “êêêê, sou Botafogo, estou
cansado de sofrer”.
Nesta
época, eu participava de duas lutas: pela liberdade do Botafogo e pela
liberdade do Brasil. Minha família ansiava pela volta de tia Verinha, banida do
país, que havia saído daqui em cadeira de rodas, de tanto que sofreu no
pau-de-arara e outras terríveis torturas.
Minha
avó, que também havia sido presa pela ditadura, queria me presentear com uma
bateria. Porém, além de meu negócio não ser exatamente rock, e sim, samba, meu pai não permitiria a entrada daquela
“barulheira” em nosso apartamento. Com os instrumentos da bateria de samba
doados por minha avó, com apenas 13 anos, decidi fundar uma torcida organizada.
Assim surgia a FOGO LIVRE, nome que caracterizava tanto a luta pela liberdade
do Botafogo e quanto do Brasil. Com apenas 10 componentes, eu era o presidente
dessa “imensa” organizada.
Mas
o controle no clube era tamanho que, para se fundar uma torcida, era necessário
solicitar permissão à diretoria de Charles Borer, através da ASTOB – Associação
das Torcidas Organizadas do Botafogo –, presidida por Pedro Memória, um cara
simpático, mas que não tinha qualquer vínculo com as organizadas. Acho que não
entenderam a crítica presente no nome, daí a torcida ter sido autorizada.
Começamos,
então, um movimento da torcida contra Borer. Pichávamos o muro do clube e
saíamos correndo, com as mãos cheias de fichas, direto para um orelhão, de onde
ligávamos para vários jornais, e o primeiro deles era sempre o ‘Jornal dos
Sports’. Por essas ações, combinadas aos gritos nas arquibancadas, a torcida do
Botafogo mobilizava a cidade em sua luta pela liberdade. Borer começou a se
movimentar e criou os chamados “boreméritos”, conselheiros beneméritos biônicos
e vitalícios, nomeados por ele, a fim de obter maioria no Consellho
Deliberativo e se perpetuar na presidência.
João
Saldanha, um verdadeiro Benemérito, era contra Borer. A cada vez que a bandeira
do fogão estava hasteada a meio pau, ele comemorava dizendo que aquilo deveria
ser sinal da morte de algum conselheiro daquela ditadura no Botafogo.
Foi
daí que nasceu o movimento pelo impeachment
de Charles Borer. Precisávamos de 200 assinaturas de sócios para pedir sua
desitituição. Colocamos várias mesas de assinatura pela cidade, nas ruas Miguel
Lemos, General Severiano, Sete de Setembro, dentre outras, e conseguimos
coletar um número bem superior ao necessário, além de milhares de assinaturas
de apoio dos torcedores. Conseguimos entrar com o pedido e, apesar do Conselho,
dominado pelos “boreméritos”, não haver aprovado o impeachment, saímos mais fortes daquela luta.
Surgiu
então o movimento BFR – Botafogo Força e Renovação -, cuja chapa disputou e
venceu as eleições em 1981, levando à presidência Juca Mello Machado. Até hoje,
não entendo a razão de terem lançado alguém pouco conhecido, ao invés do
advogado Luiz Fernando Maia, candidato natural a presidente do movimento. São
curiosas as semelhanças entre a história do Botafogo e a do Brasil, tanto
durante a ditadura quanto na abertura, pois o país foi dormir com Tancredo e
acordou com Sarney na presidência da República.
De
fato, a relação da história do Botafogo com a do Brasil é mais que umbilical.
Nosso jejum começou exatamente quando entramos no pior período da ditadura
militar, em 1969, já que o último título havia sido no ano anterior.
Assim
como o país sofreu durante vinte anos uma ditadura militar, o Botafogo sofreu
vinte anos sem um título. Em 1989, enquanto os brasileiros começavam a viver os
ares da democracia, pois elegeriam um Presidente da República por voto direto,
na memorável noite de 21 de junho, solstício de inverno, após duas décadas de
jejum, o grito de liberdade dos botafoguenses ecoava por todo Rio de Janeiro e
Brasil: É CAMPEÃO!
Dois comentários de leitores do Movimento Carlito
Rocha:
(1)
“Acho que você está mal informado. Não foi a estatal Vale do Rio Doce que tomou
o Botafogo na mão grande. O picareta Charles Borer vendeu o clube com
mirabolantes promessas aos sócios e torcedores, as quais não cumpriu. Logo
comprou o iate Cristina, que ficava ancorado em Itacurussá, se não me falha a
memória, e montou uma empresa de segurança com sede em jacarepaguá. Eu era
sócio proprietário na época e fiquei indignado. Não gosto de política em clube
ou qualquer lugar, pois para mim são quase todos safados e vigaristas. Se você teve
problemas com os governos militares, eu respeito, mas eles não forçaram o Borer
a nada.” – JGR.
(2)
“A decadência do Botafogo e ascenção do flamengo tem tudo a ver com a ditadura.
Foi a partir do momento em que a família rubro-negra Marinho assumiu o controle
da comunicação do regime militar. O trauma do Botafogo era muito grande e era
preciso acabar com aquele clube de tantos craques e que tanto batia no inexpressivo
(até então) flamengo. No momento em que a Globo passou a controlar o futebol, o
flamengo começou a crescer e o Botafogo decrescer. Era preciso destruir aquela
"maldita sede" que gerava anjos que insistiam em bater no mal. Um
desses anjos tinha pernas tortas.” – Anônimo.
6 comentários:
Rui,
Nada mudou! Os grandes beneméritos, beneméritos, sócios proprietários, preferem manter o feudo ou a capitania hereditária em General Severiano!
Acho muito difícil, quase impossível, outro movimento de torcida para mudar ou tentar mudar o Botafogo!
O atual Botafogo enaltece, privilegia, protege a incompetência!
Abs e Sds, Botafoguenses!!!
Gil, a minha ideia sobre a reprodução deste artigo era fazer analogia com quase 40 anos de uma quase contínua história, interrompida apenas efemeramente por Emil Pinheiro... E a história continua... Fora Assumpção! Abaixo a incompetência!...
Abraços Gloriosos!
Meu Rui caso não consiga a vaga da libertadores você defenderia uma grande reforma no futebol do Botafogo? Não só na comissão técnica e jogadores mais também na direção.
Eu faria assim, Manynho: (1) treinador imediatamente para a rua; (2) presidente demitido a seguir; (3) saída de todos os jogadores de 3ª linha que o BFR tem no seu elenco; (4) resolução de uma quantidade de jogadores que ainda estão ligados ao Botafogo e andam espalhados por aí; (5) a seguir, com os pés assentes no chão e com a casa limpa, então olharia para como e quem se podia contratar que não nos envergonhasse; (6) finalmente, alteraria os estatutos e democratizaria o voto, estendendo-o aos sócios-torcedores.
Em suma, eu não faria uma reforma, mas uma revolução que varresse todos os cantos podres de General Severiano.
Abraços Gloriosos!
Rui,
Lendo as tuas respostas lembrei de um fato curioso.
A única vez que os beneméritos, grandes beneméritos, sócios proprietários e Conselho Deliberativo se reuniram e mudaram o estatuto do clube foi para aceitar a candidatura do Emil Pinheiro.
Em 1986 chegou ao clube como diretor e nos deu o título de 1989.
Gostaria muito que os "senhores" que mandam em GS fizessem as mudanças que precisamos!
Abs e Sds, Botafoguenses!!!
Só se forem arrancados à força como aconteceu agora com o Sporting, cujo presidente mandou a lixeira toda embora - e espero que não a deixe regressar...
Abraços Gloriosos!
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